António Garcia Pereira apresentou uma queixa formal a Amadeu Guerra, procurador-geral da República, pedindo que o Ministério Público (MP) ative os mecanismos legais que levem à extinção do Chega. O jurista defende que os comportamentos do partido de André Ventura constituem uma violação flagrante e continuada da Constituição.
Corpo do artigo
Segundo o jornal "Expresso", a participação de oito páginas redigida por Garcia Pereira invoca o artigo 46.º da Constituição, que estabelece que "não são consentidas organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista", bem como a lei dos partidos políticos, aprovada em 2003, onde se lê que o "Tribunal Constitucional decreta, a requerimento do Ministério Público, a extinção dos partidos políticos" sempre que sejam qualificados como "organização racista ou que perfilha a ideologia fascista". O advogado refere ainda a lei orgânica do Tribunal Constitucional, que consagra a competência de "ordenar a extinção dos partidos e de coligações de partidos, nos termos da lei".
A missiva dirigida a Amadeu Guerra foi entregue no mesmo dia em que o jurista apresentou ao Ministério Público elementos de prova sobre os cartazes colocados por André Ventura para as eleições presidenciais, para um inquérito-crime em curso no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, em que representa associações de ciganos numa queixa-crime contra o líder do Chega, feita em abril deste ano, por alegados crimes de ódio praticados contra esta comunidade. Para Garcia Pereira, o partido de André Ventura viola, de forma sistemática, os princípios democráticos e difunde discursos de ódio e de racismo.
Além de referir os recentes cartazes - que já suscitaram diversas queixas e levaram a Comissão Nacional de Eleições a pedir a intervenção do MP -, a queixa indica que o partido tem feito também apologia do anterior "regime de ditadura fascista", citando as declarações de Ventura de que o país "precisa não de um, mas de três Salazares".
"Como repetidamente têm sustentado diversos constitucionalistas (de Bacelar Gouveia a Vital Moreira e Jorge Miranda), a democracia, como regime político, não é nem pode ser o regime do 'vale tudo' em nome, designadamente, de liberdades como a de expressão e a de organização", escreveu, Garcia Pereira, acrescentando que se tornaram banais "os insultos mais boçais e dos discursos de ódio, inclusive no Parlamento, contra adversários políticos e contra certas comunidades".
"É, assim, nítido que o presidente do Chega - bem como outros dirigentes nacionais do mesmo partido, como Pedro Pinto, Rita Matias e Pedro Frazão - tem, publicamente e por meios destinados à publicação, difamado grupos de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou geográfica e religião, incitando e encorajando a discriminação, o ódio e até a violência contra tais grupos", salientou.
Ainda de acordo com o advogado, "há diversos casos de agressões consumadas e bárbaras a tais cidadãos e cidadãs, verificados no Algarve, no Porto e na Grande Lisboa, e causando a todos forte receio e constrangimento na sua liberdade de ação (designadamente, a de sair à rua e ir ao café, à escola dos filhos ou ao supermercado)".
Esta manhã, em declarações à RTP, António Garcia Pereira frisou que "já há muito" que o MP deveria ter atuado nesta matéria. "Temos aqui dois tipos de questões. Por um lado, a questão da extinção de um partido político, e, por outro lado, há comportamentos, condutas, que não têm nada a ver com liberdade de expressão e que simplesmente atingem a honra e a dignidade de grupo sociais, visando virar contra eles a violência e a discriminação".
