A família do novo secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP), residente na aldeia de Mombeja, no concelho de Beja, foi apanhada de surpresa com a escolha de Paulo Raimundo para o principal cargo dos comunistas. Também os cerca de 300 habitantes da aldeia ficaram admirados quando a fotografia apareceu nas televisões e identificaram o "filho do José Narciso" que, de vez quando, vem à aldeia. A última visita aconteceu no ano passado quando marcou presença no funeral de um primo-irmão.
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Mário Narciso Raimundo, de 69 aos, tio e padrinho de batismo de Paulo Raimundo, de seu nome completo Paulo Alexandre Raimundo Cantigas Narciso, contou ao JN que chorou quando o viu na televisão. "Além de sobrinho, é meu afilhado e é um orgulho. O Paulo foi batizado aqui em Mombeja", disse, lembrando que na juventude era "um jovem pacato e inteligente e muito aguerrido pela política e pelo partido".
O antigo canalizador reformado, que passa o tempo a fazer objetos em lata, a maioria como artesanato, ainda não falou com Paulo Raimundo depois de saber das notícias, mas Mário Narciso, como é conhecido, já pensou no sobrinho/afilhado: "vou oferecer-lhe uma lanterna de cavalariça para lhe alumiar o caminho do sucesso e convidá-lo para comermos um cozido de grão aqui no Centro de Convívio da aldeia".
Presidente da Junta de Freguesia de Mombeja entre 1983 e 1990, foi militante do PCP mas deixou a vida política e a militância. "Vi algumas coisas no partido com que não concordava e desliguei-me", conta, assegurando que, apesar das capacidades de Paulo Raimundo, nunca pensou que viesse a ser ele o escolhido para próximo secretário-geral do PCP, a ser eleito na conferência que decorre este fim de semana em Corroios, no Seixal. "Sempre pensei que fosse o João Ferreira", confessou.
Mombeja, como muitas das localidades do interior em particular do Alentejo, é vítima do despovoamento, mas Mário Narciso diz que tentou travar a situação. "Lutei sempre pela melhoria da vida na aldeia e fazer obra em prol da comunidade", diz, recordando que foi nos seus mandatos que foram edificadas a sede da junta e o cemitério. E acredita que Paulo Raimundo vai seguir os seus passos e "fazer tudo para melhorar a vida dos portugueses".
Família de "imigrantes" e gente de trabalho
O pai de Paulo Raimundo é originário de uma família numerosa, constituída por nove irmãos, 5 homens e 4 mulheres, uma das quais já falecida e originária de Entradas, no concelho de Castro Verde, onde José Raimundo Narciso, progenitor do novo líder do PCP, nasceu. "Naquela zona a agricultura era muito débil e os meus pais e dois irmãos, procuraram os barros de Beja que eram mais ricos. Foram obrigados a "imigrar" dentro do próprio Alentejo", lembra o tio de Paulo Raimundo.
A vida difícil levou José Raimundo a rumar para a zona de Cascais e morar no Bairro da Mina, em Sassoeiros, onde se estabeleceu como sapateiro. Depois conseguiu um emprego como roupeiro do Grupo Desportivo Estoril-Praia. "Morava com a minha cunhada Teresa numa casa do próprio campo, na altura em que o Paulo nasceu. Só depois foram viver para a área de Setúbal", recorda o tio.
Amante do cante alentejano e do fado, Mário Raimundo passa muito do seu tempo ligado às rádios locais onde, de quando em vez, lhe pedem para cantar. "Sou conhecido pelo Alfredo Marceneiro, muitos dos meus fados são escritos pela mãe do Paulo", diz satisfeito.
População foi surpreendida com o anúncio
No Largo da Igreja, Manuel Valentim, de 63 anos, camionista de longo curso já reformado, afirma ter conhecido muito o progenitor de Paulo Raimundo. "Viviam no Monte do Carvalheiro, nos arredores da aldeia e era conhecido pelo Zé Sapateiro", diz, acrescentando que apesar de nunca ter contactado com o novo líder comunista, quando ouviu o nome na televisão e pela fisionomia da cara percebeu que era "da família da terra". Manuel Valentim confessa esperar que o seu trabalho no PCP possa ser útil a Mombeja.
Fernando Santos, então jogador do Estoril-Praia, conheceu o pai
O selecionador nacional chegou ao Grupo Desportivo Estoril-Praia como jogador em 1973, na 3ª Divisão, quando o clube ganhou a série E e subiu à 2ª Divisão. No ano seguinte, conquistou o título secundário e ascendeu à 1ª Divisão e lembra-se da presença de José Narciso. "Recordo-me do Raimundo, um alentejano que era o roupeiro, sapateiro e algumas coisas mais, como se fazia naquele tempo. Esteve no clube nas minhas duas primeiras temporadas (73/74 e 74/75) no Estoril e depois saiu e já não esteve na primeira divisão. Perdi o contacto com o Raimundo, ainda está vivo?", questiona o JN. "Desconhecia que era o pai do novo secretário-geral do PCP. Nunca o cheguei a conhecer", rematou Fernando Santos. Os pais de Paulo Raimundo são ambos vivos.