No ano passado realizaram-se menos 66 transplantes. Rim e fígado são os que mais diminuíram. Novos tratamentos reduzem procura, mas envelhecimento de dadores baixa recolhas.
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No ano passado realizaram-se em Portugal 289 transplantes, menos 66 do que em 2017. De acordo com os números do Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST), que serão hoje divulgados, os dados de 2018 invertem a tendência crescente que se verificava desde 2014 no número de órgãos transplantados. O rim e o fígado foram os órgãos que registaram maior quebra no total de transplantes (menos 27 em cada) e também aqueles que têm mais doentes a aguardar por um órgão compatível (1968 e 113, respetivamente). No final de dezembro estavam 2186 pessoas à espera de um transplante, menos 3% do que um ano antes.
Ana França, coordenadora nacional da transplantação, adiantou ao JN que esta redução no número de órgãos transplantados era "expectável". Por um lado, porque a média de idades dos dadores aumentou: passou de 53,8 anos em 2017 para 57,3 anos, em 2018, o que significa que "a grande maioria dos dadores tem mais de 70 anos". Este facto implica que é menor o número de órgãos que puderam ser aproveitados. Por outro, porque a população também está a diminuir. A média desceu de 34,01 dadores por milhão de habitantes para 33,6, de acordo com os números mais recentes da população portuguesa.
Mas não é só por causa da idade e do número dos dadores que os transplantes estão a descer. O sucesso dos tratamentos para a hepatite C e o aparecimento de um medicamento para tratar doentes com paramiloidose levou a que diminuísse a necessidade de transplantes de fígado.
Das melhores taxas na Europa
Os números não afastam, porém, Portugal do topo dos países com melhores resultados no que diz respeito à transplantação. Continua a ser o segundo país europeu com melhor taxa, a seguir a Espanha, e o terceiro se se tiver em conta os transplantes realizados com órgãos de dadores falecidos, atrás de Espanha e França.
A possibilidade de se obter órgãos em dadores com paragem cardiocirculatória veio aumentar o número de colheitas (28 em 2018). Porém, no entender de Ana França, é necessário que se reduza o período de observação do potencial dador após o óbito.
A legislação atual obriga a que se esperem dez minutos antes de se iniciar a colheita, o que inviabiliza a recolha de outros órgãos além dos rins e nem sempre. "A pessoa já esteve a fazer tentativas de reanimação mais de meia hora. É um risco muito grande estar a colher um órgão que pode não dar garantias de segurança", frisou.
Na generalidade dos países europeus, o tempo de espera para se poder tocar no cadáver é de cinco minutos. Apenas Portugal, Rússia e Itália obrigam a um período maior. "Antes de ser dador, nós já investimos tudo na recuperação do doente. Só quando é irrecuperável é que temos de passar a pensar nos outros que podem beneficiar daqueles órgãos", assegurou a especialista. E mesmo não sendo obrigatório, quando há colheitas, as famílias dos dadores são sempre informadas e as suas dúvidas esclarecidas.
Um fígado mau que pode ajudar a salvar uma vida
No ano passado realizaram-se 12 transplantes sequenciais. Trata-se da utilização de fígados retirados a doentes com paramiloidose, que precisam de um transplante para sobreviver. Os seus órgãos, se forem transplantados a pessoas com patologias - que teriam apenas três a seis meses de vida - podem permitir que sobrevivam mais cinco a 15 anos, embora haja a possibilidade de desenvolverem a paramiloidose.