Quer “condicionar” o PS e espera colher os frutos do fim da maioria absoluta. A estratégia da CDU parece lógica: se, em 2022, muitos eleitores foram “iludidos” pelo PS, agora há que reconquistá-los. O problema é que as sondagens não são animadoras. Paulo Raimundo admite-o, mas crê que reforçará o número de deputados.
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Em entrevista ao JN, o comunista elege os salários e a habitação como prioritários e acusa a Direita de defender as valorização dos rendimentos pela via do corte de impostos - e não do reforço salarial - por ter o objetivo de diminuir o IRC das grandes empresas. Quer trazer a saída do euro para discussão e diz que o "massacre" na Palestina desmascarou os que, de forma "cínica", criticaram o PCP devido à Ucrânia.
Em 2021, a Esquerda chumbou o Orçamento do Estado (OE). Entretanto, o PS teve uma maioria absoluta e a Direita cresce. Arrepende-se do chumbo?
Não nos arrependemos nada. Quando tivemos de dizer sim, em 2015, para afastar PSD e CDS do Governo, dissemos sim; quando tivemos de dizer não a esse OE, dissemos não. Fizemo-lo porque ele não resolvia nenhum problema, nomeadamente em três questões essenciais: salários, saúde e habitação. Os dois anos de maioria absoluta comprovaram que oOE não só não respondia como agravou os problemas. Não podíamos acompanhá-lo.
Está disponível para reeditar a geringonça?
O que se passou em 2015 é irrepetível nesta altura, até porque os pressupostos e as realidades são completamente diferentes. O que nos moveu em 2015 foi afastar o PSD e o CDS do Governo. Era o Governo daqueles tempos sinistros da Troika e era preciso acabar com aquele projeto. Aquilo que o permitiu foi uma correlação de forças, na Assembleia da República, que obrigou o PS a fazer coisas que nunca faria por sua vontade própria. E é por isso que dizemos que aquilo que vai condicionar as eleições do dia 10 de março não é o resultado do PS; o que vai condicionar os caminhos futuros é o resultado que o PCP e o CDU tiverem.
Como se demonstrou em todos os momentos da nossa história – e, talvez, de forma mais particular e mais visível em 2015 -, foi a força que nós tivemos que condicionou o PS a ir num caminho e a tomar medidas que, por sua vontade nunca tomava. E, para quem dúvidas tivesse sobre essa questão, estes dois últimos anos de maioria absoluta demonstram bem a vontade de fundo do PS. Não é dali que vêm as soluções para o país.
A CDU aceitaria integrar um Governo do PS? E há algum ministério que gostasse de ver nas mãos do PCP?
A questão é: um Governo para quê? Para seguir o caminho dos últimos dois anos, não contem com a CDU. Do que precisamos é de uma política que resolva os problemas do SNS, que aumente os salários de forma significativa – e é agora que faz falta –, que enfrente o drama da habitação. Não foi possível alterar a Lei Cristas, que empurra milhares de pessoas para os despejos. Queremos um Governo que continue este caminho? Connosco, não. Mas nunca faltaremos a nada que seja positivo, e é a nossa força que vai condicionar o caminho do país e as opções do PS.
A CDU perdeu 200 mil votos desde 2015. Admite que, com a geringonça, muita gente possa ter deixado de ver motivos para votar CDU, passando a preferir o PS? E arrepende-se de ter integrado a geringonça?
Não, não nos arrependemos nada. Aliás, não temos nenhuma razão para nos arrependermos da abertura para a criação de creches gratuitas, da diminuição brutal do custo dos transportes - em particular do passe, que é uma questão decisiva -, dos manuais gratuitos, do aumento extraordinário de reformas – ainda que limitado –, do fim do Pagamento Especial por Conta para as PME... Se não fosse a nossa força, nada disto tinha ido para a frente.
Mas quem colheu os louros foi o PS.
É um facto. Aliás, basta ouvir um dos últimos discursos de António Costa: quando faz um balanço da sua governação, os aspetos que sublinha são esses, que só foram possíveis pela pressão que fizemos. Essa é uma narrativa que o PS agarrou bem. Aliás, tanto agarrou bem que arrastou e iludiu uma série de gente que, em 2022, foi levada a votar PS, confiante no tal “Orçamento mais à Esquerda de sempre”. Muitos deles não queriam a maioria absoluta e já se aperceberam que o caminho não é dar mais força ao PS, mas sim à CDU. Quanto mais força tiver o PS, mais à Direita o PS governa.
