Portugal é o destino de cada vez mais estrangeiros altamente qualificados que trabalham remotamente. Muitos escolhem Lisboa ou outros "spots" lusos como "base", devido às autorizações de residência, ao bom clima, ao domínio razoável da língua inglesa pela população local, ou pelos benefícios fiscais. Já há projetos a nascer totalmente vocacionados para estas comunidades.
Corpo do artigo
Lisboa é "o melhor spot para nómadas digitais neste momento". Sean Tierney, um norte-americano de 46 anos que já passou por 42 países, não hesita em atribuir o rótulo à capital lusa, local onde se fixou há alguns anos. É um dos coorganizadores de um site da comunidade nómada lisboeta, "a maior do Mundo", com 13 500 membros, e do NomadPodcast.com.
Não é o único a sublinhar a importância que Portugal, e em particular a capital, está a assumir para estes profissionais qualificados que trabalham remotamente e viajam Mundo fora. O portal de viagens Momondo considerou Portugal como o melhor país para nómadas digitais e outros profissionais que trabalham remotamente, num ranking que analisou categorias como teletrabalho, lazer, saúde e segurança, em 111 destinos. Para a atribuição, divulgada no mês passado, contou também o clima e domínio da língua inglesa por parte dos residentes. E, claro, o visto que facilita a estada a trabalhadores viajantes.
"Lisboa é uma cidade popular, que nos últimos anos tem muitos nómadas digitais. É acessível em termos de preços e tem bom clima", descreve Lauro Lana, um brasileiro que já esteve em Portugal e agora fala ao JN Urbano a partir da Holanda. No site Nomadlist.com, que junta uma comunidade de quase 40 mil trabalhadores remotos espalhados pelo Mundo, Lisboa só recentemente perdeu a dianteira nas preferências para Ko Pha Ngan, Tailândia, estando agora em segundo lugar. Porto ocupa o 7.o lugar e a Madeira a 11.a posição.
O futuro do alojamento local passa por diversificar os segmentos de mercado para além do mercado turístico clássico
É precisamente neste arquipélago que o Governo Regional e a Startup Madeira estão a desenvolver o projeto Digital Nomads Madeira Island, para atrair cada vez mais destes profissionais. No último ano, destaca Carlos Lopes, presidente da Startup Madeira, "5000 nómadas digitais" pisaram a ilha.
O país tem de estar atento a este fenómeno, pois os nómadas digitais vão ter "um peso maior", referiu ao JN Urbano Vítor Costa, presidente do Turismo de Lisboa.
Eles são, por exemplo, uma das soluções para ajudar muitos estabelecimentos de alojamento local (AL) nos centros urbanos, como Porto e Lisboa, a sobreviverem à falta de turistas. O presidente da Associação de AL em Portugal disse que os nómadas digitais são, a par com doentes em tratamentos longos, professores, estudantes e profissionais de saúde, os novos ocupantes. "O futuro do alojamento local passa por diversificar os segmentos de mercado para além do mercado turístico clássico", assinalou Eduardo Miranda à Lusa, considerando que a tendência vai ser "conciliar o segmento turístico" com o de estadias prolongadas.
Só a burocracia que persiste atrapalha
Portugal tem locais bonitos, boa Internet, clima e gastronomia e a população domina razoavelmente a língua inglesa, elogiam os nómadas digitais ouvidos pelo JN Urbano. Mas são a possibilidade de obter residência e os benefícios fiscais que fazem com que muitos tenham escolhido o país para fixarem a sua "base".
A partir do México, onde Sean se encontra nesta altura, o norte-americano alerta, porém, que ainda há alguma burocracia a ultrapassar. No seu caso, o processo para obtenção de residência não foi fácil e revelou "disfuncionalidades" de alguns organismos governamentais. É um aspeto que podia ser "melhorado" para que mais nómadas se fixem em Portugal, considera.
Mas até nisso os nómadas já se estão a organizar, revela Sean. É que existe um projeto, o Rebase.co da Nomad List, que ajuda a obter residência em Portugal, ao "remover papelada demorada, complexidade legal e inúmeras taxas", pode ler-se no site.
Podemos continuar a trabalhar sem alterações, deixamos cá algum dinheiro e não roubamos empregos aos locais
O holandês Sander Van Rijsoort, que chegou a Portugal em 2020 a pensar ficar três meses, acabou por fixar aqui a sua base. "Demorei bastante a estabelecer o negócio e outras coisas", mas os "benefícios fiscais para os nómadas digitais são muito bons". O facto de "não taxar as criptomoedas", sublinha Sander, foi uma das razões que o levaram a mudar "os negócios" para Portugal.
Roman, 30 anos, um engenheiro de dados ucraniano a viver no Algarve, destaca o "esforço enorme" do Governo para "tornar possível e legal" a presença de nómadas digitais. "Podemos ter rendimentos fora do país e obter na mesma residência legal, sem ter de trabalhar para uma empresa portuguesa". O que é "bom" para ambas as partes: "Podemos continuar a trabalhar sem alterações, deixamos cá algum dinheiro e não roubamos empregos aos locais". No seu caso, demorou apenas "três meses a obter autorização de residência". Se fosse muito difícil, admite, "provavelmente Portugal não seria uma opção".
Michelle Case, do Texas, Estados Unidos, assentou em Lisboa em 2019, após percorrer vários continentes, por considerar este um país "seguro e equilibrado, com cidades vibrantes e muita natureza". Antes tinha estado na Indonésia. "Adorei, mas não achei que fosse seguro, por exemplo, se tivesse um problema de saúde".
Vikash Bajaj, um engenheiro informático norte-americano de 30 anos, viajou para Portugal pela primeira vez em 2016 devido à Web Summit. No ano passado, ficou para trabalhar depois da conferência, já que, pela primeira vez, se deslocou como empreendedor por conta própria. Ao longo de seis semanas aproveitou para conhecer Lisboa na companhia de outro nómada digital, o irlandês Mark. Em seguida rumou a Espanha e atualmente está na Índia, a trabalhar remotamente. Lisboa, diz, "não é um destino tão internacional como, por exemplo, Amesterdão, que já está sobrelotado por ser muito conhecido, mas tem tudo o que é necessário. É mais privado e tem um ambiente amigável".