Partidos são as organizações em que os portugueses menos confiam. Já o Parlamento é a instituição com maior crédito, indica estudo.
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Os níveis de confiança dos portugueses nas instituições democráticas estão a cair há 20 anos e atingiram os valores mais baixos durante os governos de José Sócrates e de Passos Coelho. Segundo um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, é nos partidos que os portugueses menos confiam, por acreditarem que estão demasiado próximos de interesses económicos. Por outro lado, é ao Parlamento que os cidadãos dão maior crédito.
"No que toca à confiança nas instituições políticas, os valores registados em Portugal têm vindo a decair nos últimos 20 anos. Os partidos são os que apresentam níveis de confiança mais baixos por toda a Europa (20 %, em média). O Parlamento é a instituição na qual os portugueses mais parecem confiar", apurou estudo "Ética e Integridade na Política", da Fundação Francisco Manuel dos Santos, coordenado por Luís de Sousa e Susana Coroado. Esta análise, a que o JN teve acesso, será apresentada hoje de manhã.
Os investigadores apuraram que foi, em 2013 (durante o Governo de Pedro Passos Coelho) que se registaram "os níveis mais baixos de sempre no que toca à confiança que os cidadãos" depositam nas instituições democráticas. Mas, nos últimos 20 anos, verificaram-se outros dois momentos em que os níveis de confiança caíram 8% e 12% respetivamente. Foi entre 2006/7 e 2009/10, ambos anos de governação de José Sócrates.
Ligação ao poder económico
O ano com maior nível de confiança foi o de 2017 (durante o Governo já liderado por António Costa), com subidas de 17% e de 20% nos índices de credibilidade no Governo e no Parlamento. Em oposição, os partidos nunca descolaram da média de 20% de confiança dos portugueses. Segundo os autores do estudo, "alguma dessa desconfiança dever-se-á à opacidade do financiamento".
"A perceção de que o financiamento dos partidos não é suficientemente transparente é mais alta em Portugal do que a média europeia, de acordo com o Eurobarómetro", apontam, recordando que, em 2017, "85 % dos entrevistados em Portugal acreditavam que havia relações demasiado próximas entre os partidos e os interesses económicos (a média europeia situava-se nos 79%)".
Acresce que, "apesar de algumas inovações estatutárias, os partidos mudaram muito pouco o seu modus operandi", explica-se no estudo, apontando, ainda, como causas para o défice de confiança a pouca participação dos cidadãos na escolha dos candidatos, o facto dos partidos deterem "o monopólio da representação parlamentar e do método de conversão de votos em mandatos favorecer as grandes formações partidárias".
"Temos uma classe política que foi criada num ambiente pouco saudável", aponta o politólogo José Adelino Maltez, explicando que, devido às dificuldades de recrutamento na sociedade civil, os governos são cada vez mais constituídos por pessoas formadas nos partidos. "A política acaba por ficar muito vinculada àquele grupo de pessoas que faz carreira nos partidos", concorda o investigador Viriato Soromenho Marques.
Redes de influência são o que afeta a opinião pública
"Hoje em dia, o que indigna a opinião pública são, sobretudo, os conluios e as redes de influência, através das quais as elites procuram assegurar ou obter vantagens para grupos de interesses com os quais mantêm relações estreitas, por via de ofertas de emprego ou pela prestação de serviços de consultoria", concluem os autores do estudo. Ou seja, casos como o do ex-secretário de Estado Miguel Alves. Segundo o presidente da Fundação Francisco Manuel dos Santos, Gonçalo Saraiva Matias, os cidadãos esperam que "os titulares do poder político exibam uma autoconsciência elevada relativamente aos padrões éticos".
"Os cidadãos associam a corrupção à política e respetivos atores", vinca-se no estudo, referindo-se que, mesmo quando se trata de branqueamento de capitais no setor privado, os cidadãos consideram "esses esquemas como resultado de um conluio público-privado". Os políticos são mais tolerantes com práticas que não violam a lei, apurou o estudo, referindo que preferem atuar sobre as situações fora da esfera pública.
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Níveis de confiança
Segundo o Eurobarómetro, entre 2001 e 2022, os níveis de confiança dos cidadãos na democracia foram de 54% na União Europeia (UE) e de 41% em Portugal. Já a confiança no Parlamento de cada país, foi de 34% na UE e de 36% em Portugal. Quanto à confiança no Governo de cada Estado, situou-se nos 32% na UE e 35% em Portugal.
17% nos partidos
O Eurobarómetro indicou ainda que, entre 2001 e 2022, Portugal encontra-se na média europeia no que toca aos níveis de confiança nos partidos: 17%.
Instituições
No início dos anos 2000, os portugueses tinham mais confiança nas instituições políticas do que satisfação geral com a democracia.