A três anos de ser obrigatória a legislação que proíbe o uso de animais selvagens em espetáculo, só 11 foram entregues ao Estado e enviados para o estrangeiro.
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A três anos de ter de ser efetivamente implementada, a lei que proíbe o uso de animais selvagens em espetáculos circenses já produziu efeitos. Atualmente, estão apenas 50 animais nas mãos de cinco circos que trabalham em Portugal. E apenas um - um tigre-branco - ainda está a ser usado. Embora só 11 animais tenham sido entregues ao Estado, os circos reinventaram-se. Procuraram outro tipo de atrações e sem perder espectadores, garante, por exemplo, aquele que foi o primeiro circo a abolir o uso de animais selvagens: o do Coliseu do Porto.
Em 2016, existiam 1132 animais nas mãos de 107 circos a trabalhar em Portugal, segundo dados da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária. Atualmente, são 50 pertencentes a cinco circos, dos quais 28 são cães e dois cavalos. Trata-se de uma diminuição de 95%. Mas apesar de ainda estarem registados animais como tigres, leões e elefantes, apenas um ainda é usado em espetáculos. Os restantes já não entram na arena circense por terem idade avançada.
lei foi aprovada em 2019
Isto graças à lei de 2019 que veio proibir o uso de animais selvagens em circos. A legislação, que entrou em vigor a 22 de agosto de 2019, tem, porém, uma moratória de seis anos, dando aos circos até 2025 a possibilidade de entregarem voluntariamente os seus animais ao Estado. Segundo informou ao JN o Ministério do Ambiente e Ação Climática, apenas 11 animais foram entregues: dois tigres, um leão, duas jiboias, três serpentes pitões e três aligátores. "Os animais em causa foram expedidos para Espanha e Alemanha", informa a tutela.
A lei proíbe apenas o uso de animais selvagens nos circos. Segundo o n.º 3 do artigo 7 da lei n.º 20/2019, de 22 de fevereiro, "é admitida a utilização de animais que não sejam considerados selvagens, nomeadamente os de companhia e de pecuária". Por isso, muitos circos começaram a apostar na utilização de cães ou cavalos nos seus espetáculos.
Outros, como o do Coliseu do Porto, aboliram totalmente o uso de animais ainda antes de a lei ser aplicada. E continua a ser assim.
No Porto, a 11 de dezembro de 2017, foi apresentada uma proposta de recomendação nesse sentido, pelas mãos do PAN e do movimento independente do autarca Rui Moreira. Um ano depois, a 12 de novembro de 2018, o presidente da Câmara respondia a uma interpelação da deputada do PAN Bebiana Cunha, com o anúncio de que, já nesse ano, o circo a atuar no queimódromo estava proibido de entrar com "qualquer tipo de animal" no espaço contíguo ao Parque da Cidade.
sem perda do brilho
Nesse ano, o Circo do Coliseu Porto Ageas "abdicou de contratar números contendo animais amestrados". "Como, em todas as formas de arte, não podemos deixar de evoluir e procurar alcançar valor e grandeza estética sem provocar sofrimento nem a pessoas nem a animais. Se há públicos saudosos de como era o circo há 30, 40 ou 50 anos, há também muitos satisfeitos pela nossa atitude vanguardista e alinhada com os valores do respeito pelo bem-estar animal", defende o Coliseu.
Tal como outros circos que lhe seguiram o exemplo, o do Coliseu apostou noutro tipo de atrações. "As demonstrações de destreza, habilidade, ilusão, risco, são ingredientes fundamentais do circo e que se conseguem veicular com outros números, sem que o espetáculo perca brilho e interesse", considera o Circo do Coliseu Porto Ageas.
Números
250
euros é a coima mínima que vai ser aplicada a quem, a partir de 2025, for apanhado a usar animais selvagens em circos. A máxima é de 3740 euros.
2330
Em 2016, além de 1132 animais selvagens, um total de 107 circos a trabalhar em Portugal detinham 2330 insetos, segundo a Direção-Geral de Veterinária.
Pormenores
Moratória de 6 anos
A lei n.o 20/2019, de 22 de fevereiro, determina o fim da utilização de animais selvagens em circo. Tinha, porém, uma moratória de seis anos para ser aplicada.
Quais os proibidos?
Lei proíbe o uso dos seguintes animais: macacos, elefantes, tigres, leões, ursos, focas, crocodilos, pinguins, hipopótamos, rinocerontes, serpentes e avestruzes.
Quem monitoriza?
O Governo ficou obrigado a criar um programa de entrega voluntária de animais e uma linha de incentivos financeiros à reconversão profissional dos domadores. A Direção-Geral de Alimentação e Veterinária é a entidade responsável pela gestão do Cadastro Nacional de Animais Utilizados em Circos .
"Há uma maior consciência das pessoas"
Laurentina Pedroso
Provedora do Animal
Em 2016, os circos detinham 1132 animais. Atualmente, são 50. E apenas um é usado em espetáculos. São os números positivos da legislação que, a partir de 2025, vai proibir o uso de animais selvagens nos circos?
São os números positivos de uma legislação que foi desenhada para desmotivar a utilização de animais selvagens neste tipo de espetáculos. E resulta também de uma maior consciência das pessoas sobre as matérias de bem-estar, deixando de apreciar o uso destas espécies selvagens, sendo inaceitável que o seu uso para entretenimento humano as fizessem passar por tal privação, uma das liberdades fundamentais: a de expressarem o seu comportamento natural, unicamente possível nos seus habitats naturais.
Apenas 11 animais foram entregues ao Estado. Como vê isso?
Preocupante, em termos de números, mas confiante de que o ICNF terá estas razões bem enquadradas nas suas competências reguladoras e fiscalizadoras, punindo situações que fujam ao previsto na lei.
A lei proíbe apenas o uso de animais selvagens. Por isso, os circos ainda usam outros animais, como cães ou cavalos. Acha que a legislação devia ser mais abrangente, proibindo o uso de qualquer tipo de animal?
Os animais das espécies considerado domésticas e os de espécies pecuárias têm as suas regras de bem- -estar contempladas na legislação. Sendo espécies de contacto direto com o homem, com o devido cumprimento das regras de saúde e de bem-estar, há uma maior garantia de que o seu uso para entretenimento não compromete a sua saúde e o seu bem-estar.