O presidente da República discursou, esta quarta-feira, no Parlamento Europeu, tendo exortado a União Europeia (UE) a "tomar a iniciativa" para resolver os problemas dos cidadãos. Só agindo dessa forma e travando "egoísmos fúteis", considerou Marcelo Rebelo de Sousa, será possível evitar a criação de "frustrações" e de "vazios" prontos a serem preenchidos pelos "populismos".
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Em Estrasburgo, o chefe de Estado enumerou oito temas aos quais considera que a UE deve dar prioridade. O "mais urgente", frisou, é o fim da guerra da Ucrânia; depois, há sete questões "de médio e longo prazo", a resolver até 2029 - ano do fim da próxima legislatura do Parlamento Europeu, que terá início com as eleições europeias de maio de 2024. Mas, para dar resposta a tudo isso, será preciso que a UE deite mãos à obra e não se fique por "vagas ideias abstratas", advertiu.
Sobre a guerra, Marcelo Rebelo de Sousa defendeu, perante os eurodeputados, que a UE deve apoiar uma "paz legal, justa e moral". Esta, vincou, deverá respeitar sempre "o direito internacional e os direitos humanos".
Entre os restantes sete temas, o primeiro a que Marcelo fez referência foi o da necessidade de afirmação da UE enquanto "efetiva potência global". O presidente sublinhou que, num mundo repartido entre "potências confirmadas" - a China - e "potências diminuídas" - os EUA -, a UE terá de ser "o mais forte possível". Isso, contudo, só ocorrerá caso exista "unidade" entre os 27 Estados-membros.
Marcelo mostrou-se também favorável ao alargamento da UE, abrangendo Ucrânia e não só. No entanto, defendeu que esse passo deve ser dado "com a melhor preparação possível" em termos económicos, sociais e institucionais, sob pena de que a entrada de novos países redunde numa "desilusão dramática para todos".
"Egoísmos nacionais têm de ceder perante valores da UE"
O presidente exortou também os líderes europeus e os eurodeputados a "acelerar a recuperação da economia", lembrando que a inflação "está a sacrificar milhões de europeus". Só fazendo deste tema uma prioridade será possível "aproximar mais e mais os europeus da UE", vincou, num discurso em que, por várias vezes, deu mostras da sua preocupação quanto ao afastamento entre os cidadãos e a burocracia europeia.
O quinto tema trazido a debate por Marcelo Rebelo de Sousa foi a questão dos fundos europeus. Neste particular, o presidente pediu para "não [se] adiar a clareza na definição dessas linhas mestras"; se esse aspeto não for agilizado, "tudo ficará mais pesado e atribulado para resolver mais tarde", argumentou.
Marcelo apelou a que a UE defina melhor a sua "política de relação com os outros continentes", para lá das políticas de migrações. E indagou: "A UE quer ficar distante, fechada sobre si mesma por causas antigas e recentes - como a pandemia e a guerra - ou quer ser ativa, antecipatória, aberta?".
Referindo que muitos países de fora da esfera dita ocidental não consideram a guerra da Ucrânia "global" - vendo-a, pelo contrário, como estando restrita ao continente europeu -, Marcelo sublinhou que a UE não pode agarrar-se a "egoísmos fúteis" que a levem a "esquecer ou congelar" parcerias com África, América Latina e Ásia. "Os egoísmos nacionais têm de ceder perante os valores da UE", insistiu, aludindo também ao tema das migrações.
Se populismo triunfar, "é por nossa culpa"
Também a nível climático, da transição energética e do digital, o presidente considerou que a União tem pela frente o dilema de esperar que a guerra termine para agir ou, pelo contrário, atuar de forma imediata. "Uma potência global como a UE tem de ser pioneira", referiu; caso contrário, "ficará para trás".
O último tema abordado por Marcelo foi a renovação geracional do espaço europeu - que, no seu entender, a UE deve "acelerar" o quanto antes. Esse, acredita o presidente, é o requisito para "uma Europa que não aliene os jovens" e que aumente a participação política e social destes.
Um eventual falhanço dessa renovação "criará vazios que serão preenchidos por aquilo a que muitos chamam populismos, movimentos anti-sistémicos", alertou o presidente. "Se isso acontecer, é por nossa culpa", referiu, uma vez que as forças políticas em causa "fazem aquilo que é sua intenção fazer".
"É este o desafio. Temos pouco tempo para o anteciparmos e a Europa merece-o", rematou o presidente, dando por concluída uma intervenção repleta de avisos.