Famílias continuam a confiar nas instituições, apesar dos surtos. Há quem já recuse inscrições, devido à procura elevada.
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Desde o início da pandemia até ao final do mês passado, Portugal registou 4666 óbitos de pessoas residentes em lares. São perdas resultantes de vários surtos de covid-19 que alarmaram o país, mas que não abalaram a confiança das famílias nestas estruturas, que continuam a somar idosos em lista de espera para conseguir uma vaga, garantem os responsáveis das instituições particulares de solidariedade social (IPSS) e das misericórdias.
Na memória de Maria Luísa Silva, diretora-técnica do Asilo de S. José, em Braga, ainda está bem presente a primeira vaga da pandemia. O vírus infetou dezenas de utentes e funcionários e houve sete idosos que não resistiram à doença. "Pensámos que as pessoas iam ficar com medo e não íamos ter tanta procura, mas isso não aconteceu. Tivemos tanta afluência quando reabrimos as inscrições, que logo a seguir parámos de receber admissões", conta a responsável, garantindo que à espera de vaga estarão quase uma centena de idosos. "Se tivesse 50 a 100 novas vagas, ocupava-as todas. É muita gente a bater à porta", admite Maria Luísa, explicando que, atualmente, tem apenas seis camas de isolamento para responder a eventuais infeções, ou seja, muito menos do que a procura.
A mesma versão apresenta o provedor Jorge Ribeiro, do Lar Pereira de Sousa, pertencente à Misericórdia de Melgaço. No início da pandemia, a estrutura também sofreu um surto de covid-19 que matou uma dezena de idosos, mas as famílias "mantiveram o nível de confiança de sempre", afirma o responsável, contabilizando dez pessoas em lista de espera.
"Estamos cheios, porque também disponibilizamos vagas para altas sociais, ou seja, pessoas que estão prontas para sair dos hospitais, mas não têm para onde ir. Só na eventualidade de alguém falecer ou alguma saída é que voltamos a disponibilizar camas", esclarece Jorge Ribeiro, adiantando que, tanto no Lar Pereira de Sousa como no Cantinho dos Avós, também pertencente à Misericórdia de Melgaço, há projetos de ampliação em curso. Na totalidade, vão aumentar a capacidade em 52 camas. "Ao final de um ano, perspetivamos ter as vagas cheias", refere.
Segundo o presidente da União das Misericórdias Portuguesas, Manuel Lemos, só nas estruturas que representa terão falecido "cerca de 1600 utentes" por covid-19, "mas o tsunami geracional é muito maior".
Reforço de verbas
"Se nos próximos anos não melhorarmos a rede de lares e o apoio domiciliário, vamos ter um problema social sério. Há muita gente a ficar velhinha, com demência, doenças crónicas, fragilidades motoras e físicas graves. A situação vai agravar-se e, por isso, no programa de resiliência e quadros comunitários pedimos ao Governo que reforce as verbas não só para requalificação dos lares, mas também para construir novos", adianta o dirigente.
Lino Maia, da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, confirma que a mortalidade devido à pandemia não aliviou as estruturas, "Já estão a repor as vagas", conclui.
MORTALIDADE
Lisboa mais afetada
Dos 4666 óbitos por covid-19 de pessoas residentes em lares, 1908 aconteceram em Lisboa e Vale do Tejo, tendo sido esta a região mais afetada. Seguiu-se o Centro, com 1318 casos, e o Norte, com 802. No Alentejo, morreram 527 idosos institucionalizados e, no Algarve, foram contabilizados 111, segundo os dados disponibilizados pela Direção-Geral da Saúde.
Semana zero
O país não registou desde o passado dia 29 de março mortes associadas à covid-19 em lares, pela primeira vez desde que começou a pandemia, anunciou a ministra Ana Mendes Godinho.