Advogada garante ter testemunhas para provar assédio de Boaventura de Sousa Santos
Daniela Felix é advogada de três mulheres - duas brasileiras e uma portuguesa - que acusam o sociólogo Boaventura de Sousa Santos de alegado assédio sexual e moral praticado no Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra. A jurista brasileira, que está a trabalhar no caso a partir do Brasil, aguarda pela criação da comissão independente por parte do centro de investigação para "apresentar a denúncia", com "todo o material probatório, incluindo testemunhas". Das três investigadoras que representa, "duas ainda mantêm vínculo com o CES".
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Um grupo de três mulheres enviou, esta semana, uma carta aberta ao CES onde pedem à instituição de ensino superior uma "investigação imparcial", que garanta não só a "transparência" e a "independência" do processo, como "a garantia de sigilo e acolhimento das vítimas". Daniela Felix explica ao JN que, só depois de criada a comissão de averiguações, é que "será apresentada a denúncia, elaborada a partir do dossiê das vítimas, que contém todo o material probatório, incluindo testemunhas". Fonte do CES disse não querer fazer qualquer comentário, neste momento, sobre a fase em que está o processo.
O dossiê das vítimas, diz a jurista brasileira, "explica os factos, junta as provas, nomeia as testemunhas e traz a linha do tempo das experiências de abuso vividas pelas investigadoras". No total, diz Daniela Felix, oito alegadas vítimas "já falaram": "três que escreveram o artigo (Catarina Laranjeiro, Mye Tom e Lieselotte Viaene), duas (Bella Gonçalves e Moira Millán) e três investigadoras que fazem a denúncia agora como coletivo de vítimas". A advogada, que é membro do Coletivo de Advogadas Feministas Marietta Baderna, representa as três últimas denunciantes, duas brasileiras e uma portuguesa.
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Recorde-se que a polémica no CES surgiu depois da publicação, na editora académica Routledge, de um capítulo num livro internacional sobre más condutas sexuais na academia. No capítulo chamado "As paredes falaram quando ninguém se atrevia", três investigadoras dão conta de alegados comportamentos sexuais inapropriados de Boaventura de Sousa Santos e de Bruno Sena Martins. Ambos foram suspensos do CES, a pedido dos próprios, enquanto decorre a averiguação das denúncias.
Ao JN, Daniela Felix diz haver cinco pessoas disponíveis para serem testemunhas. A advogada brasileira aponta que os factos "reportam a 19 anos de experiência laboral em equipas chefiadas por Boaventura de Sousa Santos", onde se incluem situações de "assédio sexual, publicação de textos e apropriação de ideias" das investigadoras e outras "práticas nocivas". Das três investigadoras representadas legalmente pela jurista, "duas ainda mantém vínculo com o CES".
Práticas atingiam homens e mulheres, diz advogada
"As práticas abusivas atingiam homens e mulheres. Mas as mulheres eram desproporcionalmente impactadas com a sobrecarga de trabalho, excesso de demandas, e com a frequência, o seu trabalho era depreciado. Os pedidos domésticos eram dirigidos às investigadoras, como pedir que lhe fosse servido um café ou que assegurassem que ele tinha bananas e água, enquanto estava hospedado em viagens para alguma atividade", precisa a advogada. O coletivo criado pelas três mulheres, e que enviou a carta aberta ao CES, está a receber denúncias através do email querocontarminhahistoriaem23@gmail.com.
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Boaventura de Sousa Santos disse ao jornal "Público" ter todo o "interesse em que a comissão do CES investigue". No entanto, o sociólogo afirmou não poder comentar as declarações de Daniela Felix por não conhecer em "detalhe" os factos que lhe são imputados. Acerca das acusações de Moira Millán, diz serem "caluniosas" e aponta ter documentos que desmentem os relatos da ativista argentina.
Por seu lado, a jurista brasileira diz que já houve resposta por parte da diretora executiva do CES, Rita Pais, à carta aberta enviada pelas três mulheres que representa. "O CES está a colocar o máximo empenho e zelo na constituição da comissão independente, para garantir que ela funcionará de forma verdadeiramente independente e que os seus membros reúnem as competências adequadas para liderar o processo com isenção e respeito por todas as partes envolvidas", reproduz ao JN. A resposta significa, diz Daniela Felix, que a comissão ainda não está criada.