Novo presidente do Constitucional, crítico do "lóbi gay", defendeu no chumbo da gestação de substituição que conceção sem pai ou mãe é "absurda".
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O recém-empossado presidente do Tribunal Constitucional (TC), João Caupers, afirmou, em 2018, numa declaração de voto ao primeiro chumbo da gestação de substituição, que "resulta da Natureza da espécie humana que todos os filhos têm mãe e pai, evidência que a Constituição se limita a reconhecer e proclamar".
No documento, o juiz - que, na terça-feira, defendeu que um texto universitário de 2010 em que atacou o "chamado lóbi gay" era um "instrumento pedagógico" - apoiou a sua afirmação no número 1 do art.º68 da Constituição, que estabelece que "os pais e mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos".
"Certo é que, diga o direito o que disser, omita o que omitir, a conceção de uma criança sem pai é tão absurda como a de uma criança sem mãe. E se, como mero exercício especulativo, admitíssemos tal possibilidade, então colidiríamos de frente com a Lei Fundamental", sustentou Caupers. O artigo em causa não foi, contudo, invocado pelo TC para declarar a inconstitucionalidade de algumas normas da gestação de substituição, vulgarmente apelidada de barriga de aluguer.
O presidente do Constitucional salienta, de resto, que o seu voto contra o diploma "censura, para além das disposições explicitamente declaradas contrárias à Constituição, a gestação de substituição, em si mesma, enquanto conceito e enquanto técnica de procriação medicamente assistida".
Sob fogo 11 anos depois
Caupers, de 69 anos, é juiz do TC desde 2014, tendo assumido, no último dia 12, a presidência do tribunal. É ainda professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, em cujo jornal digital escreveu até março de 2014.
Ontem, ficou sob fogo depois de o "Diário de Notícias" ter citado um texto seu, de 17 de maio de 2010, onde esclareceu o seu "pensamento sobre a questão da homossexualidade" a propósito de uma crítica a um exame de outro professor que equiparou o casamento com animais domésticos a um "complemento à lei sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo", promulgado naquele dia.
No texto, Caupers defende que os homossexuais devem ser tratados "com dignidade e sem preconceito", mas distingue entre "tolerância para com as minorias" e "promoção das respetivas ideias". "Os homossexuais não são nenhuma vanguarda iluminada, nenhuma elite. Não estão destinados a crescer e expandir-se até os heterossexuais serem, eles próprios, uma minoria. E nas sociedades democráticas são as minorias que são toleradas pela maioria - não o contrário", escreveu.
Na terça-feira, Caupers alegou, ao JN, que o texto não reflete "necessariamente" o que pensa. Constituiria, em contrapartida, "um instrumento pedagógico, dirigido aos estudantes que, para melhor provocar o leitor, utilizava uma linguagem quase caricatural, usando e abusando de comparações mais ou menos absurdas".
Lei de identidade de género no TC deixa ILGA alerta
A ILGA Portugal - Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo partilhou a sua "profunda preocupação" com o texto publicado em 2010 por Caupers. "A consternação é redobrada [...] num ano em que se delibera sobre o pedido de apreciação da constitucionalidade das normas" da lei "que consagra o direito à autodeterminação da identidade de género". E exigiu um pedido de desculpa.
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