Médicos, autarcas, utentes. O descontentamento com a estratégia delineada para as urgências pediátricas de Lisboa e Vale do Tejo é transversal e pergunta-se "o que vem a seguir?" O ministro da Saúde diz que o "essencial é que as pessoas possam ter acesso a urgências" com qualidade e segurança e que haja previsibilidade em relação à forma como funciona o sistema. Manuel Pizarro acredita que será possível voltar a abrir a urgência pediátrica de Loures durante o dia ao fim de semana.
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O plano, anunciado ontem pela Direção- Executiva do SNS, depois de "longas semanas" de trabalho não agrada a utentes, autarcas das áreas de influência dos hospitais que encerram serviços e sindicatos médicos.
A estratégia, que vai vigorar entre 1 de abril e 30 de junho, define o encerramento das urgências pediátricas dos hospitais de S. Francisco Xavier, de Torres Vedras e de Loures à noite todos os dias. O mesmo serviço do Hospital de Loures mantém a suspensão da atividade ao fim de semana, entre as 21 horas de sexta-feira e as 9 horas de segunda, tal como já acontece desde o início do mês. Já a urgência de pediatria do Hospital de Setúbal encerra aos fins de semana de quinze em quinze dias.
Em declarações aos jornalistas, esta manhã de terça-feira, o ministro da Saúde considerou que a contestação não é generalizada e que o mapa apresentado é "até mais moderado" do que várias propostas técnicas que foram sendo divulgadas.
Ainda assim, Manuel Pizarro afirmou que espera reverter o encerramento diurno da urgência de pediatria de Loures aos sábados e domingos.
"A garantia que dei [aos autarcas] é a garantia que agora repito. Nós vamos trabalhar para ver se é possível que a urgência do hospital de Loures funcione também durante o dia, entre as 9 e as 21 horas, não apenas de segunda a sexta, mas também ao fim de semana", afirmou Manuel Pizarro.
Uma resposta ao presidente da Câmara de Loures que, na segunda-feira à noite, afirmou, em comunicado que a decisão de encerrar a urgência pediátrica do hospital ao fim de semana, contraria as garantias que tinham sido dadas há uma semana pelo ministro da Saúde aos autarcas de Loures, Odivelas, Mafra e Sobral de Monte Agraço de que as urgências do Beatriz Ângelo (HBA) iriam reabrir ao fim de semana, "em horário por definir".
"Decisão não foi organizativa, nem política". Não há médicos
Esta manhã, o ministro da Saúde explicou que em Loures o encerramento, em vigor desde o início deste mês, "não foi uma decisão organizativa nem política". Aconteceu por falta de médicos pediatras, sublinhou.
"Só se formos capazes de resolver essa carência é que podemos mudar estes horários", referiu, sublinhando que "quer à noite, quer ao fim de semana, as crianças de Loures e as suas famílias estão protegidas com o funcionamento de outras urgências, nomeadamente no Hospital de Santa Maria e de D. Estefânia".
Reconhecendo que a deslocação a essas urgências possa ser mais incómoda, Manuel Pizarro lembrou que "à noite e ao fim de semana não existe a pressão de tráfego automóvel que se tornaria mais insuportável durante os dias de semana".
"O que vão encerrar a seguir?", pergunta a FNAM
A presidente da Federação Nacional dos Médicos (FNAM) vê a solução encontrada com outros olhos. "As urgências de Loures e Torres Vedras são, porventura, as que mais precisavam de estar abertas. Estamos a falar de zonas muito carenciadas de médicos de família e de transportes", salientou Joana Bordalo e Sá, considerando que não é razoável obrigar as pessoas a fazer mais de 50 quilómetros para irem a uma urgência.
Face às constantes saídas de médicos do SNS e à falta de capacidade para captar e reter profissionais de saúde, este plano, na opinião de Joana Bordalo e Sá, "é a ponta do iceberg". E a pergunta que faz é: "o que vão encerrar a seguir?"
"Decisão passará rapidamente de provisória a definitiva", diz o SIM
O secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) corrobora. "Por incompetência e incapacidade para fixar médicos, no ano passado saíram cerca de mil médicos do SNS para o privado", realça, batendo na mesma tecla: excesso de trabalho, remunerações baixas e falta de condições levam a estas saídas. "E a solução não são encerramentos", assegura Jorge Roque da Cunha.
"Tenho a maior das dúvidas e deceção em relação a esta solução que, como tudo em Portugal, passará rapidamente de provisória a definitiva", afirmou o dirigente do SIM.
Autarcas defraudados contestam plano
As autarquias e as comissões que representam utentes dos serviços de saúde afetados pelo fecho de serviços também se têm juntado às críticas.
Em Torres Vedras, a presidente da Câmara, Laura Rodrigues (PS) avisa que "é um erro" encerrar aquele serviço num município "completamente desprovido" de urgências pediátricas.
Já o presidente da Câmara de Mafra, Hélder Silva (PSD) um dos municípios servidos pelo hospital de Loures, considerou que o Governo "defraudou as expectativas" ao decidir manter o encerramento das urgências pediátricas ao fim de semana.
As câmaras de Sesimbra, Palmela e Setúbal decidiram agendar, com caráter de urgência, um Fórum Intermunicipal da Saúde para responder à decisão do Governo de fechar quinzenalmente ao fim de semana a urgência pediátrica do Centro Hospitalar de Setúbal.
O objetivo, segundo uma nota da Câmara de Sesimbra, é "preparar uma resposta para evitar que a medida, que degrada os cuidados de saúde prestados à população, seja implementada".