Com faculdades fechadas e festas universitárias canceladas ou adiadas, comerciantes temem ficar com o ano hipotecado.
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António Oliveira não esconde a preocupação. Vende trajes e acessórios académicos há mais de duas décadas e está de portas fechadas na altura de maior faturação. Com as faculdades encerradas e as festas estudantis canceladas, a loja está deserta. N" "A Praxe", perto do Hospital de S. João, no Porto, não há filas de caloiros para comprar a capa, nem finalistas à procura da cartola. Em Gaia, na fábrica de produção de insígnias académicas, também não há funcionários. Só António Oliveira toma conta do serviço na esperança de que, findo o período de isolamento social, consiga escoar os artigos.
"É um negócio sazonal. Trabalhamos o ano inteiro para vender em dois meses e estamos fechados sem entrar um euro na caixa. Se não houver reabertura das faculdades, está um ano de serviço hipotecado", alertou o comerciante, de 56 anos, admitindo que 90% da faturação é ganha em abril.
Na Rua de Fernandes Tomás, no Porto, "A Toga" também está às escuras. A marca tem lojas espalhadas por sete cidades e fábricas em Coimbra e Castelo Branco. Em tempo de pandemia, a laboração é assegurada apenas por três funcionários. E agora, confecionam, sobretudo, pijamas cirúrgicos e batas médicas. Com o negócio em suspenso, os restantes trabalhadores estão em lay-off. "Fomos afetados pela pandemia exatamente na altura em que recebemos algum oxigénio para o resto do ano", lamentou Carlos Alves, filho dos fundadores da marca. As vendas futuras, crê o médico-dentista, dependem do "poder de compra da população" e da "concretização das festas académicas".
Já Miguel Pereira, dono da "Capas Negras", recusa pintar o cenário de negro. "Não vamos ter um ano perdido, mas atípico. Vamos vender trajes em meses em que não se vendia nenhum", defendeu. Até porque, antes da chegada do novo coronavírus, vendeu 850 trajes, aumento de 10% face ao período homólogo do ano passado.
Com as lojas fechadas, a venda online não resolve. "É difícil acertar nos tamanhos. Sendo um modelo clássico, os números são diferentes dos que se usam nas roupas", explicou Miguel Pereira. Carlos Alves completa: "É um momento em que os avós, pais ou padrinhos querem ir com os estudantes à loja".
Na expectativa
Beatriz Domanoski espera por esse momento. É caloira na Faculdade de Letras do Porto e regressou aos Açores, onde vive, para estar em isolamento. Chegou a comparar preços, mas ainda não concretizou a compra. "Estava à espera da serenata, do meu primeiro cortejo e da minha Queima. Fiquei um bocado triste quando soube que tinha sido cancelada, mas percebo, é por um bem maior. Temos de fazer a nossa parte, ficar em casa", disse a jovem de 20 anos.
Para André Tomé é o ano da despedida. Ainda não encomendou o kit de finalista, mas quer honrar a tradição. "A prioridade é que a pandemia passe e que todos possam estar em segurança. Depois, os órgãos [estudantis] vão pensar em nós, finalistas e caloiros, para tentar minimizar um pouco o prejuízo que tivemos com esta situação", disse o finalista de Osteopatia.