Ex-secretário de Estado e antigo líder da ANEPC acusados de fraude em programa contra incêndios.
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O ex-ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, pressionou o antigo líder da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) Mourato Nunes para justificar a qualidade das golas e a situação à volta das irregularidades dos procedimentos de aquisição dos programas "Aldeia Segura - Pessoas Seguras". É o Ministério Público (MP) que o constata, na acusação do chamado caso das golas antifumo que o JN denunciou em 2019.
Além de Mourato Nunes, o MP acusou o ex-secretário de Estado da Proteção Civil José Artur Neves, membros do seu gabinete, assim como dirigentes de topo daquela estrutura e ainda empresários e respetivas firmas de terem desviado 364 mil euros em dinheiros públicos no âmbito do programa "Aldeia Segura - Pessoas Seguras".
Apesar de o escândalo sobre a qualidade e preço da aquisição das golas já ter sido exposto, o então ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, que não é arguido nem suspeito, qualificou as informações avançadas pelo JN como uma polémica lançada por uma "notícia falsa". Baseava-se num relatório encomendado pela própria Proteção Civil.
Mas, segundo a acusação do Ministério Público (MP) a que o JN teve acesso, já no verão de 2019, Carlos Mourato se recusara a validar a qualidade das golas, mesmo após ter sido "pressionado por Eduardo Cabrita".
Numa mensagem interna, citada na acusação, Mourato não poupou nos termos: "A descrição sobre a virtualidade das golas é excessiva na proteção de pescoço e cara, devendo limitar-se à proteção das vias respiratórias. No que respeita à invocada proteção do interesse público, relativamente às consultas prévias, deve ser retirado face a tudo o que sabemos agora sobre a tramitação dos procedimentos (...), não devemos continuar a alimentar este assunto pois estamos cheios de fragilidades e, sobretudo, não devemos cair no ridículo", afirma. Ou seja, até o líder da ANEPC já desistira de limitar o escândalo que ditaria a demissão do então secretário de Estado de Cabrita, José Artur Neves.
Conluio de alto nível
De acordo com o MP, existiu um conluio entre dirigentes de topo da Secretaria de Estado da Proteção Civil (SEPC) e da ANEPC, com adjudicações diretas viciadas para favorecer empresas de amigos. O caso que mais prejuízo deu ao Estado foi o dos 15 mil kits de autoproteção e das 70 mil golas encomendadas a uma empresa que geria um parque de campismo em Fafe, a Foxtrot, liderada por Ricardo Nuno Fernandes.
Este empresário tinha uma relação próxima com um oficial da GNR que era adjunto do ex-secretário de Estado, Jorge Barbosa, e que terá feito a ponte entre a SEPC e Fernandes, para que este fornecesse os kits e as golas, apesar de não ter capacidade para o fazer. Em conivência com os decisores, que iriam usar fundos europeus para pagar as faturas, arranjaram "orçamentos de favor" para fazer constar nos procedimentos de contratação pública, mas empolando os custos em 174 mil euros.