A Provedoria da Justiça considera que o atual regime de mobilidade por doença dos professores é "insuficiente para colmatar as necessidades existentes" e, em certa medida, é "gerador de tratamento diferenciado não justificado".
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A Provedoria recomenda, por isso, ao Governo que, a par deste regime, aprove "um novo e apropriado regime de proteção dos docentes na doença, que integre a possibilidade de adequação da carga letiva e das funções exercidas ao respetivo estado de saúde", e que reveja "o elenco das doenças incapacitantes".
As recomendações da Provedoria da Justiça surgem na sequência das queixas recebidas ao longo do ano passado sobre a alteração ao regime de mobilidade por doença dos docentes. As reclamações foram "diversas" e levaram a Provedora a avançar com um pedido de esclarecimentos ao Ministério da Educação. Na recomendação, assinada pela Provedora da Justiça e datada de 23 de março deste ano, a entidade dá conta que não foi "recebida resposta a tal ofício".
Recorde-se que o diploma que altera o regime de mobilidade por doença foi publicado em junho de 2022 e as mudanças introduzidas têm sido alvo de contestação por parte dos professores. Foram, inclusive, noticiados casos de docentes que morreram e a quem tinha sido recusada a mobilidade por doença.
A Provedoria da Justiça considera que o "regime de mobilidade por doença analisado revela-se insuficiente para colmatar as necessidades existentes" e, "em certa medida, gerador de tratamento diferenciado não justificado". No documento, são apresentadas várias justificações para fundamentar esta consideração. Umas delas prende-se com o facto de o regime aplicar-se às doenças incapacitantes definidas no Despacho Conjunto nºA-177/89.
"Ora, o elenco de doenças que ali encontramos não foi elaborado tendo em vista a adequação com os requisitos de um regime de mobilidade, nem em articulação com o mesmo", nota a Provedoria da Justiça.
A Provedora aponta ainda que, "no quadro vigente, fora do regime de mobilidade por doença, apenas se prevê a dispensa da componente letiva por motivo de doença em situações excecionais, casuisticamente avaliadas". "Assim, os docentes portadores de deficiência ou doença crónica, cujo estado clínico não exige mobilidade geográfica, mas reclama diminuição de carga letiva ou a sua afetação a outras tarefas relevantes no contexto escolar estão impedidos de aceder a tais possibilidades. Só poderiam obtê-las no contexto de mobilidade", refere a Provedoria da Justiça, sublinhando ainda que, sem esta opção, os docentes "acabam por se ausentar por motivos de doença".
Também os atrasos no acesso aos atestados multiusos são visados na recomendação, uma vez que esta é a "primeira e única" forma dos docentes comprovarem o seu grau de incapacidade.
No documento, endereçado ao ministro da Educação, a Provedora da Justiça emite recomendações ao Governo: a promoção de "um novo e apropriado regime de proteção dos docentes na doença, que integre a possibilidade de adequação da carga letiva e das funções exercidas ao respetivo estado de saúde"; a revisão e atualização da lista de doenças que permitem a mobilidade; e uma solução que impeça a penalização dos docentes pelos atrasos na emissão dos atestados médicos de incapacidade multiusos.
A Provedora espera que as recomendações sejam tidas em conta pelo Governo no âmbito da negociação em curso com os sindicatos sobre a carreira docente e que possam ter efeitos já no próximo ano letivo.
"A carreira docente corresponde a uma profissão com um nível de exigência elevado, mesmo quando comparado com outras carreiras públicas de complexidade superior. É, aliás, comummente reconhecida a absoluta relevância da condição física e mental dos docentes em face da responsabilidade e desafios inerentes à profissão", lê-se na recomendação, na qual é ainda sublinhado "o envelhecimento do corpo de docentes de carreira".