Em três décadas, escolarização duplicou e a geração de jovens adultos já atingiu os 12 anos obrigatórios. Redução das desigualdades educativas andou mais rápido do que as sociais.
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Nos últimos trinta anos, os progressos no sistema educativo nacional são assinaláveis: a escolarização duplicou e o abandono escolar reduziu-se numa escala sem paralelo no contexto europeu. Por cada nova geração, avança-se praticamente um ciclo de ensino. As desigualdades educativas esbateram-se a um ritmo superior às sociais. Contudo, o país continua a ter ilhas de sucesso e insucesso. Deitando por terra o conceito de determinismo, mas pondo também a nu segregações de base residencial e cultural.
O resumo bebe da terceira edição do Atlas da Educação, levado a cabo por uma equipa de investigadores da ESCXEL e nesta terça-feira apresentado pela associação Empresários Pela Inclusão Social (EPIS). Se tomarmos a população a residente, em 1991, em média, a escolarização andava na casa dos quatro anos, tendo ultrapassado os oito anos em 2021. Quer isto dizer que não atingimos ainda os nove anos de escolaridade obrigatória, o que se explica pelo cada vez maior peso da população idosa, marcada por baixos níveis de escolarização.
Contudo, analisando os jovens adultos (25-44 anos), atingiu-se já os 12 anos de escolarização obrigatória. Com apenas cinco concelhos (dois nos Açores, um na Madeira e dois no Continente – Odemira e Monforte) abaixo do “nível dos 10 a 14 anos de escolarização”. Calculando os investigadores que “por cada geração mais nova a escolarização aumente, em média, três anos de escolaridade”. Evolução que se fez pela feminização da escolaridade. Se, há 30 anos, os homens estavam em vantagem, hoje as mulheres têm em média mais um ano de escolaridade. Justificado pelo menor abandono e insucesso escolar das raparigas.
Abandono: quebra sem precedentes
Abandono que sofreu uma “mudança profunda” nas últimas três décadas, sendo que “nenhum país no espaço europeu, em tão pouco tempo, conseguiu uma redução equivalente”. Se, em 1991, a taxa de saída escolar precoce estava nos 60%, em 2021 baixou para os 12%. Numa “dualidade entre o norte e o sul”. Segundo os investigadores, a norte apenas Murtosa, Miranda e Figueira de Castelo Rodrigo apresentam valores elevados de abandono, quando a sul, tanto no interior como no litoral, “predominam os concelhos com taxas superiores a 10% e são mais numerosos os que ultrapassam os 30%”.
Notando ao JN David Justino, coordenador do estudo, que “uma maior escolarização e um menor abandono conduziram à redução das desigualdades educativas entre a população”. Decréscimo este que se fez a um ritmo “muito superior à redução da desigualdade de distribuição de rendimento”. Porquê? “Porque o facto de a escola ter reduzido as desigualdades educativas não compensou as desigualdades geradas no mercado de trabalho”.
Contudo, as disparidades e desigualdades neste nosso pequeno território persistem e acentuam-se perante o novo fluxo migratório. Porque se os concelhos com maior taxa de atraso no ensino secundário, por exemplo, se situam no interior, o facto é que “coexistem de perto com concelhos com taxas reduzidas”. Numa diversidade, notam os autores, que “chega a ser contrastante ente agrupamentos de escolas sedeadas no mesmo concelho, identificando-se escolas que sugerem situações de segregação de base residencial e cultural, par a par com outras que se afirmam pelo elevado desempenho dos seus alunos”.
Desde logo, pela concentração de beneficiários do escalão A de ação social escolar, bem como pela proporção de alunos de nacionalidade estrangeira. Fazendo com que nos concelhos de forte urbanização haja “escolas que superam os resultados estimados e outras que ficam muito aquém”. E, depois, há as “ilhas de sucesso” escolar, que os rankings não mostram porque não é analisado o contexto, nota o antigo ministro da Educação. Onde “as condicionantes socioeconómicas são superadas pelo bom desempenho escolar”. Maioritariamente no interior do país, com concelhos a apresentarem “resultados muito acima do que seria esperado”, como sejam, elenca, Arruda dos Vinhos, Trofa, Valpaços ou Viseu. Para David Justino, “não há determinismo”, na medida em que “há alunos, famílias e escolas que fazem a diferença, mesmo em contextos adversos”.