Doenças de risco dão direito ao teletrabalho, mas escola arrancará em presença. Pedido "esclarecimento urgente".
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Daqui a pouco mais de duas semanas, milhares de professores e funcionários, com doenças de risco, poderão exigir o teletrabalho ou, em alternativa, faltar de forma justificada, durante um mês, com salário por inteiro. Os diretores de escola já estão a receber declarações médicas e, sem saber como atuar, exigem ao Ministério da Educação "esclarecimento urgente".
Os presidentes das duas associações de diretores - Manuel Pereira (ANDE) e Filinto Lima (ANDAEP) - estão a receber pedidos de ajuda de escolas, mas não têm informação para lhes dar. "Já questionei o ministério, mas não tive resposta", diz Manuel Pereira.
A Fenprof assegura que 12 mil professores pertencem a um grupo de risco: são hipertensos, diabéticos, oncológicos ou portadores de doenças cardiovasculares, respiratórias crónicas ou de insuficiência renal. Ainda que nem todos queiram o teletrabalho "podemos estar a falar de milhares de pessoas", diz Filinto Lima.
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Falta de clareza
A questão, lembrou ontem o "Negócios", tem raiz no decreto-lei que permite a qualquer trabalhador de um grupo de risco justificar faltas ao trabalho, se as suas funções forem incompatíveis com teletrabalho.
No caso dos professores, o próprio Governo entende que a função é compatível com o teletrabalho. Mas não é essa a mensagem que está a ser passada.
O Ministério da Educação tem dito que o ano letivo deve começar com professores e alunos dentro das salas de aula e, numa reunião com diretores, o secretário de Estado da Educação, João Costa, terá dito que os docentes que não queiram dar aulas presenciais terão que meter baixa médica.
Nas escolas, o trabalho está a ser organizado para começar o ano letivo em presença. "A lei é clara, mas o ministério não é e já há professores e funcionários a apresentar declarações médicas", lamenta Manuel Pereira. "Vamos ter uma grande percentagem de professores a não vir trabalhar em setembro", assegura.
Alunos sem professores
Não é viável ter um professor a ensinar a partir de casa, enquanto os alunos estão na sala de aula, entende Manuel Pereira. Filinto Lima discorda: "Na sala, pode estar alguém a coadjuvar, nem precisa de ser um professor da mesma área".
Os professores, acrescenta Filinto Lima, foram elogiados pelo trabalho feito, via Internet, no final do ano passado. "Se os elogiaram na altura, não fazem o mesmo agora?" E soma: "Se tivermos que voltar a um regime à distância, a função passará a ser compatível com o teletrabalho? Reina a confusão!".
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Se os professores exigirem o teletrabalho ou faltarem de forma justificada, haverá turmas sem docente no início do ano. As substituições são semanais e Manuel Pereira assegura que, em duas semanas, o novo professor está colocado. Mas disciplinas (como Geografia) e regiões (como Lisboa) já têm muitas dificuldades de recrutamento, em circunstâncias normais.
JN questionou o Ministério da Educação, mas não teve resposta.
Docentes abrangidos
A lei é clara, diz Monteiro Fernandes, professor de Direito do Trabalho: quem tiver as doenças previstas na lei pode exigir o teletrabalho; e pode faltar ao trabalho, de forma justificada, se a função não o permitir.
Ensino à distância
Para Monteiro Fernandes, a prova de que o Governo entende que a docência é compatível com o teletrabalho é a Resolução do Conselho de Ministros n.º 53-D, que inclui o regime misto e o não presencial como parte do processo de ensino e aprendizagem.
Imbróglio normativo
O Governo tem legislado sobre matérias da competência exclusiva do Parlamento e usado resoluções de Conselho de Ministros, "que não se impõem em tribunal", para regular matérias fundamentais. "Tem havido muita tolerância", diz.