A vigilância da saúde dos bebés pelos cuidados primários piorou em 2020 e ainda mais em 2021, apesar de ter sido considerada uma área prioritária durante a pandemia.
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Com a alocação de médicos e enfermeiros para o combate à covid-19 e para a vacinação, o acompanhamento adequado das crianças até ao primeiro e segundo anos de vida diminuiu em todo o país, em especial em Lisboa e Vale do Tejo e no Alentejo.
Os números constam de um relatório da Direção-Geral da Saúde (DGS), que admite preocupação com as assimetrias e os baixos resultados de algumas regiões. O ex-coordenador da reforma dos Cuidados de Saúde Primários, João Rodrigues, aconselha as regiões de saúde a uma reflexão e alterações no processo de contratualização.
O relatório da DGS é preliminar e foi entregue ao Parlamento na sequência de uma pergunta feita pelo PSD sobre a mortalidade infantil. O documento revela os dados daquele indicador até 2021, mas foca também o impacto da pandemia na vigilância da saúde dos mais pequenos, analisando indicadores que são contratualizados com as unidades de saúde. No geral, a DGS conclui que "não se verificou uma disrupção abrupta na proporção de crianças em que a vigilância de saúde é feita no SNS" à custa dos resultados das regiões Norte e Centro.
O documento evidencia que a proporção de crianças com um ano, com acompanhamento adequado caiu de 61,3%, em 2019, para 56,5%, em 2021. No Norte, este acompanhamento no primeiro ano de vida caiu de 76,3% para 68,4%. Mas há regiões como Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve onde mais de metade das crianças não teve um acompanhamento adequado.
Segundo João Rodrigues, este indicador é composto e implica a realização de cinco consultas médicas e de enfermagem, a primeira até aos 28 dias após o nascimento; o cumprimento do Plano Nacional de Vacinação e a realização do teste do pezinho até ao 6.º dia.
No relatório, a DGS considera preocupante que no Alentejo só haja dados de vigilância de saúde adequada em 29,6% das crianças até um ano de vida e "também preocupante" os resultados de Lisboa e Vale do Tejo e do Algarve que rondam os 40% e estão abaixo da média nacional (56,5%).
Números baixos em Lisboa
O acompanhamento adequado até aos dois anos - inclui três consultas médicas/ano, segundo as normas da DGS e o PNV completo - regrediu 12,3% entre 2019 e 2021, com muitas assimetrias regionais. Em Lisboa e Vale do Tejo e no Alentejo, só um terço (32,6% e 32%, respetivamente) das crianças foram acompanhadas nos centros de saúde. Nos indicadores do rastreio neonatal e da consulta médica do recém-nascido até aos 28 dias, também há reduções, mas pouco significativas.
A DGS conclui que "o contexto pandémico parece ter tido um impacto ligeiro sobre alguns indicadores da vigilância de saúde infantil e juvenil". E ressalva que a análise não contempla as inscrições esporádicas nos centros de saúde, que representam uma franja vulnerável da população, nomeadamente os migrantes e pessoas em situação irregular no país.
Consulta de enfermagem em casa chega a poucos
O acompanhamento dos recém-nascidos, com uma consulta de enfermagem em casa até ao 15.o dia de vida já era baixo na maioria do país e desceu ainda mais. A proporção de bebés com aquela consulta passou de 34,4% em 2019 para 26,3% em 2021. No Algarve e em Lisboa e Vale do Tejo, este seguimento praticamente não existe. Para o ex-coordenador da reforma dos cuidados primários, João Rodrigues, este indicador devia deixar de ser para todos e abranger apenas as famílias de risco, identificadas na nota de nascimento pelo hospital.
Mortalidade infantil Em 2020, registaram-se em Portugal 2,43 óbitos por cada mil nados-vidos e, em 2021, foram 2,40, "os dois melhores resultados de sempre", refere a DGS em resposta a uma pergunta dos deputados do PSD. Os sociais-democratas questionaram o Ministério da Saúde sobre o aumento, no primeiro semestre de 2022, dos óbitos de crianças no primeiro ano de vida, dando nota de que foram mais 29 do que no período homólogo de 2021. A resposta não avança dados sobre o presente ano.
Pormenores
Mortalidade fetal
A taxa de mortalidade fetal tardia (após as 28 semanas de gestação) tem vindo a decrescer desde 2004, com algumas oscilações, indica o relatório preliminar da DGS.
Óbitos neonatais
A taxa de mortalidade neonatal (óbitos de crianças com menos de 28 dias por mil nados-vivos) tem-se mantido, desde 2003, abaixo de três, sendo que em 2020 e 2021 foi de 1,70. Já a taxa de mortalidade neonatal precoce (óbitos de bebés com menos de sete dias de vida por mil nados-vivos) está abaixo de 2 desde 2004, com pequenas oscilações. Em 2020 e 2021, foi de 1,10 e 1,20, respetivamente.