A maior concentração verifica-se no distrito do Porto. Nos últimos cinco anos, 175 situações foram participadas ao Ministério Público.
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Desde 2018, foram encerrados 512 lares de idosos que se encontravam a funcionar de forma irregular em Portugal. O caso mais recente aconteceu esta semana em Loulé, com suspeitas de maus-tratos. A maior concentração dos casos detetados verificou-se no distrito do Porto, tendo sido reportados ao Ministério Público 175 situações. O setor social considera que muitos lares privados funcionam de forma ilegal devido a "excesso de zelo" e ao facto de o processo ser demasiado exigente e burocrático. Por isso, pedem mais "bom senso".
Segundo dados do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, de 2018 a 23 de setembro passado, foram encerrados um total de 512 lares. Mas o número de situações tem vindo a decrescer desde 2019, ano em que se verificou um maior número desse tipo de procedimento: 118. No ano passado, por exemplo, foram encerrados 98 lares por se encontrarem a funcionar de forma ilegal. Este ano, até 23 de setembro, foram fechados 76.
A maior parte das situações tem-se verificado no distrito do Porto, onde, desde 2018, já foram encerrados 94 lares de idosos: 21 em 2018; 20 em 2019; 19 em 2020; 21 em 2021 e 13 no corrente ano.
Crime de desobediência
"O encerramento dos lares (estruturas residenciais para idosos) pode ser motivado, nomeadamente, quando se verifica, em simultâneo, várias situações e sempre que esteja em causa um perigo potencial ou iminente para os direitos dos idosos e para a sua qualidade de vida", sublinha o ministério de Ana Mendes Godinho.
Entre os motivos que suscitam o encerramento encontra-se a inexistência de licença; a inadequação de instalações; deficientes acessibilidades; inexistência de medidas de proteção contra incêndios; condições precárias de higiene; falta grave de pessoal técnico e auxiliar; evidência de maus-tratos e inexistência de um plano de contingência covid-19.
Desde 2018, segundo o ministério, foram reportados ao Ministério Público 175 casos de lares, sobretudo situações de incumprimento da ordem de encerramento, o que incorre em crime de desobediência. O ministério não esclarece o desfecho destes casos.
"Há falta de respostas"
O setor social garante não ter situações de incumprimento. "Todos os nossos lares estão legalizados", dizem as Misericórdias e as IPSS. Mas pede-se "bom senso", considerando-se que muitos dos casos de funcionamento ilegal se devem a "excesso de zelo" e burocracias. "Às vezes, é um excesso de zelo das entidades públicas, outros são completamente inaceitáveis para funcionar", aponta Manuel Lemos, presidente da União das Misericórdias, pedindo simplificação dos procedimentos para os lares que são passíveis de serem legalizados porque não colocam em risco a segurança dos utentes.
"Isto só se resolve legalizando os que são legalizáveis e alargando a rede do setor social. Essas situações de lares ilegais acontecem porque há falta de respostas", diz Manuel Lemos, criticando casos que já viu de estruturas residenciais que não são legalizadas porque uma sala "tem menos dois centímetros". "Às vezes, há excesso de fundamentalismo do Estado. E isso não tem a ver com a falta de qualidade, mas com excesso de zelo que já não se usa", crê.
O padre Lino Maia concorda. "Todo o processo de legalização de um lar é demasiado burocrático e moroso. E isso leva ao surgimento de oportunistas e a que os idosos sejam atirados para situações confusas. Muitos lares deixariam de ser ilegais se o processo fosse mais ágil", crê o presidente da Confederação Nacional das IPSS.
Mais de seis mil crimes contra idosos em quatro anos
Desde 2018, foram instaurados pelo Ministério Público 6140 inquéritos por crimes contra idosos. O número tem vindo a aumentar todos os anos. Se, em 2018, foram instaurados 736 inquéritos, no ano seguinte, o número aumentou para 1597. Em 2020, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), foram abertos 1851 inquéritos. E no ano passado 1862. "Os crimes contra idosos (pessoas com mais de 65 anos) são uma realidade que merece particular atenção por parte do Ministério Público", garante a PGR, especificando que os inquéritos em causa envolvem crimes de maus-tratos, violência doméstica, burla e abuso de confiança.
Casos
Falta de requisitos
A 30 de setembro passado, foi encerrado um lar na aldeia de Geraldes, no concelho de Peniche, devido ao incumprimento de vários requisitos para o funcionamento. No lar viviam 35 idosos que foram redistribuídos por outros lares ou levados pelos familiares.
Sem licença e higiene
Em novembro do ano passado, a Segurança Social e a GNR encerraram um lar na localidade de Algeruz, concelho de Palmela, por falta de condições de higiene e segurança para os idosos, bem como de licença de funcionamento e contratos de trabalho dos funcionários. Tinha 45 utentes.