Nomeado comandante das Forças Armadas da Ucrânia em julho de 2021, Valerii Zaluznyi organiza e lidera a resistência armada ao invasor russo.
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Quem não o conheça e o veja apenas naquele ar bonacheirão, em uniforme de gala, cheio de insígnias honoríficas e altas patentes, pode demorar a perceber que se está ali, perante o comandante das Forças Armadas das Ucrânia, na presença de um militar que, além da frequência das mais prestigiadas academias de infantaria, ganhou reputação em camuflado, a tarimbar como soldado e oficial, na guerra do Donbass. A Valeriy Zaluzhnny chamam-lhe "o general de aço". É também "Herói da Ucrânia", assim distinguido por Volodymyr Zelensky.
"O meu sonho de infância era ser soldado. Nunca pensei que um dia chegaria a general", afirma o próprio Valeriy Zaluzhnny, citado na "ArmyInform", um site de notícias militares. Ora, se falhou as previsões de carreira, não perdeu o desígnio do berço, numa família de militares ao serviço da URSS. Valeriy nasceu a 8 de julho de 1973, em Novohrad-Volynskyi, cidade situada 160 quilómetros a oeste de Kiev, onde o pai estava mobilizado, numa guarnição do Exército Vermelho.
Nova linhagem militar
O apelo das fardas era irresistível e, decorridos quase 49 anos, Zaluzhnny vê-se no mais alto cargo militar da Ucrânia. Por inerência do cargo, ingressou no Conselho de Defesa e de Segurança Nacional e no designado Centro Razumkov, um "think tank" que junta mais militares de alta patente para o planeamento da estratégia de defesa nacional.
É neste laboratório de ideias que também fervilha a nova geração de chefias militares da Ucrânia, que percorreu os campos de treino europeus da NATO e que adquiriu competências militares completamente opostas às estabelecidas por décadas de autoridade soviética. Zaluzhnny, que completou os estudos na Academia de Defesa Nacional de Kiev e que já depois disso acrescentou ao currículo um curso de Relações Internacionais, simboliza essa nova linhagem de universos mais vastos, de tropas que também combateram nos cenários mais sangrentos do Donbass, onde o exército ucraniano sofreu baixas muito pesadas, o que serviu para o então presidente Petro Poroshenko assinar o acordo de paz "Minsk 2", considerado desfavorável à Ucrânia e causador de uma inglória retirada.
Foi deste combatente (dirigia o Comando Operacional do Norte desde 2019), que Zelensky se socorreu para reorganizar os mais altos comandos militares da Ucrânia. O general faz parte da primeira geração de soldados ucranianos que se emanciparam das cadeias de liderança do Exército Vermelho. Mal assumiu o comando das Forças Armadas, em julho do ano passado, mandou romper com essa ordem da caserna e procedeu imediatamente a uma reestruturação das lideranças, distribuídas horizontalmente, em total oposição às determinações herdadas da era soviética, exercidas de cima para baixo.
Combate universal
Zaluzhny também se encarregou de modernizar as tropas, para as tornar mais operacionais. Com apoio da NATO, designadamente dos Estados Unidos e do Reino Unido, as forças ucranianas recebaram formação no manejamento de armas modernas, como os drones turcos Bayraktar ou os mísseis antitanque Javelin, de fabrico americano, que têm infligido numerosas baixas às tropas russas. "São instrumentos maravilhosos, de alta precisão, que conseguimos combinar com os nossos mais recentes sistema de defesa", felicita-se o general, em declarações à BBC.
O "Herói da Ucrânia" é também descrito como um tipo frio e calculista e manifesta-se por um combate que considera universal: "Estamos a proteger todo o mundo civilizado. Esta é uma luta pela liberdade e pela justiça, pela paz, pelo futuro, por cidadãos inocentes e pelo nosso Estado. O desfecho da guerra Rússia-Ucrânia determinará que tipo de Europa haverá, democrática ou autoritária, ou que tipo de mundo, como um local de direito ou da lei da força. Responder a esta questão será a chave para compreender a nossa resistência. Somos fortes porque temos a noção do nosso papel no mundo", lê-se num dos últimos posts publicados por Zaluzhny nas redes sociais.
Ou como, contra todos os prognósticos, a Ucrânia tem sustido as tropas russas, ao ponto de o invasor se ver obrigado a bater em retirada, designadamente em redor de Kiev. Falta saber até onde pode chegar a resistência se a máquina destrutiva de Putin subir a escalada da guerra.