Um mês após o arranque do ano letivo, haverá milhares de alunos ainda sem aulas a pelo menos uma das disciplinas e um número "anormal" de professores que estão a recusar horários.
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"Mais de 500" entregaram declarações de risco, revelou o Ministério da Educação (ME), que invoca a pandemia para justificar as dificuldades nas colocações.
"Já tive uma professora que me respondeu que recusava o horário porque ganha mais no Continente e a continuar a viver em casa da mãe, no Norte, do que aceitar dar aulas em Setúbal", revela Pedro Tildes. Na Secundária do Bocage, que dirige, há 21 turmas que não têm todos os professores: cinco estão sem aulas a Matemática, quatro a História e dez a Filosofia, incluindo do 11.º que vão fazer exame.
Na Secundária D. Dinis, em Lisboa, faltam docentes de Inglês, Informática, Biologia e História em 28 turmas. É outro exemplo. Só nestas duas escolas, são mais de mil os alunos sem, pelo menos, um professor. O diretor José António Sousa já tem os candidatos selecionados para as ofertas de escola: "Se todos aceitarem, terei o problema resolvido terça-feira; senão, terei de voltar a lançar os horários a concurso". Este ano, as "recusas dispararam".
Ao JN, o ME explica que "ao número anormalmente alto de não aceitações de horários, atenta a situação de pandemia que leva os docentes a não quererem deslocar-se das suas áreas de residência". "Este problema tem piorado de ano para ano. Em 2013, tinha excesso de professores, agora tenho falta e se não os coloco todos em agosto fico muito preocupado", defende Pedro Tildes, apontando o preço do alojamento como a principal razão para as recusas antes e pós pandemia.
500 euros não dá para aluguer
"Um horário de dez ou 12 horas letivas equivale a um salário de 500 euros líquidos. Não dá para alugar um quarto em Lisboa, Setúbal ou Faro", frisa Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, explicando que face à escassez de professores, há quem "prefira esperar por um horário, que pode ser mais pequeno mas mais perto de casa".
Na sexta-feira, foram colocados mais 725 na reserva de recrutamento. Desde a contratação inicial em agosto, já são quase 22 mil. O número mais alto desde 2012 quando comparado com as contratações até dezembro.
527 horários vagos
Ainda assim, na quinta-feira, estavam por preencher 527 horários em ofertas de escola, a maioria (408) superiores a oito horas, o que significa que ficaram vagos nas reservas nacionais.
"Este é um problema que tem vindo a piorar. A culpa não é da pandemia. E, se nada for feito, só vai agudizar ainda mais mesmo depois da covid se ir embora", insiste Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores (ANDAEP). O cenário é preocupante: às aposentações, somam-se as declarações de risco, as recusas, as reservas de recrutamento "quase desertas", as baixas e os professores em isolamento.
Mobilidade
Doentes regressam ao Norte
Este ano também disparou o número de docentes em mobilidade por doença, assumiu o ME ao JN: são mais 1100 professores, num total de "mais de oito mil, com a grande maioria a deslocarem-se da Grande Lisboa para a região Norte".
Desde setembro, atualizou ainda o ME, foram apresentadas "mais de 500 declarações de risco" por professores, sendo que muitos devem regressar em breve às escolas por o prazo de 30 dias estar a terminar, diz a tutela.