Chumbo da eutanásia: PS vai corrigir normas e diz que a questão é de semântica
O PS anunciou, esta segunda-feira, que vai corrigir as normas declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional, sustentando que está apenas em causa uma questão "semântica" e que a maior parte da argumentação do presidente da República não vingou.
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Esta posição foi transmitida pela deputada e dirigente socialista Isabel Moreira, depois de o Tribunal Constitucional (TC) ter declarado inconstitucionais algumas das normas do decreto que regula a morte medicamente assistida, em resposta ao pedido de fiscalização preventiva do Presidente da República.
Logo a seguir, na sequência da decisão do TC, o Presidente da República vetou por inconstitucionalidade o decreto do parlamento que despenaliza a morte medicamente assistida, como impõe a Constituição.
Na perspetiva de Isabel Moreira, em relação à constitucionalidade da morte medicamente assistida, já está só em causa uma questão de "semântica". "Aparentemente, sem prejuízo de uma leitura muito atenta que terá de ser feita de um acórdão complexo e com muitas declarações de voto - pelo que se percebeu foi sete votos contra seis -, a questão do TC é uma questão de uma palavra", defendeu.
Este foi o terceiro decreto aprovado no parlamento sobre a eutanásia e a segunda vez que o chefe de Estado, nesta matéria, requereu a fiscalização preventiva, no dia 4 de janeiro.
De acordo com a dirigente socialista, onde no decreto se define sofrimento de grande intensidade, "diz-se sofrimento fisco, psicológico e espiritual". "E o TC quer que o parlamento explicite - aquilo que para nós está absolutamente explícito, mas temos de respeitar - se é cumulativo ou não", frisou.
No entanto, com este acórdão do TC, na opinião da constitucionalista do PS, "está encerrada de uma vez por todas a questão de se saber se a eutanásia é inconstitucional em si mesma". "Por outro lado, a maior parte da argumentação do senhor Presidente da República não vingou, nomeadamente a questão de se saber se o conceito de doença grave e incurável seria inconstitucional em face de um outro conceito que já existia em outro diploma referente a doença fatal", apontou Isabel Moreira.
Neste ponto, a constitucionalista do PS acrescentou que ficou também afastada a questão constitucional alusiva à antecipação da morte. Por isso, "essas questões terem sido deixadas de fora é uma grande vitória. Tratando-se de corrigir uma palavra, cá estaremos no parlamento para o fazer em conjunto com todos os outros partidos que contribuem para este texto comum. É o que faremos de seguira", acentuou.
Perante os jornalistas, Isabel Moreira reforçou a tese de que o TC "não validou as questões mais fortes "que foram colocadas no pedido de fiscalização preventiva do Presidente da República.
"Há aqui um problema semântico que, para o TC, foi suficientemente forte para uma pronúncia pela inconstitucionalidade. Digo isto, com a reserva de ter de ainda ler o acórdão com muito cuidado", ressalvou.
Isabel Moreira manifestou-se em desacordo com a posição da maioria dos juízes do TC na questão sobre o caráter cumulativo ou não, em matéria de tipologia de sofrimento fisco, espiritual e psicológico.
"Para nós 'e' significa 'e' e não ou. Mas cá estaremos para dissipar qualquer dúvida e penso que estão criadas as condições para o diploma seguir limpo e com está última dúvida do TC resolvida", acrescentou.
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PCP espera que autores façam reflexão sobre lei
O PCP considerou que os autores do diploma sobre a eutanásia devem fazer "uma reflexão" sobre uma lei que "suscita algumas preocupações", depois de o Tribunal Constitucional ter declarado inconstitucionais algumas normas do decreto.
"Era importante que os autores desta lei refletissem sobre uma proposta que têm vindo a fazer e que suscita algumas preocupações, que temos manifestado, embora nós não colocámos a questão do ponto de vista constitucional, aguardámos serenamente pela decisão do Tribunal Constitucional", afirmou o membro do Comité Central do PCP António Filipe em declarações aos jornalistas em Beja, onde decorrem as jornadas parlamentares do partido.
O ex-deputado da Assembleia da República - que, na última legislatura, acompanhou o processo legislativo sobre a eutanásia - afirmou que o PCP regista a decisão do Tribunal Constitucional, que declarou inconstitucional o diploma sobre a morte medicamente assistida.
"Esta decisão está tomada e aquilo que importa dizer é que importa não perder tempo relativamente a questões que são fundamentais, que é o reforço do Serviço Nacional de Saúde, criar condições para que as pessoas que estejam em sofrimento tenham acesso a todos os cuidados paliativos a que têm direito e também prevenir práticas de obstinação terapêutica", salientou.
Livre apela a rápida aprovação da nova versão da lei
Em declarações aos jornalistas no parlamento, o membro de contacto do partido Livre Pedro Muacho disse que o partido "respeita a decisão" dos juízes e destaca "como ponto positivo" que o TC tenha "afastado completamente a dúvida" se qualquer lei sobre esta matéria seria contrária à Constituição.
