Dormem no chão, são mais vulneráveis a problemas de saúde e foram um grupo prioritário na vacinação. No entanto, as autoridades nacionais não sabem quantos sem-abrigo foram vacinados contra a covid-19. Isto apesar de vários grupos de voluntários, câmaras municipais e profissionais de saúde terem multiplicado esforços para fazer chegar a mensagem às ruas.
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O JN questionou as 20 câmaras municipais com maior número de cidadãos sem teto, mais as restantes capitais de distrito, e concluiu que pelo menos 37% dos sem-abrigo destes concelhos foram vacinados. Ou seja, 2502 pessoas, entre as 6784 que foram identificadas, a 30 de dezembro de 2020, no último inquérito feito a esta população.
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Os 22 núcleos de planeamento e intervenção sem-abrigo (NPISA) trabalharam em coordenação com as câmaras. Nestes casos, o número de pessoas vacinadas foi contabilizado e enviado para a coordenação da Estratégia Nacional para a Integração de Pessoas em situação de Sem-Abrigo, tutelada pelo Ministério da Segurança Social. No entanto, ninguém sabe se a estratégia resultou nos restantes 286 municípios.
Questionado pelo JN, o Ministério da Segurança Social remeteu a contabilização para o Ministério da Saúde. Por sua vez, o gabinete de Marta Temido respondeu que, graças às equipas locais dos NPISA e à Task-Force da Vacinação, "foi possível vacinar a população sem-abrigo" e já "com a dose de reforço, à medida que ficavam elegíveis, de acordo com o critério etário". Porém, o mesmo gabinete não tem dados que revelem a percentagem de sem-abrigo vacinados.
Câmaras registaram
Em sentido inverso, várias câmaras municipais foram sensíveis nesta matéria e mantêm registo do número de sem-abrigo vacinados. O concelho que mais sem-abrigo tem e vacinou foi Lisboa. Segundo o Município, "foram administradas mais de duas mil vacinas" ao abrigo de um plano municipal específico destinado a todos os que passaram pelas respostas de acolhimento temporário da cidade.
"Estamos também a aguardar indicações da Administração Regional de Saúde no sentido de iniciarmos uma campanha de vacinação destinada, exclusivamente, às pessoas que estão na rua, sem teto, através da administração de vacinas com recurso às equipas técnicas que integram as unidades móveis de consumo assistido", acrescenta a autarquia lisboeta.
não basta esperá-los
A população de sem-abrigo encontra-se "exposta a situações de vulnerabilidade particular" e está "mais suscetível à existência de problemas de saúde e maior risco de contágio, associados a uma maior dificuldade na realização da higiene", admite Carlota Borges, vereadora de Ação Social da Câmara de Viana do Castelo.
Em alguns casos, o isolamento, as dependências e os problemas de saúde mental toldam-lhes o discernimento e a vontade de se deslocarem aos centros de vacinação. Nuno Jardim, diretor do Centro de Apoio ao Sem-Abrigo (CASA), avisa que "é complicado" chegar a esta população e "não basta" esperar por eles. É preciso um trabalho de rua e, depois disso, também "passa pela vontade da pessoa".
Assim, as estratégias locais de vacinação dos sem-abrigo também passaram pelas instituições e grupos de voluntários de rua. Susana Veiga, assistente social da Legião da Boa Vontade, revela que "foi dada orientação para o cumprimento da vacina, com indicação dos locais, horários e vantagens da vacinação".
Pormenores
Dão máscaras - Várias instituições, como a Legião da Boa Vontade, entregam regularmente sabonetes, champô, escova e pasta de dentes, máscaras cirúrgicas, comunitárias e embalagens de álcool-gel aos sem-abrigo.
Mais vacinados - Os concelhos com estratégia municipal que contabilizaram mais sem-abrigo vacinados foram Lisboa (cerca de 2000), Coimbra (110), Braga (87), Sintra (70) e Vila Nova de Gaia (40). No Porto, não existe uma estratégia municipal e o processo esteve a cargo do Governo.
Dose única - A norma da DGS para os sem-abrigo refere que as ARS e USF devem vacinar nos "locais e instituições onde estas pessoas se concentram", privilegiando o esquema vacinal de uma dose".
8209 pessoas em situação de sem-abrigo
O último inquérito realizado pela Estratégia Nacional para a Integração de Pessoas em Situação de Sem-Abrigo já tem um ano e três meses. Identificou, na altura, 8209 pessoas nesta situação em Portugal.
590 sem-abrigo na cidade do Porto em 2020
O mesmo inquérito identificou 590 sem-abrigo no Porto, o que coloca a Invicta no segundo lugar em termos nacionais, logo a seguir a Lisboa, que tem 3780. Os dados são de 2020.