Testes covid-19 nos laboratórios explicam subida para os 718 milhões. Em 2021, cirurgias e consultas recuperam níveis de 2019. Centros de saúde com 56% dos atendimentos à distância.
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A despesa do Serviço Nacional de Saúde com meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT) no setor convencionado (estabelecimentos privados e sociais com acordo com o SNS) cresceu 48% no ano passado face a 2020, para os 718 milhões de euros, o montante mais elevado de sempre. Os gastos com os testes covid-19, realizados em laboratórios privados (o valor não inclui a despesa com testes nas farmácias), explicam a maior fatia do aumento dos encargos. 2021 foi um ano marcado pelos efeitos da pandemia, mas de recuperação da atividade assistencial no serviço público.
O relatório anual de acesso aos cuidados de saúde no SNS e entidades convencionadas 2021, a que o JN teve acesso, realça o aumento dos encargos com exames e tratamentos naqueles prestadores a pedido dos centros de saúde ou dos hospitais. Sendo que aquela despesa é ainda maior porque não contempla as áreas da hemodiálise e das cirurgias realizadas em unidades privadas ou sociais por falta de capacidade do SNS (ler ao lado). Os gastos com os convencionados têm sido apontados pela Esquerda como uma forma encapotada do SNS financiar o setor privado da saúde.
A área das Análises Clínicos representa 53% dos encargos do SNS com convencionados, num total de 377 milhões de euros faturados em 2021, mais 191 milhões do que em 2019, antes da pandemia. A Radiologia (17%), a Medicina Física e de Reabilitação (16%) e a Endoscopia Gastrenterológica (8%) são as outras áreas em que o SNS mais recorre a privados e sociais para dar resposta aos doentes. Em 2021, os encargos com exames e tratamentos subiram em todas as áreas convencionadas face a 2020, com destaque para a Pneumologia/Imunoalergologia, que cresceu 95%.
Recuperação face a 2019
O relatório anual de acesso, tal como os anteriores, compara os resultados de 2021 com o período homólogo (2020), um ano atípico em que os serviços de saúde estiveram condicionados pela necessidade de resposta à covid-19. Como tal, verificam-se várias melhorias, que indicam a recuperação da atividade assistencial.
Ainda assim, há resultados que superam os valores de 2019, nomeadamente ao nível das cirurgias (mais 4726), como já tinha sido adiantado pelo Governo. No que toca a consultas hospitalares, os números aproximam-se de 2019, acima dos 12,4 milhões.
As primeiras consultas, que representam um indicador de acesso ao SNS, totalizaram 3,52 milhões, próximo dos valores de 2019 (3,57 milhões).
Consultas à distância
Nos cuidados primários, o total de consultas aumentou face a 2019 (mais 4469, totalizando 36 038 consultas), mas cerca de 20 mil (56%) foram à distância, uma modalidade que sofreu um forte incremento com a pandemia, mas que pode pôr em causa a qualidade da medicina, como já alertou a Ordem dos Médicos. A atividade realizada pelos centros de saúde em atendimento complementar ou a chamada "consulta aberta" manteve a tendência de descida dos últimos anos.
Em sentido contrário, as urgências hospitalares voltaram a crescer em 2021. Face a 2020 o aumento é de 14,1%, num total de 5,2 milhões de episódios, abaixo dos registados em 2019 (6,4 milhões). A tendência é de subida porque, este ano, de janeiro a julho, os números estão muito próximos do período pré-pandemia, como o JN noticiou no início desta semana.
À lupa
Hemodiálise custa 295 milhões
O SNS gastou, em 2021, 295 milhões de euros com hemodiálise no setor privado ou social, um valor apenas superado em 2018.
Vales para cirurgia estão a diminuir
A emissão de vales cirurgia - para operar doentes que ultrapassam os tempos máximos de resposta num hospital privado ou social - caiu para níveis próximos de 2017 (cerca de 131 mil) e resultou em menos 3740 doentes operados naquele modelo. O relatório não refere os custos destas cirurgias.
Saldo negativo de médicos de família
Em 2021, saíram mais médicos de família do SNS do que entraram, registando-se um saldo negativo de 71 especialistas. A 31 de dezembro daquele ano, 1,2 milhões de utentes estavam sem médico de família.
Menos apoios para deixar de fumar
Os constrangimentos provocados pela covid-19 nos centros de saúde tiveram impacto ao nível das consultas de cessação tabágica. Os locais de consulta diminuíram 26% e as primeiras consultas tiveram uma quebra de 4,2%.
Mais de 1200 à espera dos continuados
A 31 de dezembro de 2021, havia 1239 doentes à espera de vaga na rede de cuidados continuados, metade na região de Lisboa e Vale do Tejo.
Hospitais
36,7% das consultas de oncologia
foram realizadas fora dos Tempos Máximos de Resposta Garantidos. A média nacional de consultas médicas realizadas dentro daqueles tempos definidos legalmente foi de 79%, uma melhoria face a 2020.
3,2 meses de espera para cirurgia
A mediana de tempo de espera para cirurgia situou-se nos 3,2 meses em 2021. Foi melhor do que em 2020, mas é influenciada pela redução do número de inscritos na lista naquele ano.