Cascais e São João da Madeira disponibilizam autocarros sem custos para qualquer idade. Especialistas dizem que não é só o preço que influencia a procura e defendem investimentos.
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Em 2018, no concelho de S. João da Madeira, já todos os alunos das escolas beneficiavam de transporte público gratuito, mas a Autarquia quis ir mais longe e, no ano passado, estendeu a medida a toda a população. Em Cascais, pioneira, já ninguém paga viagens nas carreiras da MobiCascais e da Scotturb, desde 2020. Desta forma, os dois municípios destacam-se do resto do país, onde a gratuitidade do transporte coletivo só chega, sobretudo, aos estudantes e jovens.
Segundo os Censos de 2021, 47,9% da população deslocou-se para o trabalho ou para estudar de automóvel como condutor, o que significa um aumento de 4,2% em relação a 2011. Para Paula Teles, coordenadora da Rede Nacional de Cidades e Vilas com Mobilidade para Todos, é fácil de explicar que, atualmente, o veículo ligeiro ganhe destaque. "É privado, flexível e não dependemos de ninguém". Para a especialista, "a próxima década", em que se preveem investimentos avultados em mobilidade, será "fundamental" para mais pessoas transitarem para o transporte coletivo, que, considera, não precisa de ser totalmente gratuito para ser atrativo.
"Os custos de transportes públicos ainda são muito caros, tanto ferroviário como rodoviário. Mas é também preciso trabalho na infraestrutura, em ruas e estradas", refere a especialista, apontando a criação de vias dedicadas aos autocarros (BRT), previstas em cidades como Braga e Porto, como uma das soluções.
Para Fernando Nunes da Silva, engenheiro que passou pela Câmara de Lisboa como vereador da Mobilidade e Transportes, "face àquilo que foi o programa do Governo de redução do tarifário (PART), o problema já não é do preço". Contudo, ressalva que a gratuitidade é "muito importante" nas faixas etárias mais jovens, "até ao momento em que não têm transporte próprio, para mostrar a acessibilidade que os transportes públicos proporcionam".
Primazia aos estudantes
É nesse público-alvo que se têm concentrado as atenções dos municípios. Vila Nova de Gaia foi o primeiro concelho do país a assegurar a gratuitidade dos passes até aos 23 anos, medida que irá manter no próximo ano. Além disso, os universitários residentes em Gaia que frequentem instituições fora da Área Metropolitana do Porto (AMP) têm também acesso ao passe gratuito. Lisboa seguiu-lhe as pisadas, este ano, e estendeu ainda a gratuitidade a residentes com mais de 65 anos.
A assinatura mensal Andante Sub13, gerida pela AMP, é gratuita e destinada a todas as crianças dos quatro até aos 12 anos, permitindo a utilização dos transportes públicos integrados no sistema intermodal da AMP, que integra 17 municípios. Mas o Porto, em particular, estendeu a gratuitidade até aos 18 anos, o que já acontece, por exemplo, com os estudantes de Sintra, Viana do Castelo, Braga, Famalicão ou Santa Maria da Feira. Barcelos promete gratuitidade do passe estudante no próximo ano.
Braga diz que não faz sentido
Na cidade dos arcebispos, uma das que mais cresceu em número de habitantes na última década, os universitários também poderão andar de borla nos autocarros em 2024. Mas, para o autarca Ricardo Rio, a gratuitidade a toda a população não faz parte dos planos. "Uma coisa é baixar preços por razões sociais. Não faz sentido abdicar de receitas potenciais de quem está disposto a pagar", justifica.
Nunes da Silva corrobora estas palavras. Mais do que os preços que se praticam atualmente, "a atratividade do transporte coletivo tem a ver com a cobertura espacial, regularidade, frequência e conforto".
Luxemburgo
País pioneiro
A 1 de março de 2020, o Luxemburgo tornou-se no primeiro país do Mundo a oferecer transportes públicos gratuitos em todo o território. No dia anterior, havia sido detetado o primeiro caso de covid-19.
Exceção
A medida tem uma exceção. A primeira classe continuou a ser paga na íntegra, custando 660 euros por ano, ou seja, 55 por mês
Impacto de 41 milhões
A gratuitidade das viagens em autocarros, elétricos e comboios no Luxemburgo teve um impacto de 41 milhões de euros nos cofres públicos.