No Porto, chegam três novas solicitações por dia. Isabel Jonet alerta que subida dos preços das matérias-primas e energia vai ter impacto nas instituições.
Corpo do artigo
A nova prestação social anunciada pelo Governo - e cujos moldes poderão ser afinados hoje em Conselho de Ministros - é considerada "bem-vinda" pelas organizações humanitárias que prestam auxílio com bens de primeira necessidade, embora ainda desconheçam os detalhes. As organizações estão preocupadas com a nova vaga de solicitações que algumas já sentem e outras temem ter no futuro mais imediato. Também com a chegada de refugiados da Ucrânia.
Banco Alimentar (BA), Legião da Boa Vontade, Cáritas e Cruz Vermelha estão em alerta face aos efeitos na vida das famílias da subida de preços em resultado da guerra e que somam à pandemia que fez disparar os pedidos de ajuda nos últimos dois anos.
"Se a nova prestação social for realmente para ajudar a nível alimentar é sempre bem-vinda, porque o que afeta as famílias é não terem muitas vezes para comprar alimentação e isso vai agravar", afirma Eduarda Pereira, responsável de comunicação da Legião da Boa Vontade, que entrega frescos e mercearia a 320 agregados familiares por mês em Lisboa, Coimbra e Porto, sendo que nesta última recebem ajuda cerca de 200.
"No Porto, estamos a receber três novos pedidos de ajuda por dia. Neste momento, ainda estamos com capacidade de resposta, mas não sabemos como vai ficar com os novos pedidos que estamos a receber", indica Eduarda Pereira, referindo que, antes da pandemia, aquela organização prestava auxílio a cerca de duas centenas de famílias. Na pandemia, registaram um aumento, também entre "famílias da classe média, em que os rendimentos baixaram porque um dos elementos perdeu o emprego". "Com a situação na Ucrânia, estamos à espera de mais".
Isabel Jonet, presidente do Banco Alimentar Contra a Fome, prefere esperar para comentar o novo apoio social. "Se derem dez tostões a cada pessoa não serve para nada", disse, considerando, contudo, que "todas as medidas são muito positivas, porque o acréscimo dos preços dos bens mais básicos impacta sobretudo as famílias com menores rendimentos". Atualmente, o BA mantém a capacidade de resposta, com base nas angariações da sua rede de emergência alimentar, e "não há retração nas doações".
Contudo antevê dificuldades. "Conseguimos gerir os stocks dos produtos angariados. Agora, o meu problema, a minha maior dúvida e a inquietação, é que o acréscimo dos preços das matérias-primas, do combustível e da energia, vai-se refletir não só nas famílias, mas também nas instituições que as apoiam". "Os pedidos de ajuda de famílias e instituições vão aumentar".
Apelo às ajudas
Ana Jorge, presidente da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP) diz que "todas as prestações sociais são bem-vindas", e considera positivo o objetivo de "garantir pelo menos alimentação às famílias". "Só que estas famílias necessitam, muitas vezes, de outros apoios e temos depois de organizar recursos para colmatar aquilo que não possa ser dado através dessa medida governamental", afirma. "Para já, temos dado resposta e estamos a tentar organizar-nos para sermos mais eficientes".
A CVP presta atualmente apoio com bens de primeira necessidade a 70 105 mil famílias, quando em 2019 eram 47 350. Face à nova realidade, e tendo em conta a chegada de refugiados, Ana Jorge apela ao apoio dos portugueses.
Recentemente, a presidente da Cáritas, Rita Valadas, declarou ao JN que as ajudas de sobrevivência alastraram à classe média/alta, atingindo até quem antes apoiava a instituição com doações.