Há 48 horas fechado, Adriano já só quer sair do navio mas "os hospitais estão lotados"
Adriano Maranhão, 41 anos, canalizador no cruzeiro que está atracado num porto japonês desde o início de fevereiro e, até ao momento, o único português diagnosticado com o novo coronavírus, ainda não sabe quando é que vai receber tratamento.
Corpo do artigo
Já é noite no Japão, quando Adriano fala connosco. Ele sabe-o porque viu as horas, não tem outra forma de saber: "Não consigo ver o dia nem a noite". Infetado com o Covid-19, Adriano está há 48 horas numa cabine, onde ninguém entra e de onde ninguém sai. Não vê a hora de sair, mas ainda não sabe quando é que poderá. Como não tem sintomas - além do corpo cansado, que atribui ao stress criado pelo facto de ter sido contaminado por uma "doença nova" - o seu caso não é urgente. "A embaixada portuguesa em Tóquio disse-me esta manhã que os hospitais estão lotados e que devo sair daqui na segunda ou na terça-feira. Mas não foi certo. Parece-me que pode esticar mais um dia ou dois", conta ao JN.
O Diamond Princess é o maior foco fora da China. Cerca de 80% dos passageiros têm mais de 60 anos. Três já morreram
Mesmo face à falta de lugares nos hospitais de referência japoneses, a hipótese de Adriano vir ser tratado em Portugal estará fora de planos (os europeus que regressaram a casa em aviões fretados por países da União Europeus não estavam infetados). O JN contactou o ministério dos Negócios Estrangeiros para saber que diligências estão a ser feitas no sentido de retirar o português do navio o mais rápido possível, mas ainda não obteve resposta.
11852406
O "Diamond Princess", onde Adriano trabalha há cinco anos como canalizador, foi colocado sob quarentena pelo governo japonês a 5 de fevereiro. Na altura, acolhia cerca de 3700 pessoas, das quais mais de 600 terão sido infetadas. Desde quarta-feira passada, quando começaram a ser desembarcados os passageiros cujas análises de diagnóstico tinham dado negativo, já saíram 970. A bordo, estão ainda cerca de mil tripulantes, entre os quais Adriano e mais quatro portugueses, que a Direção-Geral da Saúde já confirmou não estarem infetados com o Covid-19, o que não garante que não venham a estar - levantaram-se questões sobre o rigor das medidas de proteção depois de 23 passageiros terem sido autorizados a sair sem serem devidamente analisados (um deles foi diagnosticado três dias depois).
O tripulante é um número aqui dentro
Foi precisamente a camaradagem portuguesa, com quem fala diariamente por Facebook, que safou Adriano quando se cansou de comer as bolachas que tinha na cabine. O colega e amigo Sérgio, com quem além da pátria divide também a terra da Nazaré, preparou-lhe um tabuleiro com comida. "A empresa só me deixou um tabuleiro à porta depois de eu ter falado ao Sr. Presidente da República, que falou com a embaixada sobre o problema da comida. Mais tarde, disseram-me que não me tinham vindo dar alimentos porque não tinham a informação de que eu estava em isolamento", relata, apontando falhas à forma como o surto está a ser gerido, sobretudo no que diz respeito à tripulação. "O tripulante é um número aqui dentro, não interessa se é bom ou mau, se for embora vem outro", aponta Adriano, que tem tentado contactar a norte-americana Princess Cruises, para obter respostas, mas ninguém atende e ninguém responde aos e-mails.
11852698