Ficou preocupado ao ver Pedro Nuno Santos, no debate com Luís Montenegro, a dizer que estará disponível para deixar passar um Governo minoritário da AD? Ou acha que a Esquerda deve fazê-lo para evitar que o Chega vá para o poder?
Acho que essa é uma falsa questão. Temos andado a perder demasiado tempo em pôr o Chega no centro do debate. A questão não é essa. A questão é se cada um de nós acha ou não que o caminho deve ser dar força a um Governo da Direita. Se tivermos em conta que, nessa altura, grande parte daqueles que hoje são dirigentes e ativistas do Chega e também da IL, estavam lá ou apoiavam o Governo da Troika e aplaudiram o corte de pensões, de salários, do subsídio de Natal, aplaudiram o maior aumento de impostos de que há memória, aplaudiram aquele empurrar para fora do país de milhares e milhares de jovens… Se tivermos em conta isso, acho que nenhum de nós poderia admitir a possibilidade, sequer, de criar as condições para que algum Governo com esses protagonistas pudesse assumir funções nos próximos tempos.
Já disse que quer melhorar o resultado da CDU. Não o conseguir será uma derrota?
Se não acontecer, naturalmente que não corresponde aos nossos objetivos. Mas, acima de tudo, será uma derrota para o nosso povo e para os trabalhadores. Não temos uma meta, o objetivo é aumentar. Achamos que o vamos fazer, apesar de as sondagens dizerem o contrário. Mas eu também tenho a sondagem da rua. Temos no horizonte aqueles deputados que não conseguimos eleger há dois anos. E temos apostas de grande audácia, nomeadamente em Évora, com a Alma [Rivera] e em Santarém, com o Bernardino Soares. Também queremos reforçar em Lisboa, Porto, Setúbal e confirmar em Beja. E diria que também se abrem perspetivas em Braga e em Faro.
A Direita quer reforçar rendimentos descendo impostos, a CDU prefere subir salários. Porquê?
Como é que se vive com os salários que existem? Percebo que a Direita esteja preocupada em não tocar nos lucros, mas a realidade é esta: há três milhões de trabalhadores que ganham até mil euros de salário bruto/mês, 800 mil dos quais ganham o salário mínimo. Ora, não é com isto que se pagam contas. E, ao mesmo tempo, os principais grupos económicos têm 25 milhões de euros de lucros/dia. A conversa dos impostos vinda da Direita é sempre a mesma: falinhas mansas, umas “cenourinhas”, e qual é o objetivo central? Baixar o IRC das grandes empresas. Para os tais dos 25 milhões de euros de lucros por dia.
Eu diria que não só há condições como há a necessidade imperiosa de aumentar de forma significativa os salários. E, até por uma realidade muito específica - as micro, pequenas e médias empresas, que são 99% do nosso tecido empresarial -, é preciso que se tomem medidas específicas e direcionadas para aliviar a carga nos outros custos de contexto, de maneira a que eles estejam em melhores condições para acompanhar o aumento geral de salários. Porquê? Porque as micro, pequenas e médias empresas vivem do mercado interno. Ora, se não tivermos dinheiro no bolso, não temos como dinamizar a economia. Quem vai sofrer não é o 1%, não são os tais que recebem 1 600 milhões de euros em benefícios fiscais. São os 99% que precisam de apoio, precisam que se fixe o preço da eletricidade, do gás, que se baixe os preços das telecomunicações… Precisam de que se acabe com o roubo - não há outra palavra - que hoje se verifica em tudo o que tem a ver com comissões bancárias e custos de conseguradoras nas micro, pequenas e médias empresas.
A banca a tem 6,5 milhões de euros de lucros por dia só em comissões e em taxas. Essas taxas estas foram criadas num contexto muito particular, em que as taxas de juro eram zero ou negativas. Foi esse o pretexto. Se acabássemos com elas, isto tinha implicação nos custos das micro, pequenas e médias empresas e, para quem está a pagar uma prestação de casa, tinha implicações diretas na redução dessa prestação. O problema não é a falta de meios nem de recursos, mas sim, como sempre, as opções. Nós achamos que a opção, de uma vez por todas, tem de ser não acompanhar os interesses dos grupos económicos, mas sim os da maioria. É uma diferença entre um punhado de 10 ou 15 grupos económicos e 5 milhões de trabalhadores. E, como devem calcular, a nossa opção é pelos 5 milhões de trabalhadores.
