O stress e a ansiedade do confinamento terão levado a aumento no consumo, mas fumadores também podem ter tentado fazer vida mais saudável.
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Nos primeiros três meses deste ano, os portugueses consumiram 57 637 embalagens de medicamentos para deixar de fumar. Mais 11,7% (5980) do que no mesmo período de 2019. Segundo os números facultados pela Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed) ao JN, a substância mais utilizada foi a nicotina, vendida sem receita médica, seguindo-se a vareniclina e o bupropiom, ambos sujeitos a receita.
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De acordo com uma pesquisa publicada este mês no jornal "The Guardian", o receio dos efeitos da covid-19 terá levado cerca de 300 mil fumadores britânicos a deixarem o tabaco. Mas, em Portugal, não se consegue confirmar, para já, a tendência. Emília Nunes, diretora do Programa Nacional de Prevenção e Controlo do Tabagismo, da Direção-Geral da Saúde, revelou ainda não ser possível analisar os números das consultas de cessação tabágica, umas vez que estas passaram a ser feitas por teleconsulta, quando as unidades de saúde suspenderam parte das atividades programadas.
Na perceção da médica, deverá ter ocorrido uma quebra nos atendimentos porque muitos dos profissionais "foram chamados para responder à covid-19". Por outro lado, houve pessoas "que evitaram ir às consultas", quando eram presenciais, por medo de contaminação.
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No entender de José Alves, presidente da Fundação Portuguesa do Pulmão, "nunca nenhum fumador deixou de fumar quando está com medo, quando está com stress", antes pelo contrário.
"Passei grande parte da minha vida a ajudar pessoas a deixar de fumar e uma coisa básica para deixarem é estarem emocionalmente bem", sublinhou. De acordo com o pneumologista, "quando há situações, tipo enfarte do miocárdio ou doença pulmonar obstrutiva crónica, em que as pessoas têm mesmo de deixar de fumar, nesse caso são medicados com nicotina, ou substâncias parecidas, que depois são retiradas aos poucos".
Melhorar hábitos de vida
José Pedro Boléo-Tomé, da Sociedade Portuguesa de Pneumologia, explicou que a probabilidade de pessoas, quando confinadas, recaírem ou piorarem nas suas dependências é uma "probabilidade real" relatada em contextos diversos e por outros países. No entanto, o especialista em tabagismo tem uma visão mais favorável, por o confinamento ter levado muitas pessoas a adotarem hábitos de vida mais saudáveis. "Tem sido notório com o exercício físico", frisou.
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O facto de muitos fumadores terem filhos e terem sido obrigados a ficar com eles em casa pode também, considerou, ter aumentado a preocupação de "manter o ambiente de casa sem fumo". "Apesar dos riscos, do stress, acredito que o cômputo geral seja favorável." O pneumologista alertou ainda para o "tabagismo em terceira mão", que é a contaminação "das divisões da casa, onde o fumador esteve a fumar", nas quais ficam partículas cancerígenas e outras nas superfícies, tecidos e paredes. Estas podem ficar "presentes por muito tempo" e reagir com o ar ambiente, produzindo "substâncias que ainda são mais perigosas".