Projeto analisou mais de 80 nascentes e vai disponibilizar dados online. Aberta a porta a inovações na saúde e a aferir melhor o prazo de validade.
Corpo do artigo
Quem vai às termas para tratar um problema de saúde específico ou bebe uma determinada água mineral pelas suas propriedades - como ser alcalina, por exemplo - fá-lo por uma razão empírica, por hábito, ou devido à sua composição físico-química, e não pelo conhecimento detalhado da microbiologia de cada uma delas. Mas este cenário está a mudar. Hoje são divulgados, em Lisboa, os resultados do projeto Hidrogenoma que dão a conhecer, de forma mais detalhada, as características que compõem cada uma das mais de 80 águas que nascem em território nacional. E abrem a porta à validação das indicações terapêuticas de cada uma delas.
O conhecimento agora obtido, no âmbito de um projeto inovador da Direção-Geral da Energia e Geologia (DGEG), pode trazer alterações a nível dos tratamentos recomendados, na sua utilização pela indústria cosmética, e até a reavaliação dos prazos de validade da água mineral engarrafada para consumo.
Durante dois anos foram analisadas as vertentes da hidrogeologia, microbiologia e geoquímica de mais de 80 águas minerais naturais. "Não há neste momento nenhuma indicação terapêutica de uma água mineral natural que esteja definida em termos de microbiologia", adiantou ao JN Carla Lourenço, diretora de Serviços de Recursos Hidrogeológicos e Geotérmicos da DGEG. "O que nós queremos é que as terapêuticas das águas minerais passem a ficar definidas do ponto de vista científico, tendo também em conta a microbiologia", disse. A informação vai ficar disponível ao público num portal de divulgação, para já no site da DGEG.
DGS a certificar rótulos?
"Para umas houve logo resultados muito bons, para outras é preciso um estudo mais detalhado", explicou a responsável, adiantando que, no caso das águas sulfúreas (indicadas para problemas de pele, aparelho respiratório e reumatismo), encontraram-se "micro-organismos que estão nessa sintonia", mas podem encontrar-se outros que ainda façam especificamente "mais alguma coisa".
Outra mais-valia deste estudo é a possibilidade de se analisar o envelhecimento da água destinada ao consumo humano e permitir determinar os prazos de validade e os materiais mais adequados à sua conservação. "Conhecendo os micro-organismos, até poderemos saber que há determinadas águas que podem ser mais bem acondicionadas em vidro do que em PVC, a questão da exposição solar e a validade que numas pode ser de 18 meses e noutras pode ir até aos 24 ou 36 meses". Além disso, os produtores poderão solicitar à Direção-Geral da Saúde (DGS) a menção de determinadas características nos rótulos. "Como, por exemplo, que uma determinada água favorece a digestão".
Segundo os autores, os resultados deste estudo podem potenciar "novas aplicações" nas áreas da cosmética e farmacêutica, "dando origem a novos produtos de valor acrescentado com propriedades específicas", valorizando-se a naturoterapia.
Projeto-piloto
Mais de 12 mil prescrições para tratamentos
Até outubro, foram prescritos pelos médicos 12 081 tratamentos termais comparticipados aos utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS), no valor de 483 089 euros, adiantou a tutela ao JN. As comparticipações destes tratamentos foram feitas ao abrigo de um projeto-piloto, lançado em abril, quando o SNS passou a comparticipar termas, com uma dotação máxima de 600 mil euros. O projeto tem a duração de um ano, sendo avaliado no primeiro trimestre de 2020. Os utentes podem beneficiar de uma comparticipação de 35% no tratamento termal até um máximo de 95 euros. Nem todos os tratamentos estão abrangidos pela comparticipação. Entre os que recebem financiamento estão os destinados a algumas doenças reumáticas e músculo-esqueléticas, do aparelho respiratório e da pele.
Em detalhe
Descoberta inédita
A análise permitiu descobrir micro-organismos nas águas que ainda não estão caracterizados nas bases de dados mundiais. Mas a sua presença não significa que sejam prejudiciais à saúde. Antes pelo contrário: até podem atribuir-lhes outras propriedades terapêuticas além das já conhecidas.
Amostras congeladas
As amostras vão estar congeladas durante os próximos cinco anos à guarda do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária. O objetivo é que os concessionários possam fazer ainda análises mais profundas sobre as características das águas que gerem.