Grávida estava "estabilizada". Transferência "era o melhor para o bebé", esclarece Santa Maria
O Hospital de Santa Maria, em Lisboa, esclareceu esta terça-feira que a grávida de 34 anos que acabou por morrer no Hospital de São Francisco Xavier foi atendida por uma "equipa obstétrica completa". Transferência só ocorreu quando a mulher "estava estabilizada do ponto de vista clínico", garante.
Corpo do artigo
15123695
Em declarações aos jornalistas, a obstetra Luísa Pinto explicou que a mulher, de nacionalidade indiana e grávida de 31 semanas, recorreu ao serviço de urgência do Santa Maria "por sensação de falta de ar e taquicardia" e recebeu todos os cuidados necessários. O nascimento da criança, que se encontra bem, não aconteceu no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) por ausência de vagas de Neonatologia. O Hospital Santa Maria tem 16 camas para bebés, oito de cuidados intensivos e oito de cuidados intermédios.
A equipa da urgência da obstetrícia estava completa na noite em que a grávida deu entrada. Na altura da transferência da paciente - que o hospital justifica com o facto de ser mais benéfico para o bebé, que sofria de uma "restrição de crescimento", nascer no local onde pode ser assistido - a grávida "estava estabilizada" e "nada fazia prever" que a mulher entrasse em paragem cardíaca.
"Está cientificamente comprovado que é melhor para o bebé nascer no local onde vai ser assistido", explicou a médica, razão pela qual a equipa de Neonatologia e Obstetrícia decidiu transferi-la e ainda a uma outra grávida, uma vez que havia duas vagas de neonatologia no Hospital São Francisco Xavier.
"Não é uma situação de todo rara. As transferências acontecem em todos os hospitais", garantiu, assegurando que "não era de todo expectável", face à situação clínica em que a mulher saiu do hospital, que houvesse uma paragem cardiorrespiratória.
Os sintomas apontavam apenas para a possibilidade de uma pré-eclampsia, uma complicação grave da gravidez que se manifesta por uma tensão arterial elevada. "Numa pré-eclampsia não estamos à espera que isto aconteça. Não é previsível haver uma paragem cardiorrespiratória", explicou a diretora do serviço de Obstetrícia, que diz ainda que a equipa médica vai agora apurar o que aconteceu. "Vamos ter de procurar uma explicação, se é que a vamos encontrar, para conhecer este desfecho", informou.
A médica especialista diz que não sabe responder se o desfecho trágico poderia ter sido evitado se a grávida tivesse ficado no Santa Maria. "Se a situação teria sido diferente se tivesse ficado cá, provavelmente não. Fazer uma reanimação numa ambulância é diferente de a fazer no hospital, mas não estamos à espera que isto aconteça numa pré ambulância", esclareceu, acrescentando que na ambulância seguiam um médico interno da especialidade e duas enfermeiras.
A obstetra disse ainda que a equipa médica não conhecia o historial clínico da mulher, uma vez que esta estava a ser seguida na Índia e encontrava-se temporariamente em Portugal de férias com o marido. "Veio do estrangeiro alguns dias antes. Não sabemos a condição clínica basal desta grávida, não conhecemos o historial, não falava inglês nem português. Foi seguida no seu país, pode ter havido alguma informação importante que nos tenha escapado", reconheceu a médica. "Não sabíamos se a mãe tinha algum problema cardíaco, um historial de tensão arterial alta, alguma patologia", acrescentou. O diretor clínico, Luís Pinheiro, reforçou ainda que "o seguimento regular da gravidez, que foi feito fora do país, é determinante para o prognostico da própria gravidez".
André Graça, diretor de serviço de neonatologia, explicou que a transferência de grávidas nestas circunstâncias é recorrente e que nada fazia prever esta situação. "A cada duas semanas temos picos de internamentos que nos impedem de dar resposta a todas as situações que nos aparecem. Fazemos gestão quase diariamente. Somos, essencialmente, recetores de situações de alto risco. Os recursos não são ilimitados e não podemos tratar de doentes na ausência de vagas. Podemos dar exemplos de todas as semanas de grávidas que são transferidas e corre bem. Foi um acontecimento totalmente inesperado", esclareceu. O diretor de serviço frisou ainda que as transferências entre hospitais da rede "são a decisão clínica recomendada por todas as instituições internacionais em grávidas estabilizadas".
Luís Pinheiro garantiu que "havia uma situação clínica que foi estabilizada". "Após várias horas de vigilância era estável e permitiu que fosse transportada. Nada fazia apontar para este desfecho", frisou. Admitiu ainda que tem havido "mais transferências de grávidas de outros hospitais" e "um maior número de partos nas últimas semanas, mais 40% do que no período homólogo" no Hospital de Santa Maria. Quando questionado pelos jornalistas se o aumento da afluência de grávidas está relacionado com uma maior transferência de outros hospitais devido ao fecho de outras urgências de obstetrícia, o diretor clínico disse que não cabe à unidade hospitalar responder a esta questão.
Referindo-se a notícias divulgadas pela comunicação social sobre este caso disse ainda que a conferência de imprensa realizada esta manhã pretendeu "esclarecer aquilo que é claramente uma lacuna informativa do tratamento mediático que é dado a assuntos de saúde". "Estamos aqui hoje para falar e para dar nota sobre quais são as características que estão em volta deste caso do ponto de vista clínico para que se saia do registo de empolamento mediático que começou por ser feito".
De recordar que já na segunda-feira, o CHULN tinha referido, numa nota, que o transporte da grávida ocorreu "após normalização das tensões arteriais e franca melhoria respiratória", na presença de "um médico e enfermeiros".
Durante a deslocação, a mulher sofreu uma paragem cardiorrespiratória, tendo sido realizada a reanimação na viagem. No Hospital São Francisco Xavier "foi submetida a uma cesariana urgente", sendo que o recém-nascido foi para a unidade de cuidados intensivos neonatais "por prematuridade". A mãe, que ficou internada nos cuidados intensivos, acabaria por falecer. O bebé continua internado na neonatologia do Hospital São Francisco Xavier.