Maioria dos automobilistas que morre na estrada está sóbria, mas os que beberam fizeram-no sem moderação: tinham uma taxa-crime de álcool. Polícia com maior fiscalização, mas o reforço é feito de dia. As infrações são normalmente à noite.
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O consumo excessivo de álcool volta a ganhar peso na sinistralidade rodoviária. Dos 284 condutores autopsiados pela Medicina Legal, no ano passado, 105 tinham bebido mais do que o permitido por lei. E, desses, 79% estavam acima do limite a partir do qual conduzir é um crime - uma linha que se tem agravado de ano para ano.
Até 2014, o álcool perdeu influência na sinistralidade mortal, porque a crise retirou carros da estrada, justifica Manuel João Ramos, da Associação dos Cidadãos Automobilizados. A partir de 2014, todavia, o álcool reganhou peso na sinistralidade.
É certo que a maioria dos condutores que perderam a vida na estrada não tinham bebido ou estavam dentro do limite autorizado, de até 0,49 gramas de álcool por litro de sangue (g/l). Dados do Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses enviados ao JN pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) mostram que foi esse o caso de 63% das pessoas mortas ao volante em 2019.
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Mas nas restantes 37%, o limite de consumo tinha sido ultrapassado - e a larga maioria tinha até bebido além do teto máximo de 1,2 g/l, a partir do qual poderiam ter sido julgados pelo crime de condução sob o efeito de álcool. Dos condutores que morreram sob o efeito do álcool, no ano passado, 79% tinham uma taxa-crime; no ano anterior, tinham sido 78%; e em 2017, não passaram dos 70%. Ou seja, os portugueses parecem conscientes do perigo de circular na estrada num estado alterado de consciência, mas quem consome bebidas alcoólicas bebe sem moderação.
Os dados da Medicina Legal sobre peões e passageiros são igualmente graves: dos 21 peões mortos sob a influência de álcool, 15 tinham uma taxa-crime; nos passageiros, 14 morreram alcoolizados, nove dos quais com taxa-crime.
Intervenientes não escapam
Além das vítimas mortais autopsiadas, o Instituto de Medicina Legal testa a presença de álcool no sangue de intervenientes em acidentes de viação que causam mortos ou feridos graves. Dos quase cinco mil condutores, passageiros ou peões testados, 61% estavam acima do limite legal e 45% ultrapassavam a fasquia do crime.
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A situação é ainda mais grave quando se olha apenas para os condutores: em 46% dos casos, estavam tão embriagados que cometiam um crime só por conduzirem um veículo. Quanto aos peões, 30% tinham uma taxa superior a 1,2 g/l. Note-se que a lei impõe limites legais ao álcool que um condutor pode consumir, mas não define qualquer teto máximo para peões ou passageiros.
Lisboa com mais infratores
A PSP e a GNR têm fiscalizado mais na última década e fizeram o teste do balão a 1,8 milhões de condutores no ano passado. Os testes, quase todos aleatórios, têm apanhado cada vez menos condutores alcoolizados. Um fator que pode contribuir para essa descida é o facto de estarem a ser feitos mais testes durante o dia, apesar de o maior número de infrações ser detetado entre a meia-noite e as oito da manhã, indicam dados da ANSR.
Além disso, o peso de quem conduz com taxa-crime tem crescido nos últimos dez anos. Ou seja, há menos apanhados ao volante embriagados, mas os que sopram ao balão beberam sem qualquer moderação.
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A ANSR revela ainda que os condutores com entre 20 e 29 anos ou mais de 50 são os que mais bebem ao volante e que é o distrito de Lisboa que tem a maior taxa de infratores.