Como se resolve o elevado custo da habitação?
Esse deve ser um dos setores mais liberalizados e desregulados da nossa economia. Está entregue aos interesses imobiliários e à banca. Para quem defende que a saúde ou a educação sejam liberalizados, o resultado do que se passa na habitação é revelador das consequências que isso teria. A primeira coisa a fazer é atacar esse poder, pondo os lucros da banca a suportar o aumento das taxas de juro. É preciso vontade política? É. E é preciso fixar o preço das rendas e acabar com a Lei Cristas. Não há razão para manter essa faca no pescoço das pessoas. É ainda preciso que o Estado disponibilize habitação pública. A nossa proposta são 50 mil casas até 2028. Isso obrigará os preços e a especulação a baixar.
Disse que é preciso vontade política para enfrentar o problema da habitação. E se o PS não a tiver?
Desculpe repetir a ideia, mas acho que ela é central: isso não depende da vontade do PS, depende da força que a CDU tiver. É como há pouco lhe disse: em 2015, o PS também não tinha vontade de aumentar as pensões de forma extraordinária, de avançar para os manuais escolares gratuitos, de abrir este caminho das creches gratuitas, de acabar com o Pagamento Especial por Conta... Ou seja, nada disto que foi conseguido foi por vontade do PS. Foi pela correlação de forças que existia, e, nomeadamente, a força da CDU, que obrigou o PS a fazer isso. Portanto, eu diria que a vontade do PS aqui conta pouco. O que conta, de forma decisiva, é a força que a CDU tiver. Se fosse pela vontade do PS, estávamos noutra.
Preocupa-o ver Pedro Nuno Santos admitir o regresso das PPP na saúde?
O que me preocupa é a falta de médicos e enfermeiros, é haver profissionais que não estão a ser respeitados, é a falta de médicos de família para mais de 1,7 milhões de pessoas. Preocupam-me as pessoas que estão às portas dos centros de saúde, às vezes em filas de oito, nove, dez, onze horas, para poderem ter uma senha. Isto é que me preocupa. Quanto às PPP, não é não me preocupar, mas não vejo nenhuma novidade nessa afirmação. Essa tem sido a opção do PS. Mais ou menos afirmada, mais ou menos declarada, mas tem sido a opção do PS. Mal comparado, é mais ou menos como a promessa, feita por Pedro Nuno de Santos também, ao dizer que ia acabar com as portagens nas ex-SCUT. A única forma de o PS cumprir essa promessa não é dando votos ao PS, é dando votos à CDU para obrigar o PS a cumprir essa promessa. Aliás, essa promessa foi feita há dois anos, no Algarve, em plena A22, por António Costa. Dois anos depois, ainda estão lá as portagens.
Que empresas é que, no entender da CDU, deveriam estar na esfera do Estado e, eventualmente, ser nacionalizadas? E faço também a pergunta quase fatal, que é...
... quanto custa.
Exatamente.
[risos] Para nós, há uma questão de fundo: o Estado precisa de ter, nas suas mãos, empresas e sectores estratégicos que determinem o caminho. Trata-se de condicionar e abrir os caminhos económicos para dar resposta às nossas necessidades. Para isso é preciso o controle público do Estado, e há uma empresa, logo à partida, que está nesta esfera e da qual não vamos abdicar: a TAP. Queremos travar a privatização da TAP.
Depois, há vários instrumentos para o Estado ter o controlo público de empresas sem estar, necessariamente, a nacionalizar ou a tomar o poder público a 100%. Há vários caminhos. E há outras questões muito concretas. Por exemplo, nos próximos oito, nove anos, todas as PPP nas rodoviárias vão acabar. Há duas opções que se podem fazer: ou renovar as concessões ou acabar com elas. É a isto que o PS tem de responder. As experiências que temos, até agora, não têm sido positivas: perante a oportunidade de acabar com a concessão do serviço postal, o PS acabou por renovar o contrato, mantendo-o nas mãos do privado com as consequências todas que nós conhecemos. A PPP da Fertagus também está em fase final. Vai-se recuperar aquele instrumento para o Estado ou vai-se renovar a concessão? É a isso que é preciso responder.
