Um ano depois do início da guerra, ainda há cidadãos de origem russa a sentirem discriminação, em Portugal. Por exemplo, dificuldades em abrir uma conta num banco ou restaurantes com quebra de 60% a 70% no negócio.
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Anna Pogrebtsova, presidente da Associação Russa Pushkin, até admite que "as coisas estão mais calmas" do que há um ano, quando muitos cidadãos de origem russa recebiam telefonemas ou mensagens "agressivas", sobretudo "através das redes sociais".
"Não posso dizer que recebo estes telefonemas todos os dias. Inicialmente, quando o conflito começou, recebia telefonemas agressivos e diziam coisas como que os russos são culpados e que têm de morrer", denunciou Anna Pogrebtsova, há cerca de um ano, garantindo que "os russos que estão em Portugal" não tinham "culpa" do que estava a acontecer. "Neste momento, já está tudo mais calmo", adianta a presidente da Pushkin. Mas, ressalva: "Infelizmente, a discriminação ainda se mantém".
Anna Pogrebtsova fala em dificuldades, por exemplo, em abrir uma conta bancária. "Sou cidadã portuguesa com origem russa e já recusaram abrir-me uma conta num banco. Disse que não sou russa e mostrei o meu cartão de cidadão. Mas responderam que não, que sou russa", denuncia.
Outra situação que Anna Pogrebtsova detetou com pesar foi a retirada "de placas com informação em russo" numa superfície comercial. "Tinham placas com informações em várias línguas, incluindo em russo. Agora já não. Tiraram o russo", revela ainda, considerando que não é uma "forma correta" de tratar os cidadãos com origem russa. "Somos vizinhos de longa data. Não temos qualquer razão para estarmos zangados", considera.
No restaurante de Isabel Nolasco, dedicado à cozinha russa, os efeitos da guerra sentiram-se quase imediatamente após o início da invasão da Ucrânia pela Rússia. "Levámos com uma pandemia e agora levamos com uma guerra. Dentro do restaurante nem sequer temos russos, apenas portugueses e ucranianos", lamentou, há um ano, a proprietária do restaurante A Tapadinha, a funcionar na Ajuda, em Lisboa, desde 1995.
Apesar de especializado em comida russa, o restaurante A Tapadinha é propriedade de uma portuguesa. Ainda assim, há quem nem sequer queira que se saiba que lá comeu. "Por exemplo, quando são jantares de grupo, de empresa, como os de Natal, muitas vezes pedem que na fatura não seja possível ver que se trata de um restaurante de comida russa", revela Isabel Nolasco.
"Agora, as coisas estão um pouco melhores mas ainda não conseguimos recuperar. Recuperamos um pouco em janeiro mas dezembro foi para esquecer, quando era um dos melhores meses do ano. Foi a pandemia, depois a guerra, agora a crise, já é muito difícil dizer qual é a razão atual", refere Isabel Nolasco, falando em quebras entre 60% a 70% na faturação.
À conta disso, a proprietária já teve que dispensar funcionários: passou de 11 para cinco. E há dias em que nem abre as duas salas. "Há sites que nos identificam como sendo um restaurante de comida de leste, outro diz que temos comida ucraniana, outros ainda que somos russos", revela Isabel Nolasco, já um pouco farta de ter passado o último ano a explicar que até é portuguesa.