Coordenador nacional da Hospitalização Domiciliária quer dar "passo arrojado".
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Os doentes oncológicos, que perdem horas nos hospitais a fazer quimioterapia endovenosa, podem vir a realizar os tratamentos no conforto das suas casas. É "um passo arrojado", já dado noutros países, e que o coordenador do programa nacional de Hospitalização Domiciliária quer dar em Portugal. Numa altura em que 36 hospitais públicos já internam doentes em casa (só faltam Braga e Beja), num total de mais de 300 por dia, é preciso continuar a crescer, mas também a aumentar a oferta de serviços, defende Delfim Rodrigues. Mas, para isso, há que investir no projeto: as muitas saídas de profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) têm travado a expansão do modelo, alerta a diretora do Serviço de Medicina Interna do Garcia de Orta.
Desafiado pelo JN a olhar para o futuro da hospitalização domiciliária, Delfim Rodrigues acredita que é preciso "apostar em áreas que fazem a diferença na vida das pessoas". Uma delas passa por levar a casa tratamentos realizados em hospital de dia. E já há alguns exemplos no terreno.
O Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra e o Hospital D. Estefânia, em Lisboa, têm projetos para tratamentos endovenosos de crianças no domicílio. O Centro Hospitalar do Médio Tejo, além de já estar a internar crianças em casa, também faz consultas e alguns tratamentos a doentes crónicos da Pediatria (ler página ao lado). E no Hospital Senhora da Oliveira, em Guimarães, também já se faz terapêutica de substituição enzimática domiciliária a quem tem doenças de sobrecarga.
Na Oncologia, refere o coordenador do Programa Nacional de Implementação das Unidades de Hospitalização Domiciliária nos hospitais do SNS, "há um próximo passo arrojado a dar que é a quimioterapia em casa". Será sempre dependente da neoplasia e do índice de severidade, mas "devemos começar a pensar como podemos garantir a qualidade e a segurança do tratamento em casa, evitando a deslocação do doente ao hospital", adianta Delfim Rodrigues. E é eficiente? "Vejo outros países a fazer", responde, apontando os exemplos dos Países Baixos e da Dinamarca, que "fazem tratamentos oncológicos em centros comunitários e casa a casa".
Investir em recursos humanos
Francisca Delerue, diretora do Serviço de Medicina Interna do Garcia de Orta e presidente do II Congresso Nacional de Hospitalização Domiciliária, que termina hoje, acredita que o futuro do internamento domiciliário passa pelo alargamento a mais doentes, com o recurso à telemonitorização para se chegar a patologias mais complexas. Mas, avisa a médica, "é preciso ajudar os hospitais" neste crescimento, um recado que será enviado ao Ministério da Saúde no final do congresso. "Queremos mostrar à tutela que é preciso investir nas 36 unidades e o principal investimento é em recursos humanos", diz, notando que também falta autonomia aos hospitais para contratarem.
SEGURANÇA
Taxas de mortalidade e de reinternamento são mais baixas
A hospitalização domiciliária (HD) tem dado provas de segurança e qualidade. A taxa de mortalidade no domicílio é de 1,02% (dados de 31 de dezembro de 2021), mais baixa do que a hospitalar (5%). E a taxa de reinternamento (a 72 horas, 30 e 90 dias), indicador que mede a qualidade do serviço prestado, "é de 35% nos hospitais e de 2% na hospitalização domiciliária", revela Delfim Rodrigues. Dados que assumem especial significado entre os idosos. Segundo o responsável do programa de HD, 25% dos doentes com mais de 85 anos morrem nos 30 dias pós-alta hospitalar e 45% entram em dependência funcional absoluta.