O mercado da cocaína está a crescer na União Europeia e os métodos de distribuição daquela droga são cada vez mais sofisticados.
Corpo do artigo
O Relatório Europeu sobre Drogas, apresentado esta manhã de quinta-feira, em Bruxelas, admite uma potencial "uberização" do comércio da cocaína.
Tanto o número de apreensões como as quantidades de cocaína apreendidas estão a atingir níveis recorde e o grau de pureza daquela droga nas ruas europeias atingiu o nível mais elevado de sempre em 2017.
Ao mesmo tempo, o modelo de tráfico está a mudar, com a entrada no mercado de traficantes, a nível individual ou grupos pequenos, que sustentam os seus negócios nas novas tecnologias.
Os autores do Relatório Europeu sobre Drogas 2019, realizado pelo Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, salientam que "há provas de que as redes sociais, os mercados da Internet obscura ("darknet") e as técnicas de encriptação desempenham um papel cada vez mais relevante na possibilidade de grupos mais pequenos e indivíduos se envolverem no tráfico de droga".
Analisando apenas o mercado da cocaína, o relatório assinala que há métodos de distribuição inovadores, facilitados pela utilização generalizada dos smartphones, e uma competitividade tal que os vendedores optam por oferecer serviços adicionais ao produto.
"Um exemplo é a existência de "call centers" de cocaína, que dispõem de estafetas que garantem entregas rápidas e flexíveis. Estes métodos - refletindo uma potencial "uberização" do comércio de cocaína - indiciam a existência de um mercado competitivo em que os vendedores concorrem através da oferta de serviços adicionais além do próprio produto", pode ler-se no relatório da agência europeia com sede em Lisboa.
Consumo de cocaína-crack cresce em Portugal
A cocaína é a droga estimulante ilícita mais usada na União Europeia, com 2,6 milhões de jovens adultos (15-34 anos) consumidores durante o último ano (estimativa de 2017).
Naturalmente, o aumento da disponibilidade de cocaína resulta em mais problemas de saúde. O observatório europeu estima que cerca de 73 mil utentes iniciaram tratamento da toxicodependência por problemas relacionados com o consumo de cocaína, um aumento de 37% entre 2014 e 2017.
E considera "particularmente preocupantes os 11 mil destes utentes que iniciaram tratamento por problemas relacionados com o consumo de cocaína-crack, uma forma particularmente prejudicial de consumo de cocaína".
Neste particular, Portugal aparece em destaque entre os países que registaram um aumento dos utentes que iniciaram tratamento pelo consumo de cocaína-crack desde 2014, juntamente com Reino Unido, Bélgica, Irlanda, França e Itália
Refira-se ainda que a cocaína foi a droga ilícita mais frequente nas entradas nas urgências hospitalares relacionadas com drogas e registadas por uma rede de 26 hospitais-sentinela em 18 países europeus (2017).
Milhões de consumidores
Estima-se que 96 milhões de adultos, o equivalente a 29% da população da União Europeia com idades entre os 15 e os 64 anos já tenham experimentado drogas ilícitas durante as suas vidas.
A Canábis é a droga mais experimentada, seguida de longe pela cocaína, pela MDMA (droga sintética consumida sob a forma de comprimidos, conhecidos como Ecstasy, ou sob a forma de pó ou cristais) e pelas anfetaminas.
No último ano, 19,1 milhões de jovens adultos (16%) com idades entre os 15 e os 34 anos terão consumido drogas, aponta o Relatório Europeu da Droga.
As preocupações com a canábis prendem-se com o aumento da potencia desta droga
O relatório cita um estudo recente que concluiu que o teor típico de tetrahidrocanabinol (THC), a substância psicoativa da canábis herbácea e da resina de canábis, duplicou durante a última década, suscitando preocupações quanto aos potenciais danos.
"No caso da resina, é provável que os factores que explicam este aumento da potência média incluam a introdução de plantas altamente potentes e de novas técnicas de produção em Marrocos, o principal produtor de resina para o mercado da União Europeia", destaca o documento.
Cresce preocupação com opiáceos sintéticos
Os novos opiáceos sintéticos, uma epidemia nos Estados Unidos e no Canadá, ainda representam uma pequena percentagem do mercado da droga na Europa, mas já "são uma preocupação crescente" até porque o seu consumo está associado a envenenamentos e mortes.
"Em 2018, foram detetados na Europa onze novos opiáceos sintéticos, normalmente sob a forma de pós, comprimidos e líquidos".
Os derivados do fentanilo - um potente analgésico que causou a morte do músico Prince em 2016 - constituem a maioria dos 49 novos opiáceos sintéticos monitorizados pelo Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência.
Em 2018, seis derivados do fentanilo foram detetados pela primeira vez na Europa, num total de 34 identificados desde 2009.