Sistema de livre circulação no SNS em vigor desde 2016. Centro Hospitalar do Porto foi mais procurado em 2021.
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Mais de um milhão de utentes optaram por ser tratados em hospitais fora da sua área de residência nos últimos cinco anos, ao abrigo do Sistema de Livre Circulação e Acesso no Serviço Nacional de Saúde (SNS). A busca por tempos de espera menores, a "qualidade dos serviços percecionada" ou o facto de o hospital mais próximo de casa não possuir a especialidade que o doente necessita são os principais motivos. Entre os hospitais mais procurados, a medida é vista com bons olhos, mas alguns admitem pressão em algumas especialidades.
Implementado desde 2016, o sistema de livre escolha permite ao utente, em conjunto com o médico de família, decidir o hospital onde quer ser acompanhado. De acordo com dados cedidos pela Administração Central do Sistema de Saúde ao JN, entre 2016 e o final do ano passado, 1 081 096 pessoas optaram por sair da sua zona de residência para ter uma consulta ou receber cuidados hospitalares - 11,9% do total de utentes referenciados para consulta de especialidade a partir do centro de saúde.
Lisboa e Vale do Tejo é a região onde a procura por um hospital fora da área de referenciação pré-definida é mais alta. A opção representa 17% do total de referenciações. No que toca às unidades mais procuradas, em 2021, o Centro Hospitalar do Porto liderou o pódio. Seguiram-se os centros hospitalares de Lisboa Norte, de Lisboa Central e de S. João.
No Centro Hospitalar do Porto, que integra o Hospital de Santo António, um em cada quatro dos pedidos de consultas tem origem fora da área de referência. As solicitações chegam de todo o país. São mais de 160 mil consultas por ano. José Barros, diretor clínico, admite um impacto nas listas de espera, nomeadamente nas "especialidades de Oftalmologia, Ortopedia e Urologia".
"Penalização do mérito"
"Geram-se ciclos viciosos. A prontidão da resposta gera mais procura, mas este excesso de procura acaba por retardar a resposta. Os esforços de correção voltam a melhorar a resposta e acabam a induzir mais procura. É uma espécie de penalização do mérito, mas o importante é que os cidadãos tenham acesso aos cuidados", disse.
Também o Centro Hospitalar de Lisboa Central sente o impacto da procura "decorrente dos tempos de espera relativamente baixos para primeira consulta e da perda de capacidade em algumas especialidades em alguns hospitais".
"A livre escolha foi uma medida que teve alguns resultados positivos para os utentes, mas que tem que ser ajustada, nomeadamente no que respeita à limitação da livre escolha apenas entre hospitais com o mesmo nível de cuidados", sublinha fonte hospitalar.
No S. João, metade dos utentes inscritos para cirurgia nas especialidades de Oftalmologia, Ortopedia e Cirurgia Geral não pertencem à área de influência direta do hospital. A maioria tem entre 60 e 80 anos. O hospital atribui a procura ao "acesso mais fácil à intervenção cirúrgica, devido aos tempos mais curtos de resposta da instituição", bem como à "qualidade percecionada pelos utentes, que se traduz numa elevada confiança nos profissionais".
No Centro Hospitalar de Lisboa Norte, a maior parte dos doentes que vêm de fora têm mais de 54 anos. A procura tem "impacto significativo" nas listas de espera de sete especialidades, entre elas Neurocirurgia, Cirurgia Vascular, Reumatologia e Estomatologia.
Detalhes
Livre acesso em vigor desde 2016
O Livre Acesso e Circulação de Utentes no SNS foi aprovado em 2016 e permite ao utente escolher, em conjunto com o médico de família, qualquer um dos hospitais onde exista a consulta da especialidade de que necessita. A referenciação é efetuada de acordo com o interesse do utente, segundo critérios de proximidade geográfica e considerando os tempos médios de resposta.
Especialidades mais procuradas
De acordo com a ACSS, no ano passado, as especialidades mais procuradas pelos doentes em hospitais fora da sua área de residência foram Oftalmologia, Ortopedia, Dermatovenereologia, Cirurgia Geral e Neurocirurgia.
223 711
Foi o número de referenciações feitas, no ano passado, para hospitais fora da área de residência. O número aumentou entre 2016 e 2019, tendo caído em 2020 devido à pandemia.
507 981
Entre 2016 e 2021, os centros de saúde da região de Lisboa e Vale do Tejo referenciaram 507 981 utentes para unidades fora da área de residência. É a região com o valor mais alto.
26 089
Foi o número de utentes que, apesar de não pertencerem à área de influência direta do Centro Hospitalar do Porto, pediram para ser tratados na unidade ao longo do ano passado.