A eletricidade vai aumentar já a partir deste mês. Um dado adicional que consolida Portugal como um dos países europeus com mais problemas para manter as casas quentes. Mas há pequenos truques que podem ajudar a evitar contas exageradas. Falta de condições em muitas casas faz com que haja muita gente a passar frio durante o inverno.
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Entre 1,9 e 3 milhões de portugueses vivem em situação de pobreza energética. Os dados constam da "Estratégia de Longo Prazo Para o Combate à Pobreza Energética 2021-2050", lançada pelo Governo em abril do ano passado e que tem como objetivo traçar metas para debelar o problema.
De acordo com o Índice Europeu de Pobreza Energética Doméstica, publicado pela União Europeia (UE) em 2019, Portugal é o quarto país mais pobre neste campo, apenas abaixo de Eslováquia, Hungria e Bulgária. Já o Eurostat reforçou, em 2020, que o país é o quinto membro da UE onde as pessoas têm menos condições económicas para manter as casas devidamente aquecidas.
A situação tende a agravar-se durante este ano de 2022 - sobretudo nos meios urbanos, onde há menos possibilidade de recorrer a métodos tradicionais como fornos a lenha - com a já anunciada subida dos preços da eletricidade, reflexo dos números recorde verificados nos últimos meses a nível internacional. No mercado ibérico, o megawatt-hora (Mwh) chegou a 21 de dezembro aos 339,84 euros, o valor mais alto alguma vez registado.
Pandemia, custo da energia e a tensão entre a Rússia e a Ucrânia
"Juntam-se a estes vários fatores, como a situação pandémica, os preços das matérias-primas e questões políticas, como a tensão entre a Rússia e a Ucrânia", explica o jurista João Fernandes, da DECO, associação de defesa do consumidor que lançou um gabinete de aconselhamento energético, onde as queixas chovem constantes. "A maioria das pessoas não tem noção dos consumos que faz mensalmente e de como pode poupar", sublinha.
A partir deste mês, o provável é que as surpresas desagradáveis aumentem. A EDP confirmou que em 2022 vai subir as tarifas 2,4%, enquanto a GALP prevê um aumento na ordem dos 2,7 euros para as potências contratadas mais representativas. Apenas a Endesa anunciou que não irá mexer nos preços. Já no mercado regulado, que representa apenas 5% do total, a variação prevista pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) chegará aos 0,2%.
Se tivermos um inverno rigoroso, as questões associadas à pobreza energética virão ao de cima
"Se tivermos um inverno rigoroso, as questões associadas à pobreza energética virão ao de cima", não duvida Francisco Ferreira, professor no Departamento de Ciências e Engenharia do Ambiente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa e presidente da Organização Não Governamental ZERO. "Há muitas pessoas que não conseguem conforto térmico devido à má qualidade de construção das casas, as quais não possuem os desejáveis cuidados de isolamento, e que são por isso obrigadas a recorrer a modos ativos de climatização, como radiadores a óleo", descreve.
Com a eletricidade a preços elevados e um inverno a pedir consumos extras, há pequenas estratégias que permitem aos consumidores evitar contas ainda mais altas do que o habitual. A começar pelo isolamento natural das casas. "Basta algo tão simples como calafetar as janelas, tapar todas as frestas que possam arrefecer a casa, deixar entrar luz solar, que é energia gratuita, e fechar completamente estores e cortinas para evitar entrar frio quando anoitece", aconselha João Fernandes.
Mas há outros pequenos truques. Desde logo no modo como são geridos equipamentos domésticos utilizados com frequência, aqueles que mais se refletem na fatura final da luz. "Há que adequar a potência do frigorífico e lembrar que consome menos energia quanto mais cheio estiver. No caso dos fornos de cozinha, por exemplo, o ideal é que sejam desligados dez minutos antes de a comida ser retirada", sugere o especialista.
Reabilitação de edifícios e promoção da eficiência energética
Deve ainda ser dada atenção a tudo o que são telemóveis ou computadores. E não deixar ligações à tomada sem necessidade, pois mesmo quando os carregadores não estão a ser utilizados sugam eletricidade, a chamada energia-fantasma. "Os consumos em standby representam 50 euros por ano", assinala João Fernandes.
Aquecedores e outros sistemas essenciais para permitir conforto térmico doméstico também devem ser olhados com cuidado. "Basta estarem sempre ligados a 25 cêntimos por hora de consumo que tal se reflete num custo brutal no final do mês", lembra Francisco Ferreira.
Na "Estratégia de Longo Prazo para o Combate à Pobreza Energética 2021-2050" assume-se a necessidade de tomar medidas concretas para resolver o problema, nomeadamente no que diz respeito à reabilitação dos edifícios ou à promoção da eficiência energética. Enquanto tal não acontece, Portugal mantém-se na cauda da tabela europeia com um longo caminho a percorrer