Florinhas do Vouga, Aveiro, têm quatro apartamentos para dar nova oportunidade de inserção.
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Algumas noites são passadas num banco, numa rua transversal à Avenida Lourenço Peixinho. Noutras, recolhe-se num quarto, pago por uma "pessoa boa". J. sorri, ainda assim, com brandura. Tem 60 anos, nasceu em Sintra e foi ainda criança para Cuba, onde estudou veterinária. Regressou há uns cinco anos e, apesar dos tempos difíceis, não perde o sonho de "ter uma casa".
António (nome fictício) tem 47 anos, nasceu na Venezuela e veio para Portugal com 13 anos. Era segurança até que foi atropelado e ficou com sequelas graves. A história é contada pelo próprio, no telheiro do bairro de Santiago onde "mora", com outros toxicodependentes.
J. e António têm percursos de vida muito diferentes, mas une-os terem o céu de Aveiro como teto e poderem contar com as respostas sociais que a instituição Florinhas do Vouga disponibiliza.
J. já passou na lavandaria. António cuida da higiene no balneário e recorre à cantina social no bairro de Santiago para fazer as refeições. "Vou almoçar e jantar na cantina social. Senão, tinha de roubar para comer e não gosto disso", diz ao JN, admitindo que estes serviços são "importantes".
António até já foi proposto para um dos apartamentos partilhados que a instituição tem, mas recusou. Teria de conviver com pessoas com quem não se dá bem e ali, no Telheiro, onde está há três anos, não tem "problemas", refere.
Mas outros abraçaram a oportunidade dada pelo projeto de inserção social, que surgiu após um diagnóstico social (realizado aquando da criação do núcleo de planeamento e intervenção sem-abrigo) ter apontado lacunas na área. A resposta é financiada pela Segurança Social e tem o apoio da Câmara.
Regras no apartamento
Na prática, são quatro apartamentos onde quem não tem casa pode ficar por um período de seis meses, prorrogável por mais seis. A ideia é que nesse tempo "se organizem e se tornem autónomos", explica Rita Castro, responsável pela área.
Nos apartamentos, os novos inquilinos "têm regras" e cuidam da limpeza, explica Fátima Mendes, diretora da instituição. Mas não tem de se separar dos animais de estimação. Numa das casas somos recebidos por uma cadela.
O espaço está arrumado, mas alguns quartos acumulam muitos pertences. Não é de estranhar. "Como viveram muito tempo nas ruas, protegem muito as suas coisas", explica Rita Castro, revelando que o inquilino mais velho tem 73 anos.
Outra resposta da instituição é um balneário, que também funciona como lavandaria. Foi criado em 2008, no âmbito do Giros, um projeto focado em pessoas com problemas de comportamentos aditivos.
Todos os meses atendem dezenas de carenciados. "São pessoas que já perderam quase tudo na vida. É importante que mantenham a sua identidade", sublinha Ana Paula Caetano, a assistente social que coordena o projeto.