Revisão da lei com três anos está prometida para este mês, mas motoristas desesperam
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Motoristas e operadores TVDE protestam, esta quarta-feira, a partir das 14,30 horas, em Lisboa, pelas revisões que esperam que venham a ser feitas na lei nº 48/2018, que regula o setor há três anos.
O governo tem anunciado que a lei será revista este mês, mediante o relatório que o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) está a realizar e após parecer da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT). O JN apurou que o relatório ainda não está concluído, nem há agendamento para a entrega do mesmo.
O Sindicato dos Transportes Rodoviários Urbanos de Passageiros (STRUP) anda "há um ano a tentar alterar a lei para corrigir" o que não funciona. A expectativa é que o protesto, no Parque das Nações, onde decorre a Web Summit, dê visibilidade aos problemas do setor.
"O tarifário está a ser definido pelas plataformas, que é a parte que não tem custos com a atividade, o que resulta em promoções (como a Saver, em Lisboa) que são pagas pelos motoristas", denunciou o dirigente do STRUP, Fernando Fidalgo. "A Saver oferece um desconto de 25% aos clientes, mas não é a app que desconta da sua comissão: é o motorista/operador que vai receber menos 25% e a app vai receber a mesma comissão de 25% que recebia sem promoções. É claro que recebe menos sobre o total, mas não abdica da comissão e não tem quaisquer custos sobre o transporte", explicou.
Até há pouco, os motoristas da cidade de Lisboa sofriam com o "multiplicador": decidiam se queriam trabalhar com a tarifa total (1), aplicar-lhe desconto (0,9 a 0,7) ou aumentar preços quando houvesse mais clientes do que carros. Na prática, explicou Fidalgo, "quem não baixasse da tarifa um não recebia chamadas". A experiência acabou por ser cancelada após um ano de protestos, sem ser alargada a mais cidades do país, porém a Saver "obriga os motoristas a fazer um desconto maior".
Além disso, quando os motoristas são chamados a recolher um cliente que esteja "a 3, 4 ou 5km, não recebe por essa deslocação, só é pago a partir do momento em que faz a recolha" e isso significa, na maioria das vezes, "prejuízo". Se recusar a viagem "acaba por acumular penalizações na app e pode ser suspenso por ter demasiadas recusas", denunciou o dirigente do STRUP.
Os trabalhadores do setor pedem mecanismos de contratação coletiva que regulem o trabalho, inclusive o "vínculo laboral, que continua a não existir", mas também "o poder disciplinar, que está entregue às plataformas e que resultam da avaliação feita pelos clientes, pelo sistema de estrelas atribuídas ao serviço, sem justificação e sem oportunidade de defesa: os motoristas podem ser suspensos sem explicação", explicou Fidalgo.
"Havia uma ideia inicial de que o trabalho nas plataformas TVDE seria um complemento de outra atividade principal, algo para fazer nas horas livres, mas essa não é a realidade em Portugal. Com a pandemia, ainda mais pessoas se dedicaram ao transporte individual de passageiros a tempo inteiro. Quando, de um dia para o outro, sem terem oportunidade de se defenderem ou de saber os motivos, ficam com as contas suspensas sem explicações por parte das plataformas, são os rendimentos de famílias que estão em causa", acrescentou o dirigente do STRUP.</p>
Quando a "lei Uber" entrou em vigor, a 1 de novembro de 2018, a Uber alegava ter mais de 6500 motoristas e a Taxify dizia ter 600, e as restantes plataformas não informaram quantos tinham. A obrigatoriedade de esses motoristas serem licenciados passou a permitir uma contabilidade mais apurada: em janeiro de 2019, ainda só havia 327 motoristas licenciados, no final daquele ano eram 21 mil. A pandemia acelerou a procura pela profissão: de 25 mil, em janeiro de 2020, passaram os 28100 em dezembro do ano passado e, este mês, já são 33119.
Se há quem defenda a criação de contingentes, não só para motoristas, como também para operadores, o STRUP tem como prioridade a regulação do trabalho, desde o vínculo e a avaliação, até à formação e controlo dos tempos de trabalho. "Acima de tudo, falta fiscalização", reclama Fernando Fidalgo, para quem "as autoridades - AMT, IMT e governo - estão informadas de tudo o que se passa e nada fazem".
O JN questionou o governo sobre a data prevista para a conclusão dos trabalhos de revisão da lei TVDE, porém a tutela não respondeu até à hora de fecho desta edição.