O Parlamento aprovou esta sexta-feira, na generalidade, a proposta do Governo para os crimes de abuso sexual de menores prescreverem apenas quando as vítimas completam 25 anos. Nos crimes mais graves, o prazo pode chegar até aos 33, além do proposto pela comissão independente, apontou a ministra da Justiça.
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A proposta de lei do Governo para a prescrição dos crimes de abusos de menores só começa a contar a partir do dia em que a vítima atinge a maioridade, os 18 anos, e não termina antes dos 25 anos recebeu os votos a favor do PS, PSD, Chega, PAN e Livre. Já a Iniciativa Liberal (IL), o PCP e o Bloco de Esquerda (BE) abstiveram-se. Sem votos contra, o diploma será discutido em especialidade.
O diploma transpõe uma directiva europeia relativa ao combate ao abuso sexual, à exploração sexual de crianças e à pornografia infantil e estabelece o prazo para a vítima denunciar o crime aos 25 anos, mas pode alargar a obediência à gravidade do crime. Atualmente, o prazo previsto no Código Penal termina quando a vítima completa 23 anos. A ministra da Justiça destacou que "a experiência recente" - com os casos de abusos sexuais na Igreja - demonstrou que as vítimas precisam de mais tempo para se sentirem capazes de denunciar esses crimes.
Máximo aos 33 anos
Catarina Sarmento e Castro explicou que a proposta foi pensada para cumprir várias obrigações internacionais e, ao passar a contar o momento para fins de prescrição só a partir dos 18 anos, "propõe-se na prática que os crimes prescrevem apenas aos 33 anos" nos casos mais graves pelo que a extensão fica "além" da que foi proposta até aos 30 anos da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa.
Para compreender melhor esta realidade em Portugal, a ministra da Justiça anunciou que o Instituto Nacional de Estatística (INE) está a desenvolver dois estudos sobre crimes sexuais, um em colaboração com o Eurostat, e outro com a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens. Catarina Sarmento e Castro lembrou ainda que o Governo estar a desenvolver uma Estratégia Nacional de Proteção para as Vítimas de Crime.
Os vários deputados mostraram estar de acordo que este período para as vítimas apresentarem queixa, embora não afastassem a possibilidade da proposta ser melhorada em especialidade.
Da bancada liberal, Patrícia Gil Vaz saudou a iniciativa socialista, mas criticou que o Governo tenha decidido incluir na mesma proposta alterações às penas de crime por discriminação e incitação ao ódio, mencionando as reservadas partilhadas pela Ordem dos Advogados.
Joana Mortágua do BE defendeu que permitir à vítima que possa "demorar o seu tempo é imperativo de justiça", mas questionou se fazer depender esse prazo da gravidade dos crimes não será uma escolha complexa. O partido tem defendido um prazo até aos 30 anos. A deputada bloquista mostrou "perplexidade" por o Governo ter feito desta proposta "uma amalgama incompreensível" de outras matérias.
Pela bancada do Chega, a Rita Matias defendeu que o facto de o Governo estar só agora a transpôr uma diretiva de 2011 mostra que o assunto em discussão "não tem sido uma prioridade". A deputada considerou que a alteração de dois anos do prazo de prescrição "não vale de quase nada" às vítimas se os abusadores continuam a ver as suas penas por estes crimes a serem suspensas.
Cláudia Santos do PS salientou que esta solução "é mista" entre as que já tinham sido sugeridas pelo BE e o PAN e que garante uma "proteção mais eficiente das vítimas".
A deputada do PCP Alma Rivera reconheceu que a proposta é "importante porque, muitas vezes, só quando são mais velhas é que as vítimas conseguem denunciar estes casos". Ainda que a bancada comunista esteja de acordo com o prolongamento, a deputada alertou que "quanto mais tempo decorre sobre o crime mais dificil é fazer prova do mesmo".
Pelo PSD, a deputada Cristiana Ferreira questionou o
o porquê do Governo ter feito um pedido para votar o diploma com prioridade e urgência numa altura em que está a decorrer um grupo de trabalho sobre a matéria. A deputada social-democrata defendeu, por isso, ser necessária uma "análise mais maturada" em sede de especialidade. "Não queremos precipitações nesta matéria", resumiu.
Sobre esta matéria, o PAN e o Livre apresentaram, respetivamente, um projeto de lei para alterar o conceito do crime de pornografia de menores de forma a que deixe de passar "a ideia de consentimento" e outro com vista à criação de um Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência Sexual e Promoção da Segurança digital e presencial de Crianças e Jovens. Inês Sousa Real apresentou também um projeto de resolução que recomenda a elaboração de um relatório da execução das medidas relativas ao combate ao casamento infantil. Os três projetos foram rejeitados.