Mas não quero fugir à pergunta sobre os custos. Se há coisa que nsabemos hoje, até por conclusões do Tribunal de Contas, é que a privatização da ANA já custou ao Estado pelo menos 20 mil milhões de euros. Quando se pergunta quanto custam as nacionalizações, temos de perguntar o que é que faríamos com 20 mil milhões de euros que, supostamente, eram para ter sido entregues ao Estado por via da privatização da ANA - que era uma das empresas mais lucrativas do Estado - e que, entretanto, foi encher os cofres da Vinci. Ficámos a arder com 20 mil milhões de euros. Aliás, é um aspecto do qual não vamos abdicar e, na primeira oportunidade que tivemos na próxima legislatura, com mais deputados e mais força, iremos propor uma comissão de inquérito à privatização da ANA. Mas quem diz a ANA diz a PT ou os CTT: no que é que resultou? Quanto custou isso ao Estado? São opções.
Por que é que um eleitor indeciso deve votar na CDU e não no PS, no BE ou no Livre?
Deve votar na CDU porque é uma força em que pode confiar de forma clara. Não anda ao sabor dos ventos, é coerente, tem propostas e soluções. Utilizará a força que tiver para avançar em tudo o que for positivo, como a História demonstra. E, como a História também demonstra, é a força mais consequente do ponto de vista do combate à Direita, tenha ela as formas que tiver. Há uma experiência acumulada, em particular de 2015 para cá, que mostra que, mais do que um voto útil, o voto na CDU é um voto necessário. É um voto de protesto, de indignação e de soluções. Já demonstrou que é o único capaz de, sem nenhuma ilusão, condicionar as opções de outros, nomeadamente do PS, trazendo-o para as respostas necessárias.
Disse que a CDU não anda ao sabor do vento. Há partidos à Esquerda que andam?
Às vezes, os ventos são fortes... Às vezes, têm uma grande força e não é possível aguentar as ventanias. Nós temos aguentado. E, quando dizemos que somos um porto seguro, é por isso. Podem lá encostar os barcos que, no nosso porto, não há possibilidade de eles serem corridos pelos ventos.
Compreende que os polícias tenham ido protestar para junto do local do debate PS-AD?
As reivindicações das forças de segurança são justíssimas. Há um conjunto de problemas que vinha de trás e que teve a cereja no topo do bolo com a atribuição, e bem, de um subsídio de risco à PJ, mas deixando estes homens e mulheres de fora. O Governo podia ter aberto caminho à resolução do problema, mas não o fez. Fez mal. Isto é uma coisa. A outra é que estamos perante homens e mulheres que juram cumprir e fazer a Constituição. Esta ou aquela afirmação mais acalorada e menos feliz não caracteriza a generalidade das forças de segurança.
Como explica que, numa época de baixos salários, de precariedade, de elevados custos na habitação, emigração e degradação dos serviços públicos, seja a Direita e não a Esquerda a capitalizar?
Olhe, ainda há pouco, ao perguntar-me sobre o que vai acontecer a partir de 11 de março, fez-me uma pergunta em função de um elemento em concreto, de uma dessas expressões da Direita [Chega]. Nós passámos anos e anos de volta disso. Mas a questão de fundo é aquilo que nós sempre dissemos. Se me permite, vou voltar a 2015, 2019 e 2021 [anos de negociações da geringonça]. A estabilidade governativa não depende nem do acordo escrito com A, B ou C nem de alianças governamentais; depende da resposta que a política dá aos problemas das pessoas. Aquilo que fez garantir a estabilidade política, de 2015 a 2019, não teve nada a ver nem com acordos escritos nem com uma predisposição diferente do PS. Não foi nada disso. O que garantiu a estabilidade política foram respostas - insuficientes, naturalmente, mas que foram ao encontro das necessidades das pessoas e abriram um caminho de esperança.
E vivemos em dois mundos: a realidade da bolha mediática e a realidade da vida. Quando a da bolha mediática passa ao lado dos problemas da vida, e quando as políticas não respondem aos problemas da vida mas procuram responder aos problemas da bolha mediática, há um desfasamento completo entre realidade e política. As pessoas voltam-se para aquilo que estiver mais à mão e sentem-se, naturalmente, frustradas, indignadas, porque não vêem os seus problemas resolvidos. E isso leva-as para todo o lado. O problema não é essa justa indignação, o problema é para onde é que ela é canalizada e dirigida.
Falemos da guerra da Ucrânia. Dois anos depois, acha que o PCP podia ter reagido de outra forma?
