Lei entrou em vigor há dois anos e não teve grande efeito no setor mais tradicional. Adesão é maior por parte de esplanadas ou estabelecimentos com novos conceitos.
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A lei que permite animais de companhia no interior de restaurantes e de outros estabelecimentos comerciais tem dois anos mas, na prática, pouco mudou. As esplanadas continuam a ser as áreas mais permissivas e os restaurantes com novos conceitos são os que mais facilmente aderem à entrada dos animais.
Se na altura a lei aprovada por unanimidade levantou dúvidas às associações do setor, agora tudo parece mais pacificado. O presidente da Associação Nacional de Restaurantes (PRO.VAR), Daniel Serra, regista uma evolução crescente à lei, que deixa ao critério dos estabelecimentos a entrada de animais em espaços fechados. "Os restaurantes que mais aderiram são aqueles com novos conceitos, como os vegetarianos, de fast-food ou finger-food (comida à mão). Os mais tradicionais são os mais renitentes e mantiveram a proibição", relata. Já a entrada nas esplanadas, que a lei já permitia, é praticamente consensual, diz.
Dúvidas são entrave
A indefinição da lei quanto à lotação, às espécies permitidas e questões de segurança e higiene foram alguns dos problemas levantados pela Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) que, face às dúvidas, chegou a apelar à não adesão. Ainda hoje, a AHRESP nota que apenas "um número residual" de espaços aderiu. O presidente da Associação Portuguesa de Hotelaria, Restauração e Turismo (APHORT) garante mesmo que o interesse inicial não se repercutiu em pedidos de dístico. "A medida é bem intencionada, mas não teve impacto. Não constituía uma necessidade", diz António Condé Pinto.
Os espaços vegetarianos e com terraços são aqueles mais permissivos também na ótica de Rita Silva, presidente da Animal, organização de defesa dos direitos dos animais. Ainda que reconheça que na generalidade não são muitos os restaurantes a darem acesso aos patudos, faz um balanço positivo. "Não tivemos um único reporte de que algo corresse mal", aponta.
O "bom senso" parece imperar tanto nos clientes com animais como sem, pelo que quem lhes abriu as portas "funciona com normalidade, com tranquilidade",garante Daniel Serra.
Cães e donos, eles estão "mais à vontade" nas esplanadas
A Indy tem seis anos e meio, é bem comportada e vai para quase todo o lado com a dona, que anda sempre em busca de uma esplanada quando é para estar à mesa, mesmo no inverno. A preferência por áreas exteriores é comum entre aqueles que possuem cães. Por conforto, dizem.
No "Soundwich", icónico restaurante "petfriendly" no Parque da Cidade do Porto, os animais de companhia são tão bem-vindos que até têm uma taça de água sempre à chegada e há quatro menus para cães com ração húmida e biscoitos de sobremesa. Talvez por isso grande parte da clientela tenha cão. "Os clientes com animais nunca pedem para ir para o interior. Sentem-se mais confortáveis cá fora. Os cães não ladram, ficam muito sossegados ao seu lado. É completamente pacífico", diz a proprietária do espaço, Joana Lencastre.
A perspetiva é corroborada pelos donos dos animais. "Na prática, [a lei] não mudou nada", repara Cristina Mesquita, com a cadela Indy recostada aos seus pés. "A maioria dos restaurantes não adere, porque os portugueses não são muito adeptos de animais no interior. Quando a lei entrou em vigor, existia maior permissividade dos donos de restaurantes", aponta. Para Joana Lencastre, não há mais estabelecimentos a admitirem animais por "medo" do seu comportamento.
Uma questão de hábito
Com três cães, Paula Ribeiro, fotógrafa de restaurantes, considera que o hábito faz o monge. "É muito mais fácil um cão adulto habituado a ir a restaurantes comportar-se bem, porque não vai ficar tão excitado". Acredita que a lei alterou alguma coisa, sobretudo no Porto e em Lisboa, onde há mais opções. "Começaram a abrir mais sítios "petfriendly" e outros assumiram-se. A maioria são restaurantes vegetarianos, que habitualmente permitem o acesso a todo o espaço. Nos outros, geralmente há uma área reservada a animais como o terraço [como permite a lei], para não perderem a outra clientela."
Antes de sair para comer com os seus patudos, Paula Ribeiro procura sempre informação e críticas sobre os locais onde o fazer, para não ter más surpresas. Ainda assim, também prefere sentar-se numa esplanada. A preferência é partilhada por Mónica Ribeiro e Paulo Caius, donos do jovem Atlas: "É mais agradável, mesmo para o cão". O bom senso é sempre aludido. Não querem incomodar.
Pormenores
Dísticos obrigatórios
A lei 15/2018 obriga os estabelecimentos que permitem a admissão de animais a colocar um dístico à entrada, mas não há regulamentação Há associações a fornecer um dístico, também disponível no portal Comunicar ao Consumidor. Alguns espaços criaram o seu.
Longe dos alimentos
É proibida a permanência de animais em áreas de serviço ou com alimentos expostos. Têm de estar com trela curta ou acondicionados.
Recusa ou expulsão
Pode ser recusado o acesso ou a permanência de animais que pelas características, comportamento, doença ou falta de higiene, perturbem o funcionamento do estabelecimento.