Preocupados com avarias constantes, diretores de escolas alertam que há estudantes à espera do segundo computador. ME diz que pais só pagarão casos de mau uso.
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Os primeiros portáteis distribuídos aos alunos, em 2021, no âmbito da escola digital já perderam a garantia ou têm o prazo de dois anos quase a expirar, alertam os diretores. Há também alunos que aceitaram, este ano letivo, os computadores e já não estão cobertos por essa proteção. A um mês da realização digital das provas de aferição do 2.º, 5.º e 8.º anos, os responsáveis pelos agrupamentos receiam ter mais uma bomba-relógio nas mãos por não saberem quem tem de pagar as avarias fora da garantia.
Pela primeira vez, todos os alunos do 2.º, 5.º e 8.º anos vão fazer as provas de aferição teóricas em computador. Serão cerca de 270 mil. Mais uma amostra do 9.º que vai fazer as provas finais em modo digital.
"A breve prazo vai ser um problema grave", teme o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE). Como as famílias assinaram declarações a responsabilizarem-se pelos danos, os diretores temem que, com os equipamentos fora da garantia, tenham de ser os pais a pagar a reparação das avarias que são constantes. Manuel Pereira assume que, na escola, tem "dúzias de equipamentos arrumados", pois as orientações são para guardar os portáteis avariados fora da garantia.
Há famílias que, por causa das provas de aferição em computador, só este ano estão a levantar os equipamentos. E "já há portáteis a serem distribuídos com a garantia prestes a expirar", relata o presidente da associação de diretores (ANDAEP). Filinto Lima receia que a taxa de recusa dos pais se agrave e defende o alargamento do seguro escolar às avarias dos aparelhos.
Envio custa 40 euros
Ao JN, o gabinete do ministro da Educação garante que as famílias só pagarão "no caso da avaria não estar abrangida pelas regras da garantia, como sejam os casos de mau uso do equipamento". A tutela tem "conhecimento de arranjos fora da garantia, resolvidos a favor dos encarregados de educação". O Ministério da Educação (ME) sustenta que está "em execução um processo que visa responder às necessidades decorrentes dos equipamentos que vão terminando a garantia". O Orçamento do Estado dispõe de uma verba de 17 milhões de euros para a criação de um plano de manutenção dos equipamentos.
A comissão de acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência alertou que as escolas não entregaram 180 mil computadores (dos 600 mil comprados) até ao final de 2022, principalmente devido à recusa das famílias em se responsabilizarem por danos. No entanto, interpelado sobre se todos os alunos terão equipamentos para realizar as provas, o ME afiança que já foram entregues todos os equipamentos às escolas. E frisa que o IAVE deu "às escolas as orientações para garantir" a realização das provas, como, por exemplo, por turnos e em modo offline.
O primeiro-ministro prometeu um computador por aluno. Primeiro foram distribuídos 450 mil com Ação Social. Depois foram comprados 600 mil com verbas do PRR (221 milhões de euros).
Porém, há alunos à espera de um segundo portátil depois de o primeiro ter avariado. Só no Agrupamento Dr. Costa Matos, em Gaia, dirigido por Filinto Lima, faltam 67 computadores a estudantes do 5.º ano que vão fazer provas. A substituição foi pedida quase desde o início do ano letivo. As avarias são constantes e as escolas não têm técnicos de Informática, alertam os diretores. Dependem da "boa vontade de alguns professores e funcionários". Além disso, queixa-se Filinto Lima, o envio dos aparelhos para as empresas tem custos que chegam aos 40 euros.
"Praticamente todos os dias há avarias. Teclas que saltam, ratos que deixam de funcionar, baterias que descarregam em minutos", enumera Madalena Pinho, adjunta do diretor do Agrupamento General Serpa Pinto, em Cinfães. Na maioria dos casos, não se trata de negligência. Também há famílias que guardaram os equipamentos e depois não conseguiram ligá-los por as baterias descarregarem ou os cartões terem ficado desativados.
S.TO.P. marca greve às aferições
O S.TO.P entregou pré-avisos de greve para o período entre 5 e 11 de maio. O alvo, explicou ao JN André Pestana, são as provas de aferição que "não têm uma data única para se realizarem ao mesmo tempo em todo o país". Ou seja, as provas de Educação Artística e de Educação Física do 2.º ano. Este protesto, ao contrário das outras greves convocadas pelo sindicato desde o início de janeiro, só abrangem professores. André Pestana acredita que por serem provas que não se realizam num dia e hora, em todo o país, o protesto não será alvo de serviços mínimos. As escolas vão ter outro prazo, entre 16 e 26 de maio, para realizarem as provas de Educação Física do 5.º ano e de TIC do 8.º ano
Diretores temem falhas na rede e avarias técnicas
A desmaterialização das provas "é um desafio" para as escolas, assume o presidente da ANDAEP. A cerca de um mês das primeiras aferições feitas em computador por todos os alunos, Filinto Lima aponta como principais pesadelos dos diretores as falhas na rede, a falta de computadores por as famílias terem recusado os kits ou os equipamentos terem avariado. A fraca autonomia dos alunos de 2. º ano, que ainda estão a aprender a escrever, é outra preocupação, frisa Manuel Pereira, presidente da ANDE. E há professores a entregarem escusas de responsabilidade.
Nos dias em que os mais novos fizerem provas, sublinha Filinto Lima, "os agrupamentos têm dois ou três professores de TIC para diversas escolas de 1.º Ciclo, por vezes, dispersas por vários quilómetros para ajudarem em eventuais falhas ou avarias". As provas, frisa o presidente da ANDAEP, "não são apenas para aferir os conhecimentos dos alunos, mas também os recursos materiais e humanos que as escolas têm".
Manuel Pereira também não esconde a preocupação, especialmente com a manutenção dos computadores devido à falta de técnicos de Informática. O Orçamento do Estado para 2023 prevê uma verba para um plano de manutenção, mas os diretores, garante, "não sabem de nada".
Há escolas que criaram dias digitais para aumentarem o uso dos portáteis nas salas de aula. Noutras, a adaptação dos alunos, especialmente dos mais novos, pode ficar aquém, receia a presidente da Confap. "É um material como uma calculadora gráfica. Deve ser usado com frequência", defende Mariana Carvalho.
O ME garante, em resposta escrita enviada ao JN, que "todos os agrupamentos receberam equipamento, havendo um por aluno".