Mais de 350 surfistas vão frequentar ação de formação para aprender habilidades de salvamento e de suporte básico de vida. Projeto arranca esta quarta-feira.
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São como “peixe na água”. Ao longo de todo o ano pudemos vê-los pela costa, solitários ou em grupo, munidos da sua inseparável prancha em busca da onda perfeita e de uma sensação única de liberdade. Uma imagem de “marca” que tem ofuscado outra realidade: Os surfistas tornaram-se, nos últimos anos, autênticos nadadores salvadores que, de forma anónima, salvam centenas de vidas.
Estão, quase sempre, não muito longe da linha de costa, fintando de forma destemida as marés, as correntes, os agueiros e outros perigos do mar. Saber adquirido que usam em favor de seu passatempo, mas também, cada vez mais, para salvar muitos dos banhistas incautos apanhados nas armadilhas do mar.
“E se os surfistas também fossem nadadores salvadores”? Este é o mote da ação de formação do Surf & Rescue, projeto da Associação de Escolas de Surf de Portugal (AESP) juntamente com o Instituto de Socorros a Náufragos (ISN), que começa esta quarta-feira.
A iniciativa surgiu por altura da pandemia, face à preocupação de não haver nadadores salvadores suficientes. “Colocámos toda a rede nacional de escolas e treinadores de surf que temos ao dispor do ISN. Acreditámos que, com uma pequena formação complementar, poderíamos ser uma ajuda importante para o sistema de salvamento balneário”, explicou, ao JN, Afonso Teixeira, surfista, diretor da AESP.
O Surf & Rescue, lançado em 2020, traduziu-se “num grande sucesso”.
Uma formação muito concorrida que começou por ser destinada em exclusivoa treinadores e escolas de surf, mas que é agora aberta a nadadores salvadores e “a todos aqueles que tenham interesse em participar”.
Segundo Afonso Teixeira, os surfistas têm muitos conhecimentos “empíricos daquilo que é o mar, de como este se comporta", podendo transmitir a informação à comunidade de nadadores salvadores que, por vezes, não tem tanta experiência de mar.
Por outro lado, com os nadadores salvadores aprendem “toda a competência técnica de como resgatar uma pessoa com ou sem prancha e, muito importante, o que fazer depois de a tirar da água e garantir que a mesma sobreviva”.
Salvamentos anónimos e sem reconhecimento
Quem não tem dúvidas sobre o importante contributo dos surfistas nos salvamentos é João Guedes, um dos surfistas da primeira geração, do norte do país.
“O surf tem um papel importantíssimo no salvamento de pessoas nas praias. Cerca de 90% dos salvamentos são feitos pelos surfistas”, garante.
Com 62 anos de vida, 50 dos quais como praticante de surf, já não consegue contabilizar os salvamentos em que esteve envolvido.
“Na maioria das vezes as pessoas que salvei não me agradeceram. Quando sentiam os pés na areia desapareciam. Ainda hoje acontece salvar pessoas e não receber sequer um obrigado”, diz.
Algo que não tira a João Guedes a disponibilidade total para ajudar quem estiver em situação de perigo porque, “se não fossem os surfistas, o número de afogamentos seria muito dramático”.
Também António Espírito Santo, surfista há 43 anos, com escola de surf na praia da Baía, em Espinho, perdeu a conta aos salvamentos efetuados. “Fazemos salvamentos todos os anos e muitas pessoas nem sonham o número de pessoas que salvamos”, testemunha.
“É excelente que haja formação para os surfistas melhorarem e aumentem os salvamentos. É importante saber como agir”, concluiu.
DADOS
600 mortes em cinco anos
Segundo os relatórios da Federação Portuguesa de Nadadores Salvadores, nos últimos cinco anos foram registadas 600 mortes em meio aquático, sendo que a grande maioria dos afogamentos acontece no mar.
Esperados mais de 350 participantes em 2024
Na formação que agora se vai iniciar são esperados mais de 350 participantes, o mais elevado de sempre. Em setembro há também uma campanha de sensibilização destinada a crianças e adolescentes das escolas.
Formação na praia
As ações de formação, gratuitas, decorrem ao longo de todo o dia na praia. Metade do dia dentro de água. No restante tempo, a formação a incide particularmente no suporte básico de vida.
Formação em sete municípios
Na quinta edição, o Surf & Rescue terá ações de formação desenvolvidas em sete municípios. Em maio deste ano, no mesmo mês em que se celebra o Dia Europeu do Mar e o Dia da Marinha, ambos a 20 de maio, a iniciativa vai chegar a cinco municípios de norte a sul do país. Espinho (dia 15), Torres Vedras (20), Sesimbra (21), Matosinhos (23) e Lagos (29), mesmo a tempo do início da época balnear.