Câmara da Invicta defende fim da circulação de pesados na VCI, onde passam cerca de 10 mil veículos longos por dia, enquanto a capital luta contra o estrangulamento da Segunda Circular. Alternativas existem, mas sendo pagas a procura é escassa. Medidas práticas têm sido morosas.
Corpo do artigo
As negociações ainda decorrem e são o primeiro grande passo para resolver um dilema com que o Porto se debate há anos, o eterno congestionamento da Via de Cintura Interna (VCI), em boa parte provocado pelo fluxo elevado de veículos pesados de mercadorias.
A 18 de setembro, Rui Moreira, presidente da Autarquia, e Silva Tiago, presidente da Câmara da Maia, reuniram-se com o secretário de Estado das Infraestruturas, Jorge Delgado, e solicitaram "medidas muito urgentes" que coloquem um ponto final ao problema.
"Iremos ter no Porto um conjunto de obras com grande impacto no trânsito, como a construção da linha rosa do metro e a intervenção no tabuleiro inferior da ponte Luís I", lembrou Rui Moreira, chamando a atenção para o facto de VCI vir a ficar ainda mais sobrecarregada a curto prazo.
Até ao final de outubro, o Governo comprometeu-se a dar uma resposta a estas preocupações, nomeadamente as relacionadas com o trânsito de camiões. A possibilidade de isentar estes veículos de portagens na A41, a Circular Regional Exterior do Porto (CREP), considerada por vários especialistas como fundamental para permitir o escoamento da VCI, é defendida de forma unânime pelos municípios do Porto, Maia, Vila Nova de Gaia, Matosinhos, Gondomar, Valongo e Paredes. No entanto, de acordo com Jorge Delgado, esta pode não ser "uma boa solução ou a mais importante." E é ao Governo que cabe a palavra principal, dado que a VCI está debaixo da alçada da empresa pública Infraestruturas de Portugal (IP).
A CREP não é competitiva por se tratar de um traçado muito externo, que obriga a grandes desvios e as portagens acabam por empurrar o trânsito para a VCI, que não é paga
Para José Pedro Tavares, professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e coordenador de um estudo solicitado pela Câmara do Porto sobre a avaliação de desempenho da VCI, que serviu de base às conversações da autarquia com o Governo, "a CREP não é competitiva por se tratar de um traçado muito externo, que obriga a grandes desvios." Além disso, lembra, "as portagens acabam por empurrar o trânsito para a VCI, que não é paga". Por arrasto, os pesados, tidos como entre 5 a 8% do total de tráfego da VCI, qualquer coisa como cerca de 10 mil camiões diários, "acabam por não ter outra alternativa" que não a Via de Cintura Interna.
"Retirar veículos pesados da VCI ajudaria, sem dúvida, na questão do tráfego nesta via estruturante do Porto", sentencia José Pedro Tavares, que vê na CREP a "única alternativa plausível" para que tal aconteça. "Realisticamente é uma solução exequível, claro. É preciso é saber se o Estado pretende assumir os riscos inerentes. Porque é ao Estado que compete avançar com a renegociação da concessão da CREP, de modo a que não seja portajada, o que traz custos elevados", refere.
É necessário tomar medidas rapidamente porque Portugal estabeleceu o ano de 2050 como meta para as emissões zero de dióxido de carbono para a atmosfera
Paula Teles, engenheira especialista em questões de mobilidade urbana, concorda que retirar pesados da VCI utilizando a CREP como alternativa "seria um excelente passo". Mas não o único a ter em conta. "Outra opção poderia passar por taxar a VCI nas entradas e saídas de e para o Porto", avança. Uma coisa é certa, "é necessário tomar medidas rapidamente porque Portugal estabeleceu o ano de 2050 como meta para as emissões zero de dióxido de carbono para a atmosfera e com o nível atual de trânsito de pesados da VCI tal será impossível de concretizar."
A própria Associação Nacional de Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM) admite "constrangimentos" na VCI e concorda com a retirada de pesados, desde que uma condição seja salvaguarda: "não onerar as empresas com custos acrescidos pela utilização de vias alternativas", referiu fonte da ANTRAM ao JN Urbano. A isenção de portagens na CREP "está em cima da mesa".
Os nós da CRIL estão desadequados à procura de tráfego por se tratar de uma via desenhada nos anos 1960 quando a carga populacional era muito menor
Se no Porto o maior foco de preocupação no que diz respeito aos congestionamentos motivados pelo trânsito de veículos pesados é a VCI, em Lisboa é a Segunda Circular, para onde converge boa parte do movimento de camiões. Também aqui o problema reside na falta de alternativas viáveis.
"As portagens na CREL acabaram por atirar imenso tráfego para a Segunda Circular, o que poderia ter sido evitado", critica Nunes da Silva, professor catedrático no Instituto Superior Técnico e ex-vereador da Câmara Municipal de Lisboa. Além disso, "os nós da CRIL estão desadequados à procura de tráfego por se tratar de uma via desenhada nos anos 1960 quando a carga populacional era muito menor", lembra.
A solução para aliviar Lisboa da pressão dos pesados passaria por "repensar o sistema de portagens", avançando com "o fim da taxação da CREL." Só assim, antecipa Nunes da Silva, seria possível "escoar o tráfego" e fazê-lo divergir por várias vias alternativas, retirando "movimento significativo" à Segunda Circular.