A inflação está a atingir com maior incidência os bens e os serviços em que os portugueses gastam mais dinheiro, como a alimentação e os transportes, que já representaram metade da despesa dos residentes em Portugal em março. O aumento dos preços e a consequente perda de poder de compra deverão dar corpo às iniciativas do 1.º de Maio.
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Os dados do Banco Central Europeu relativos à distribuição da despesa em bens e serviços mostram que cada português gastou em média, em março, 318 euros em alimentação e bebidas, 221 euros em transportes e 219 euros em restaurantes, cafés e hotéis. Juntas, estas parcelas representam metade do ganho médio mensal de 1543,29 euros de Portugal, segundo a OCDE. Este valor é ilíquido e inclui o salário, todos os subsídios e complementos.
A alimentação custa, agora, mais 19,6% do que há um ano, e os preços de bens e serviços de restaurantes, cafés e hotéis estão mais caros 13,5%. Nos transportes, embora os preços globais tenham descido 0,8%, os portugueses compram mais carros novos do que a média da Zona Euro e a inflação registada nesta categoria foi de 6,1%. A despesa em restaurantes e cafés segue a mesma tendência: gastamos mais do que a média e a inflação foi de 10,1%. Assim, apesar da ligeira diminuição da taxa de inflação global, o impacto na carteira dos portugueses ainda é evidente. Daí a exigência de melhores salários, prometida para hoje (ler texto ao lado).
futuro ainda é incerto
Quanto aos próximos meses, os economistas dividem-se sobre quanto vai descer a inflação. João Duque, professor catedrático do ISEG, prevê que "vai haver uma travagem porque a grande subida da inflação foi em maio do ano passado e, quando se começar a comparar os dados de abril e maio deste ano com os de 2022, não vai haver uma diferença tão grande".
O economista ressalva que a redução da taxa de inflação não significa que os preços baixem, apenas que "a variação dos preços é cada vez menor". Estima, ainda, que se chegue ao final do ano com valores "entre os 3% e os 4% de inflação".
Luís Aguiar-Conraria, professor catedrático da Universidade do Minho, é ligeiramente mais pessimista: "Eu acho que a inflação vai descer para os 5%, depois disso acho que vai ser difícil descer". O docente avisa que os juros reais, ou seja, as taxas de juro menos a inflação, "continuam negativos", além de haver "aumentos salariais que estão de acordo com a inflação que podem contribuir" para a aumentar no futuro.
para onde vai o dinheiro?
Os dados relativos aos bens e serviços consumidos pelos portugueses em março indicam hábitos de consumo muito diferentes da média dos países da Zona Euro.
Em termos globais, gastamos mais em alimentação, sobretudo peixe, fruta, pão e cereais. Fumamos menos e bebemos menos bebidas alcoólicas, mas o vinho é exceção, pois consumimos mais. Pagamos menos de renda de casa, de eletricidade e de gás, mas gastamos mais em saúde, sobretudo porque despendemos o dobro em medicamentos. Ao nível da educação também gastamos mais, principalmente no ensino Pré-primário e Superior.
Em sentido inverso, consumimos menos cultura e lazer, incluindo férias e jornais, mas compramos mais instrumentos musicais.