Atira com contas certas e avanços no trabalho e saúde. PCP e BE criticam meras intenções. Marcelo põe "faca e queijo nas mãos dos partidos" e avisa que podem "perder o jogo".
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António Costa acenou com a "agenda para o trabalho digno" e o novo estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS), a aprovar na próxima semana, e prometeu avanços no estatuto profissional dos artistas para forçar os parceiros de negociação a viabilizar o Orçamento do Estado (OE). Mas ficou longe de convencer PCP e BE, que mantêm o voto contra. O primeiro-ministro, que se escuda na necessidade de "contas certas", terá de ceder nas reuniões que estão marcadas para a próxima semana, a fim de evitar uma crise política e eleições antecipadas, como alertou Marcelo Rebelo de Sousa, que ontem avisou que "empatar tempo é perder o jogo".
Para negociar, e sem prejudicar o défice, Costa tem também uma margem orçamental de 1,7 mil milhões de euros em despesa já programada para a administração pública. Ou seja, uma dotação provisional "destinada a assegurar despesas imprevisíveis e inadiáveis", mas que pode ser maior ou mais pequena conforme o que pretende "oferecer" à Esquerda.
"Propostas cabem no OE"
Para os parceiros de negociação, as suas propostas são acomodáveis sem necessidade de usar aquela margem. É sobretudo na saúde e nas leis do trabalho que insistem, daí que Costa anuncie medidas que irá levar a Conselho de Ministros, mas já a poucos dias da votação na generalidade (dia 27) para irem a discussão pública.
Numa intervenção aberta à imprensa na reunião com a bancada do PS sobre o OE, Costa considerou "fundamental o país continuar a ter contas certas" e a sua "credibilidade internacional intacta". Além disso, o OE é uma "moeda" com "duas faces": uma da despesa e da receita; outra do respetivo saldo. Mas prometeu "humildade" até à votação na generalidade e até à votação final global, a 25 de novembro.
O primeiro-ministro anunciou a aprovação da "agenda para o trabalho digno", dos estatutos do SNS e dos artistas, temas caros aos seus parceiros.
Marcelo explica aviso
"Vejo que alguns falam do tema da caducidade [da contratação coletiva], que não se trata na lei do OE. Mas trata-se e tratar-se-á - e bem tratado - na agenda do trabalho digno que iremos aprovar para colocar em discussão pública e rapidamente passar a forma de lei", garantiu. Já o estatuto do SNS é para que "as carreiras sejam atrativas" e para "atrair e fixar duradouramente profissionais". Na Cultura, Costa defende "um sistema em que haja os devidos descontos para a Segurança Social, mas que garanta também a todos a proteção social nas diferentes vicissitudes da vida".
Por sua vez, o presidente Marcelo Rebelo de Sousa justificou as preocupações da véspera. Diz que "mais vale prevenir do que remediar" e que falou "sem drama" de eleições antecipadas. Agora, "a faca e o queijo estão nas mãos dos partidos" e só "haverá crise se entenderem que há razões para a provocar". Questionado sobre se é artificial, disse estar convencido de que o OE passa como manda "o bom senso".
Após Rui Rio pedir para adiar a marcação de diretas no PSD, Marcelo recusou falar "sobre o que cada líder pensa acerca do seu passado, presente e futuro". "Já fui líder e sei muito bem o que é travar autárquicas, fazer a sua leitura e enfrentar ou não legislativas", reagiu.
Esquerda reivindica
Confrontado com as medidas referidas por Costa, João Oliveira, líder da bancada do PCP, disse ao JN que "são apenas intenções" e "conhecidas desde que a questão de Odemira ganhou mediatismo". "Não correspondem ao que é preciso" e são "uma forma de adiar a resposta necessária, sem compromisso do Governo" no combate à precariedade, travão aos despedimentos e horários "selvagens", reagiu. No SNS, quer rever e valorizar as carreiras.
PCP e BE insistem na reposição dos valores do trabalho suplementar e no descanso compensatório, como "oportunidade" para o PS mostrar diálogo (os projetos são votados hoje). O deputado bloquista José Soeiro disse que o Governo organizou a agenda para o trabalho digno "de modo a desembrulhar as propostas no número máximo de medidas e parece que já vai em 68".