Com o fim do estado de alerta, trabalho suplementar não pode exceder 60% da remuneração base. Nos hospitais também há dúvidas, mas tutela garante pagamentos com decreto de 1979.
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Com o fim do estado de alerta no país, regressaram os limites ao trabalho suplementar no INEM. O que significa que quem ultrapassar 60% da remuneração base em horas extraordinárias não ganha pelo trabalho a mais. No mês passado, já houve ambulâncias paradas porque a tripulação tinha horas extra em excesso. Nos hospitais, com a publicação do novo Estatuto do SNS, sobram dúvidas sobre a legalidade dos pagamentos do trabalho extraordinário na urgência e os administradores reconhecem que é preciso clarificar a lei. O Ministério diz que não e invoca um decreto-lei do tempo de Ramalho Eanes, anterior à criação do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
No INEM, face à grave carência de técnicos de emergência pré-hospitalar, o recurso a horas extra é fundamental para assegurar o funcionamento do Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) e das ambulâncias. Os limites ao trabalho extraordinário deixaram de vigorar durante a pandemia, mas voltaram em outubro com o fim do estado de alerta e já se fizeram notar.
"Já se sentiu o impacto. No mês passado, pelo menos quatro ambulâncias SIV (suporte imediato de vida) pararam porque os técnicos já tinham excedido o limite de horas extra", afirmou o presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar. Rui Lázaro dá o exemplo das SIV porque são ambulâncias mais diferenciadas, que atuam em zonas com menos respostas, e que só param quando não há alternativa.
Ao JN, o INEM confirmou que está a respeitar o limite de 60% da remuneração base em horas extraordinárias, desde o fim do estado de alerta. Mas o Ministério da Saúde parece alheado desta realidade. Não sabe que o INEM deixou de fazer aqueles pagamentos e refere que a situação do instituto está acautelada na Lei do Orçamento do Estado de 2022. Porém, o artigo invocado (37.º, número 6) aplica-se "em situações excecionais e delimitadas no tempo, designadamente de calamidade pública, reconhecidas por resolução do Conselho de Ministros". O estado de alerta terminou a 30 de setembro.
Novo estatuto cria confusão
Nos hospitais, também há dúvidas sobre se os profissionais que fazem urgência podem ultrapassar os 60% da remuneração base em horas extra. A questão não tem a ver com o estado de alerta, mas com a publicação do novo Estatuto do SNS. O diploma revoga o anterior estatuto (1993) que estabelecia que o trabalho extraordinário ou suplementar no SNS não era sujeito a limites máximos quando estava em causa o funcionamento das urgências (ler ficha). O novo estatuto, publicado em agosto, é omisso sobre o tema.
A Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH) admite que o "enquadramento legal terá que ser aclarado", mas não acredita que desta eventual falha resultem menos recursos para as urgências. "Estamos certos de que os hospitais vão usar as horas extraordinárias que forem necessárias e estiverem disponíveis, no sentido de garantir o funcionamento dos serviços", respondeu, ao JN, Xavier Barreto.
O Ministério da Saúde recuperou um diploma de 1979 para justificar o pagamento de horas extra acima dos 60% da remuneração base. "Está em vigor o Decreto-Lei 62/79 de 30 de março, que admite que, em situações excecionais, possam ser ultrapassados os limites remuneratórios no regime legal geral", diz. O diploma em causa admite o pagamento acima de 33% da remuneração base, em casos excecionais e devidamente autorizados pela administrações distritais dos serviços de saúde dos respetivos distritos, estruturas que já não existem.
Inoperacionais
2222 horas paradas
As 43 ambulâncias de suporte imediato de vida (SIV) do INEM registaram uma taxa de inoperacionalidade de 0,59% em outubro, de acordo com o INEM. Tal corresponde a 2223 horas paradas (279 turnos de oito horas).
0,34% de taxa de inoperacionalidade
das SIV, em outubro, deveu-se a falta de tripulação. Corresponde a 1281 horas de inoperacionalidade, ou seja, 160 turnos em que os meios não estavam disponíveis por falta de pessoal.