"Sem prejuízo de analisarmos com mais calma os argumentos do TC, parece ser uma questão de clareza e o Livre vai empenhar-se no parlamento em esclarecer todas as dúvidas para que se possa estar perante uma lei que tenha certeza jurídica e não crie qualquer tipo de insegurança nas pessoas quanto à legislação e sua aplicabilidade", afirmou.
O dirigente do Livre manifestou ainda o desejo de que "rapidamente se possa aprovar no parlamento uma nova versão da lei que esclareça as dúvidas que o TC levantou".
O Tribunal Constitucional (TC) declarou hoje inconstitucionais algumas das normas do decreto que regula a morte medicamente assistida, em resposta ao pedido de fiscalização preventiva do Presidente da República, numa decisão tomada por maioria, de sete juízes contra seis.
PAN retoma "célere" de processo legislativo
A porta-voz do PAN espera que o processo legislativo sobre a despenalização da morte medicamente assistida retome "de forma célere" e que os deputados se debrucem apenas sobre as questões levantadas pelo Tribunal Constitucional.
"Aquilo que nos parece é que terá que agora ser posto em marcha o processo de forma célere para, de alguma forma, limar aquilo que posam ser as preocupações do Tribunal Constitucional [TC] e esperamos que o processo se cinja a isso mesmo, única e exclusivamente aos aspetos aqui apontados pelo TC", afirmou Inês de Sousa Real.
"Esperamos que o senhor Presidente da República, após este processo passar novamente pela Assembleia da República, não venha usar o veto político e que permita que esta lei avance, porque ela é da mais elementar justiça para com as pessoas que estão em elevado sofrimento provocado por doença irrecuperável e em sofrimento também ele irreversível", apelou Inês de Sousa Real.
A deputada única do PAN defendeu que "os conceitos que ficaram previstos neste diploma são cumulativos, ou seja, o critério do sofrimento e da doença irreversível são cumulativos", considerando que se está a entrar "em jogos de palavras e conceitos".
Inês de Sousa Real lamentou "o tribunal assim não o entendeu, voltando a referir-se ao conceito de doença fatal e a uma necessidade de maior determinabilidade dos conceitos.
A líder do PAN recusou também a ideia de um referendo, assinalando que "este processo foi dos processos mais participados em várias legislaturas", com a "auscultação de diferentes especialistas" e "da própria sociedade civil". "Não nos parece que seja através de refendo que se vá legislar ou decidir-se uma matéria desta elevada sensibilidade", defendeu.
"Problema de redação", diz IL
A Iniciativa Liberal considerou que as inconstitucionalidades apontadas no decreto da eutanásia configuram sobretudo um "problema de redação", o que indicia que Portugal está em vias de ter em lei o direito à morte medicamente assistida.
Perante os jornalistas, João Cotrim Figueiredo advertiu que o seu partido reserva um comentário mais de fundo sobre esta matéria após um estudo do acórdão e das declarações de voto na íntegra por parte dos juízes do Tribunal Constitucional.
"Mas podemos dizer duas coisas: O TC reafirma aquilo que já tinha feito no acórdão de março de 2021 relativamente à constitucionalidade do princípio da morte medicamente assistida, ou seja, o artigo 24º da Constituição que estabelece o direito de inviolabilidade da vida não fica prejudicado com a legislação que temos tentado fazer passar", começou por apontar.
Em segundo lugar, segundo o deputado da IL, das várias matérias que o Presidente da República levantou junto do TC "apenas uma -- de uma alínea em oito das definições do artigo 2º - é que se questiona se a natureza do sofrimento físico, mental ou espiritual devem ser cumulativos ou podem ser alternativos".
Portanto, para Cotrim Figueiredo, "trata-se de um problema de redação". "Na cabeça dos legisladores e das pessoas dos vários partidos que estiveram nos grupos de trabalho, é claro o que se pretende. Mas cá estaremos para fazer a correção do texto e será desta que poderemos ter em Portugal uma lei da morte medicamente assistida que possa conferir este direito a quem dele possa querer fazer uso", frisou.
BE diz que interpretação do TC é "um pouco surpreendente"
O dirigente do BE José Manuel Pureza considerou hoje que a decisão do Tribunal Constitucional sobre a lei da eutanásia é "um pouco incompreensível", mas deixa espaço para que uma "pequena questão" seja facilmente corrigida pelo parlamento.
"Com toda a franqueza, creio que a interpretação do Tribunal Constitucional é um pouco surpreendente, na exata medida em que o que está escrito na lei são três características de sofrimento com a palavra "e". Portanto, não creio que haja grandes dúvidas a este respeito", destacou.
Em declarações aos jornalistas, ao início da noite em Coimbra, o antigo deputado do BE afirmou que os bloquistas terão de analisar atentamente o acórdão do TC, uma vez que apenas é conhecido o que foi divulgado em comunicado, mas disse crer que foi deixado espaço para que "uma pequena questão" seja "corrigida facilmente pelo parlamento".