Mariana Mortágua traz às costas lutas "pelo direito a uma vida boa para todos"
No discurso da apresentação oficial da candidatura à liderança do Bloco de Esquerda, em que não esqueceu Catarina Martins, Mariana Mortágua sublinhou a justiça social como prioridade do partido, acusando Governo e Direita de permitirem e promoverem o "empobrecimento do país", enquanto estimulam o enriquecimento de uma "minoria de elite".
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A deputada bloquista Mariana Mortágua apresentou esta segunda-feira de manhã a candidatura à liderança do Bloco de Esquerda, entregando a moção "Uma força, muitas lutas", que encabeça e que leva à convenção nacional do partido, marcada para 27 e 28 de maio, de onde deverá sair como sucessora de Catarina Martins.
"Estou aqui para vos apresentar uma moção que mais de 1300 ativistas do Bloco de Esquerda vão levar à convenção do nosso partido e para vos dizer que, com a escolha desse coletivo, sou candidata à coordenação do Bloco de Esquerda", confirmou a economista, no início de uma conferência de imprensa na sede do partido, em Lisboa, onde assumiu o Bloco como uma "alternativa à escolha péssima entre o mau e o pior" focada em responder às necessidades das pessoas, ao mesmo tempo que encaixou críticas ao Governo e à Direita por privilegiarem os interesses dos grandes grupos económicos.
Num discurso marcado por que teve tanto de calmo e empático como de assertivo, Mariana Mortágua foi clara nas lutas que carrega às costas e que "dão significado à democracia": trabalho digno, habitação, clima, igualdade, saúde, educação e "direito a uma vida boa", por oposição à "boa vida" de quem "especula o futuro".
Lembrando a "importante perda eleitoral" que o BE reconheceu quando o PS conquistou a maioria, Mariana destacou duas certezas: o poder absoluto não cumpriu o prometido - "não há mais diálogo, não há mais estabilidade, as políticas de empobrecimento e de desigualdades agravam-se a cada dia que passa" - e o atual contexto confirma as razões do percurso bloquista - "hoje é com essas mesmas razões que crescemos ao lado da força das mobilizações que se levantam, de quem não se conforma com o empobrecimento e com a mentira".
As desigualdades não são um pauzinho na engrenagem, são um pedregulho que esmaga o futuro
Sobre a primeira certeza, Mariana acusou o PS de ter condenado o país ao "desrespeito pela Educação e pela Saúde, consumido por quem especula preços e corroído pela corrupção e pela facilidade milionária dos favores". "A maioria absoluta nunca foi outra coisa senão arrogância, intransigência e instabilidade. E não me refiro à roda livre de ministros que entram e saem do Governo, ao sabor do caso de cada dia. Falo da instabilidade de verdade: de quem precisa de uma casa e percebe que o salário não chega para a renda ou para a prestação ao banco. Da instabilidade de quem percorre o país de lés a lés todos os anos, para receber um salário de miséria como professor. Da instabilidade que é uma sociedade dividida entre uma maioria que perde salário a cada dia que passa e uma pequena minoria, uma elite, que lucra com a crise", afirmou, considerando que "as desigualdades não são um pauzinho na engrenagem, são um pedregulho que esmaga o futuro".
Mortágua acusou os socialistas de, perante um "PSD perdido e sem programa", alimentarem o "medo da extrema-direita", promovendo "um despique com o Chega", para garantirem uma "maioria absoluta perpétua". "Mostraremos ao país que a política do medo não pode vencer e que não basta pôr um espantalho à porta para poder governar contra as pessoas", atirou, reforçando que uma alternativa à esquerda que defenda o povo "com solidariedade e justiça" é a "resposta para os tempos difíceis em que vivemos" e a única capaz de "criar respostas para as pessoas que estão exasperadas com a inflação, com a decadência das coisas importantes da democracia, como a Educação, a Saúde e a Justiça".
A escolha não é entre a precariedade que o PS mantém e a precariedade que a Direita promove
"A escolha não é entre a crise da Habitação que o PS mantém e a crise da Habitação que a Direita promove. Entre a precariedade que o PS mantém e a precariedade que a Direita promove. Entre a degradação do SNS que o PS tolera e a privatização do SNS que a Direita promove", acrescentou a candidata, acusando o Executivo de António Costa de "não levar o país a sério" quando oferece apoios pontuais em vez de garantir salários, quando cria "um mar de benefícios fiscais em vez de combater o monopólio da especulação sobre as casas" e quando "se enreda na promiscuidade" com as grandes empresas, cujos lucros bateram todos os recordes num ano de "empobrecimento geral". "Quem quer levar o país a sério não deixa que estas fatalidades se virem sempre contra quem trabalha", assinalou.
E também "não aceita racismo, perseguições, politicas de discriminação que fragmentam o país", acrescentou, engrossando um já longo rol de críticas ao Governo e aos restantes partidos, que parece ter salpicado também o PCP: "Quem quer levar-se a sério não aceita guerras como a invasão da Ucrânia, não aceita ameaças nucleares, massacres ou crueldades que se banalizam nos nossos dias, como o cemitério em que se tornou o Mediterrâneo."
Trabalhamos e produzimos o suficiente para todas as pessoas poderem ter uma vida boa - essa aspiração radical de termos todas uma casa confortável, um trabalho com direitos, acesso a serviços públicos, tempo livre, criação cultural, respeito pelas escolhas pessoais por cada uma e cada um.
Sublinhando, com ironia pelo meio, "a aspiração radical" que é o direito a ter direitos, desde o trabalho e a habitação até à cultura e à identidade de cada ser humano, Mariana Mortágua concluiu com um aviso "a quem tem ganhado com a crise". "Não estamos aqui para vos agradar ou para vos dar sossego. O compromisso do Bloco é com quem trabalha, não é com quem se recusa a aumentar salários para fazer crescer os lucros milionários. Queremos um país justo, um país com respeito por todas as pessoas, sem exceção", rematou Mortágua, que não esqueceu a "marca de Catarina Martins" no "percurso de consistência" e no "impulso renovado" do Bloco, sublinhando que a ainda líder "abriu novos caminhos", "criou confiança popular" e foi "a melhor porta-voz em tempos tumultuosos".
Deputada "estrela" das comissões de inquérito
A deputada de 36 anos, que conta com o apoio expresso das principais figuras do Bloco, ocupa um lugar no Parlamento desde 2013, quando entrou em substituição de Ana Drago. É, desde então, uma figura-chave das comissões parlamentares de inquérito à banca e das discussões do Orçamento do Estado, tendo sido descrita pela revista "Bloomberg", em 2015, como "estrela portuguesa" pelo papel desempenhado na comissão de inquérito à gestão do BES.
Segunda moção apresentada à tarde
Para esta segunda-feira - que é a data limite para as moções de orientação serem entregues à comissão organizadora da convenção - está marcada também nova conferência de imprensa na sede do BE, para a apresentação de uma outra moção. Intitulado "Um Bloco plural para uma Alternativa de Esquerda - um desafio que podemos vencer!", o documento é subscrito por nomes como o histórico da União Democrática Popular Mário Tomé, o antigo deputado Carlos Matias ou Rui Cortes, do movimento Convergência.