Quadro de pessoal das autarquias vai crescer com a transferência de competências
A transferência dos funcionários não docentes da alçada do Estado para os municípios vai aumentar o quadro de pessoal das autarquias em 36%. São mais 43 mil funcionários e a maioria passa para as câmaras de forma automática a 1 de abril.
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No final de 2018, antes da transferência dos funcionários e edifícios escolares para as câmaras, o quadro de pessoal dos municípios era de 120 810 trabalhadores, segundo os dados da Direção-Geral das Autarquias Locais (DGAL). Dentro de uma semana, serão 164 072, mais 43 262, o que se traduz num aumento de 35,8%.
A maioria destes funcionários vai ser transferida a partir de 1 de abril, uma vez que grande parte das câmaras ainda não aceitou a descentralização de competências nesta área. Segundo o portal Mais Transparência e a DGAL, só 125 de 278 das câmaras já estão a gerir as escolas (45%).
Contratos a terminar
Rui Moreira e Carlos Moedas, presidentes das câmaras do Porto e de Lisboa, enviaram na semana passada uma carta a António Costa a defender o adiamento do prazo para a transferência, alertando que o insuficiente envelope financeiro pode colocar certos municípios em risco de falência.
A Câmara do Porto, aliás, foi mais longe e entregou uma providência cautelar para tentar travar o processo. Um dos principais argumentos é o financiamento de obras e a manutenção dos edifícios - o Estado transfere por edifício 20 mil euros para estas despesas, mas as estimativas da autarquia são de "cerca de 70 mil euros". Na ação entregue no Supremo Administrativo, a Câmara defende que há um défice de 900 mil euros entre o que o Governo pretende transferir e o custo real da manutenção das escolas.
As obras, de pequenas reparações diárias a intervenções de fundo, foram "a maior preocupação" expressa pelos autarcas nas reuniões com os sindicatos dos trabalhadores de funções públicas e sociais, garante a dirigente Lurdes Ribeiro.
"O envelope financeiro não é suficiente para as despesas, tal como o rácio dos funcionários é curto. Mesmo que seja cumprido, muitas câmaras veem-se forçadas, até para responderem à pressão das famílias, a reforçarem o número de não docentes", assegura a dirigente do STFPS do Norte. Por exemplo, aponta Lurdes Ribeiro, em Gaia, as secundárias de Canelas e de Valadares têm contratos com empresas de limpeza que terminam em abril e que reduzem o número de assistentes operacionais do rácio. "Ainda não sabemos se o contrato vai ser prolongado e isso pode criar um problema nessas escolas", alerta.
O presidente da Câmara da Póvoa do Varzim também defende o prolongamento do prazo da aceitação para o início do próximo ano letivo. Uma das razões, frisa Aires Pereira, é o desconhecimento "de contratos de segurança, informática, limpeza e alimentação".
Para autarcas que já assumiram a gestão dos estabelecimentos de todos os ciclos (caso de Gondomar) ou que vão agora receber apenas as secundárias (como Mafra ou Sintra), o processo de transferência "foi pacífico" e o balanço "é positivo". "Tirando a questão do investimento em obras de fundo, as verbas cobrem os gastos", assume Marco Martins, de Gondomar, admitindo esperar conseguir recorrer a financiamento europeu através do PT2030.
Apenas 27% das verbas transferidas
A dotação total disponível para a transferência de competências na área da Educação é de 934 milhões de euros. Até agora, e de acordo com os valores divulgados pelo portal "Mais Transparência", o Estado já transferiu para as autarquias 248 milhões de euros (27% da dotação total) mas ainda apenas 125 de 278 é que já aceitaram as competências, o que significa que faltam 153 municípios. Os dados do portal revelam ainda que as autarquias que já receberam a gestão das escolas já gastaram mais com o processo do que a verba transferida pois já investiram 277 milhões de euros.
Pormenores
3476 transferências
De acordo com os despachos publicados em "Diário da República", nos últimos três meses foram transferidos dos quadros do Ministério da Educação para as autarquias 3476 funcionários (2819 assistentes operacionais e 657 assistentes técnicos).
5000 vincularam-se
Desde outubro de 2020, por efeito da revisão da portaria de rácios, "houve um incremento efetivo de 5 mil trabalhadores" que se vincularam nos quadros, diz o Ministério da Educação.