Novos contratos só foram enviados em dezembro para o Tribunal de Contas, que ainda não se pronunciou. Polícia Judiciária está a investigar suspeitas de corrupção e outros crimes relativas ao período em que José Luís Carneiro não era ministro.
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O período de transição entre contratos do Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) vai custar, ao Estado, 1,2 milhões de euros por mês, até um máximo de 7,4 milhões de euros. A despesa ocorre porque o processo de contratação dos novos operadores atrasou e a transição só deverá ficar concluída, no máximo, no final de junho.
O contrato feito por ajuste direto com os atuais fornecedores (Altice, Datacomp e Moreme) terminou a 31 de dezembro do ano passado, mas a SIRESP, SA teve de prolongá-lo para assegurar a continuidade do sistema até à conclusão do processo de contratação de novos operadores. Por esse prolongamento, "a SIRESP, SA está a pagar 1,24 milhões de euros mensais, cerca de 30% menos do que os 1,77 milhões de euros do contrato que terminou em dezembro de 2022", revelou a empresa pública ao JN. Feitas as contas, a previsão atual é de que "serão pagos 3,7 milhões de euros, se o período de transição for até 90 dias, e 7,4 milhões, se for até 180 dias", acrescenta, ressalvando que "os montantes irão diminuindo com a entrada em vigor dos novos contratos, após os respetivos vistos do Tribunal de Contas". Uma vez que a SIRESP, SA é detida pelo Estado a 100%, é este que cobre a despesa adicional e, para o efeito, foi aprovada, anteontem, uma indemnização compensatória em Conselho de Ministros.
Prolongar por interesse público
O concurso público para a gestão, a manutenção e a modernização do SIRESP até dezembro de 2027 já está concluído, mas faltam os vistos do Tribunal de Contas, que só recebeu os contratos relativos aos últimos lotes a 22 de dezembro.
Para prolongar o contrato que caducou no final de 2022, a SIRESP, SA recorreu, sobretudo, ao mecanismo dos "serviços complementares". Este regime está previsto no Código dos Contratos Públicos e "consiste em prolongar, porque se torna necessário por razões de interesse da entidade pública, o contrato para a realização de trabalhos que não estavam previstos", explica Pedro Costa Gonçalves, professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Para que a extensão do contrato original possa ocorrer, é preciso verificar-se "o critério da necessidade", salienta o docente, e o montante gasto na totalidade das prestações da extensão não pode exceder "metade do valor do contrato inicial". Ou seja, 16 milhões de euros no caso do SIRESP, pois o ajuste direto que expirou era de 32 milhões.
Além dos serviços complementares, a SIRESP, SA fez dois novos contratos para manter o sistema em vigor. Um foi com a Datacomp e outro com a Motorola, duas empresas que já iam prestar esse serviço, pois venceram os respetivos lotes do concurso público. Os serviços contratados "terão um valor-base próximo do definido no concurso público internacional", salienta a SIRESP, SA. O custo destes dois contratos já está integrado nos 7,4 milhões de euros.
Atraso suspeito investigado pela PJ
O atraso na conclusão do concurso público do SIRESP está envolto em polémica. Não é a primeira vez que o Estado é chamado a pagar demoras no processo (ler caixa). E a Polícia Judiciária está a investigar suspeitas de corrupção, tráfico de influência, recebimento ou oferta indevida de vantagem, participação económica em negócio, abuso de poder e prevaricação relativas ao período em que José Luís Carneiro não era ministro da Administração Interna. A investigação foi espoletada por uma denúncia da anterior ministra, Francisca Van Dunem, depois de esta ter recebido duas queixas.
Uma das queixas foi de Sandra Neves, antiga presidente da SIRESP, SA, que acusava o então secretário de Estado, Antero Luís, de favorecer a Motorola no concurso. Outra foi de Antero Luís, que acusava Sandra Neves de atrasar o processo para beneficiar a Altice. Até agora, não há arguidos, mas nenhum dos dois foi reconduzido nos cargos.
Demora já obrigou a ajuste de 32 milhões
Os atrasos no concurso público do SIRESP remontam ao período em que Eduardo Cabrita era ministro, em junho de 2021. Nesse mês, caducou o contrato em vigor e, na falta de um concurso público, a SIRESP, SA teve de fazer um ajuste direto de 31,9 milhões de euros para garantir 18 meses de serviço, até dezembro de 2022, data em que se previa que o concurso público ficaria concluído e entrariam os novos operadores. Para que a SIRESP, SA pudesse suprir esse valor, o Governo transferiu uma parte: 11 milhões de euros. O ajuste direto foi validado pelo Tribunal de Contas, mas com reservas.