Número de indemnizações pagas pelo Estado está a cair de ano para ano. Das perdas registadas em 2021 apenas um quarto foi compensada.
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O lobo-ibérico atacou pelo menos 635 vezes no ano passado em território nacional. Os dados foram avançados ao JN pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e revelam que o número de ataques aumentou, ainda que ligeiramente face a 2020, interrompendo a descida registada nos dois anos anteriores.
Em 2020, foram contabilizados 630, menos cinco do que no ano passado. Em 2019, verificaram-se 903 investidas, quando no ano anterior se tinham registado 1381.
Ao contrário da quantidade de ataques, que voltou a subir, o número das indemnizações pagas pelo Estado para compensar quem sofreu prejuízos devido à espécie, que está protegida por lei, tem caído nos últimos quatro anos. Em 2018 foram indemnizados 735 ataques e no ano seguinte 454. Em 2020 foram pagas 424 ofensivas e o ano passado apenas 157. A maioria dos ataques registados em 2021 está ainda por compensar. O ICNF diz que estão por concluir 598 processos relativos ao ano passado e três casos não tiveram direito a qualquer compensação. O instituto não revelou o valor das indemnizações pagas nos últimos anos.
Covas do Monte está "farta"
Uma das aldeia mais fustigadas pelos ataques do lobo está encravada num sopé da serra da Arada, em São Pedro do Sul. Os pastores de Covas do Monte, conhecida pelo seu rebanho comunitário, estão saturados dos constantes ataques. Só este ano terão ocorrido sete investidas, tendo sido mortas uma centena de cabras. "Perdemos muito gado, o lobo esgana os animais, outros vêm feridos. É uma miséria", desabafa Maria Martins, de 87 anos.
"Temos cerca de 600 cabras. Há 10 anos eram 2000. Há 10 anos havia 22 produtores de gado e hoje somos cinco"
Em Covas do Monte há sete pastores, mas apenas cinco integram o rebanho comunitário, que está ameaçado pelo lobo e pelo despovoamento. A aldeia tem apenas 40 habitantes, a maioria idosos. Há somente cinco crianças.
Todos os dias, faça chuva ou sol, à vez, um dos produtores leva o gado para o monte. Na viagem são acompanhados por cães. É na montanha que os ataques acontecem.
A Associação de Conservação do Habitat do Lobo Ibérico acredita que a alcateia que ataca os rebanhos de Covas do Monte é composta por dois a quatro animais.
"O lobo por vezes passa 15 dias ou três semanas sem aparecer e depois ataca e mata 20 a 30 cabras só num dia", lamenta Filipe Cruz, de 44 anos, que reclama mais medidas de proteção ao gado. O mais jovem pastor da aldeia lamenta a falta de apoios do Estado e queixa-se do processo de comunicação das perdas. "Antes ligávamos, agora temos de comunicar pela Internet e a maioria dos produtores não tem net, nem computador, então já nem sequer fazemos as participações", adianta.
"Lacunas" na comunicação
Segundo o ICNF, em Covas do Monte, "após um pico registado em 2013, o número de prejuízos atribuídos ao lobo registados tem vindo a decrescer". Para isso contribuíram "as alterações na dinâmica populacional do lobo na região, bem como alterações nos efetivos pecuários existentes e na forma de maneio dos mesmos, nomeadamente a adoção de medidas de proteção mais eficazes". Já quanto à comunicação dos prejuízos, o ICNF reconhece que a plataforma possui "algumas lacunas", mas salienta que as perdas também podem ser comunicadas por telefone.