Nós tivemos uma posição e fez-se uma caricatura dela. O que dissemos foi que era preciso é obrigar todos os intervenientes na guerra a encontrar soluções para a paz. Hoje, a grande diferença é que todo aquele discurso hipócrita, cínico, do bem contra o mal, toda essa máscara caiu com o massacre em curso na Palestina. Isso torna mais difícil justificar a continuação da guerra. Hoje, está mais evidente que aquilo que dissemos, infelizmente, bate certo.
E era possível esse caminho de paz no final de Fevereiro de 2022, depois de o conflito ter ganho aquela dimensão? Era possível esse caminho de paz?
Se nós tivessemos a capacidade de determinar, aquela guerra nunca tinha acontecido. Nem em 2022, nem em 2014. Mas, perante o facto de estar a acontecer, qual era a opção que havia? Era alimentá-la ou travá-la? Com as consequências que ela ia ter, que estava na cara que ia ter. O caminho errado que se tomou foi o caminho de alimentar e não de parar. E os resultados estão à vista. É um grande desafio, para todos aqueles que acham que o caminho deve ser a paz, em todos os focos de guerra, de obrigarem os Estados a forçar a paz. Porque, se todos os Estados se tivessem esforçado na construção da paz, isso teria limitado em muito as consequências desta guerra.
Tendo em conta que, bem ou mal, a dicotomia Oriente-Ocidente parece ter regressado, não se torna um bocadinho difícil, para o PCP, explicar a defesa da saída de Portugal da NATO?
Acho que não. Se quisermos ser rigorosos, aquilo que nós propomos é só uma coisa tão simples como: o país deve caminhar para contribuir para a dissolução dos blocos político-militares. Sabe onde é que isto está escrito? Na Constituição da República Portuguesa. Se quiserem acusar o PCP de querer cumprir a Constituição, eu serei o primeiro a dizer: prendam-me por querer cumprir a Constituição. Acho que há alguém que está a ver mal, porque aqueles que estão constantemente a apelar à guerra, ao reforço militar, à corrida ao armamento, a mais dinheiro para as bombas… Há muitos que apelam a mais dinheiro para o armamento e têm 1,7 milhões de pessoas sem médico de família. Há qualquer coisa aí que não está a bater bem.
Queria fazer-lhe uma pergunta sobre a integração europeia: afinal, o PCP quer ou não sair da União Europeia (UE) e do euro?
Não temos nada no programa que indicie a saída da UE. A saída do euro é outra questão, porque não obriga à saída da UE. Temos 20 anos de adesão ao euro e 20 anos de estagnação económica. Há muita gente que, do ponto de vista ideológico, não está todos os dias connosco – alguns até muito longe de nós –, que vai questionando a capacidade do país de aguentar uma moeda que não tem condições de aguentar. Não estamos a dizer que vamos desistir do euro amanhã; o que dizemos é que queremos dar um contributo para que se abra essa discussão.
As últimas duas questões foram colocadas por leitores. Uma delas, feita pela leitora Joana Bagão, visa saber o que propõe a CDU para a cultura.
Primeiro, queremos valorizar os profissionais e acabar com a intermitência na cultura. Ao contrário que diz o ministro da Cultura, a precariedade não é um bem. A segunda questão é como potenciamos toda a capacidade instalada, bem como a criatividade instalada. Temos o objectivo de 1% do Orçamento do Estado para a Cultura agora, a caminho de 1% do PIB para a cultura. Para nós, há quatro pilares fundamentais da democracia: o económico, o social, o político e o cultural. Um país que não aposta na sua cultura nas suas diversas expressões é um país que fica menos democrático. Fica com menos capacidade, até, de dar resposta a fenómenos que estamos a enfrentar hoje, do ponto de vista ideológico.
Última questão, esta feita pelo leitor José Magalhães Pinto: para o PCP, o investimento em empresas estrangeiras é bem-vindo?
O investimento é sempre bem-vindo. Não diabolizamos o investimento estrangeiro, o que achamos é que o país tem condições para aumentar o seu investimento próprio, o seu investimento público. Agora, não diabolizamos o investimento estrangeiro. Ele faz falta e é bem-vindo, dentro das regras que temos e dentro de uma ideia que é: cá se cria a riqueza, cá se deixa o valor dos impostos e a riqueza criada. E não propriamente como faz alguma gente que tem cá os seus investimentos – e alguns deles portugueses - mas que, depois, tem as suas contas fiscais na Holanda.